Acórdão nº 0840054 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 12 de Março de 2008
Magistrado Responsável | OLGA MAURÍCIO |
Data da Resolução | 12 de Março de 2008 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo n.º 54/08-4 (..../04.6TAGDM - .º juízo criminal do tribunal judicial de Gondomar) Relatora: Olga Maurício Acordam, em conferência, na 2ª secção criminal (4ª secção judicial) do Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIO 1.
B.......... foi acusado pela prática de dois crimes de procuradoria ilícita, previstos e punidos pelos artigos 1º, 2º, 5º, 7º, nº1, a), da Lei nº 49/2004, de 24/08, e puníveis à data da prática dos factos pelos art. 53º e 56º, do Dec-Lei nº 84/84, de 16/03, alterado, entre outros, pela Lei nº 33/94, de 06/09, 30-E/2000, de 20/12 e 80/2001, de 20/07, e ainda pelo art. 358º, do Código Penal.
Remetido o processo para tribunal foi a acusação rejeitada por falta de uma condição legal de procedibilidade da acção - a queixa.
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Inconformado o Ministério Público recorreu, retirando da motivação de recurso as seguintes conclusões: 1ª - «A Mma Juiz a quo considerou na sua douta decisão de fls. 165-167 que o Ministério Público não tinha legitimidade para deduzir acusação pública pelo crime de procuradoria ilícita, e rejeitou a acusação, uma vez que se o crime assumia natureza pública à data dos factos e ora assume natureza semi-publica, e, na falta de queixa validamente apresentada à data do conhecimento dos factos e dos seus agentes, o Ministério Público deixou de ter legitimidade para a acção penal»; 2ª - «O Ministério Público discorda de tal decisão, pretendendo ver o despacho proferido a fls. 165-167, revogado, e substituído por outro que receba a acusação nos termos deduzidos»; 3ª - «Com efeito, três soluções são apontadas para a resolução dos casos em que o Ministério Público tem legitimidade para iniciar o procedimento criminal à data dos factos e entretanto, por força de alteração legislativa, deixa de ter legitimidade para a acção penal, por força da alteração da natureza do crime de publico para semi-público»; 4ª - «A primeira, será a de averiguar se no decurso do processo, o fendido manifestou vontade de procedimento criminal»; 5ª - «Como cuidamos de demonstrar, só com a notificação do teor das intervenções do arguido em diversos processos cíveis no decorrer do prazo de suspensão da Ordem dos Advogados, é que esta Instituição tomou conhecimento não só dos factos, mas também da existência de um inquérito a correr quanto ao arguido, mesmo porque, dada a existência do regime do segredo de justiça, a Ordem dos Advogados não podia saber se os factos que lhe haviam sido participados no decorrer de uma acção cível, tinham ou não originado um inquérito»; 6ª - «Admitir solução contrária, levaria a considerar o absurdo da obrigatoriedade da Ordem dos Advogados proceder ao levantamento de todas as situações que lhe haviam sido comunicadas ao abrigo da L.A. (note-se, ainda em sede apenas civil), para que, em relação a elas exercesse o direito de queixa»; 7ª - «E, não há dúvida de que, quando tomou conhecimento dos factos - com a relevância e a exigência do art. 115º, do Código Penal - veio tempestivamente exercer o seu direito de queixa, pelo que nunca a acusação poderia ser rejeitada nos moldes em que o foi»; 8ª - «A segunda das situações ou hipóteses possíveis, prende-se com a notificação feita nos autos à ofendida, enquanto titular do direito de queixa, para vir exercer tal direito, querendo, no prazo de 6 meses»; 9ª - «Ora, dando como bom e assente que só na data da notificação de fls. 125 é que a Ordem dos Advogados teve conhecimento dos factos, dos agentes e da existência de inquérito, não pode deixar de se considerar que a apresentação do direito de queixa foi tempestiva»; 10ª - «E, a formulação do direito de queixa é de tal ordem, que abarca não só a primeira das situações dos autos, como a segunda, como ainda outras que foram apreciadas no âmbito de outros inquéritos»; 11ª - «Com efeito, não pode deixar de se interpretar a queixa formulada pela Ordem dos Advogados como extensível a todas as situações de que teve conhecimento e que implicariam a previsão do crime de Procuradoria Ilícita»; 12ª - «Por aqui, também se vê que a Mmª Juiz a quo não tem razão, pelo que a acusação deveria ter sido recebida nos seus precisos termos»; 13ª - «Tendo-se iniciado validamente o procedimento criminal ao abrigo da lei antiga (LA), cujo crime assumia natureza pública, se a nova lei (LN) vem converter o crime em semi-público, tal não afecta a legitimidade do Ministério Público para deduzir acusação, apenas relevando para uma eventual desistência de queixa»; 14ª - «Com efeito, não se configurando a queixa, a data da pratica dos factos, e à data em que o Ministério Público deu início ao procedimento, condição objectiva de procedibilidade, não são de aplicar a regras de sucessão de leis no tempo, como se de uma alteração ao tipo legal de crime se tratasse (o que não ocorreu visto tratar-se essencialmente do mesmo crime), mantendo assim o Ministério Público a legitimidade para o exercício da acção penal, uma vez que deixa de haver lugar e necessidade para a apresentação de uma nova queixa cujos (possíveis) efeitos jurídicos já se produziram»; 15ª - «Assim, ao não receber a acusação pública que imputava ao arguido a prática de dois crimes de Procuradoria Ilícita, a Mma Juiz violou os arts 2º, nº4, 115º, nº1, do Código Penal e o art. 311º, nº1, do Código de Processo Penal».
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O recurso foi admitido.
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Nesta Relação, o Exmº P.G.A. emitiu parecer de concordância com o recorrente.
Cumprido o disposto no nº 2 do art. 417º do C.P.P. nada mais foi acrescentado.
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Proferido despacho preliminar foram colhidos os vistos legais.
Teve lugar a conferência, cumprindo decidir.
* * FACTOS PROVADOS 6.
Dos autos resultam os seguintes factos, relevantes para a decisão: 1º - O arguido B.......... é advogado de profissão, usa o nome profissional de B1.........., tem escritório na Rua .........., .., .º, sala ., Porto, e está inscrito na Ordem dos Advogados com a cédula profissional nº ..... .
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- Por decisão do Conselho Geral da Ordem dos Advogados o arguido foi suspenso de funções no período de 19/01/1996 a 27/02/2001, inclusive, decisão que consta do edital de 22/01/1996, publicado no D.R., II, de 7/02/1996, e edital nº 185/2001, publicado no DR II, de 22/03/2001.
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- No período compreendido entre 9/10/2002 a 29/06/2004, inclusive, o arguido esteve, de novo, suspenso e esta decisão foi publicitada no edital nº 1320/2002, publicado no D.R. II, de 30/10/2002 e edital nº 1180/2004, publicado no D.R. II, de 22/07/2004 (fls. 92-93).
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- O arguido teve conhecimento destas decisões.
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- No processo de embargos de terceiro nº ...-D/1999, do .º juízo cível do tribunal judicial de Gondomar consta uma procuração, datada de 9-1-2003, de C.........., embargante, constituindo seu mandatário o arguido.
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- O arguido interveio no julgamento deste processo, que teve lugar em 29-3-2004.
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- Por despacho de 5-5-2004 foram remetidas à Ordem dos Advogados certidões dos documentos referido em 5º e da acta do julgamento daquele processo.
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- No inquérito nº ./01.0FACMN, .ª secção, do Ministério Público de Gondomar, consta uma procuração emitida por D.......... a favor do arguido e datada de 22-10-2003.
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