Acórdão nº 723/08.6PBMAI.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 29 de Fevereiro de 2012

Magistrado ResponsávelEDUARDA LOBO
Data da Resolução29 de Fevereiro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 723/08.6PBMAI.P1 1ª secção Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal da Relação do Porto I – RELATÓRIO No âmbito do Processo Comum com intervenção do Tribunal Singular que corre termos no 2º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Maia com o nº 723/08.6PBMAI, foi submetido a julgamento o arguido B…, tendo a final sido proferida sentença que condenou o arguido como autor material de um crime de ameaça p. e p. nos artºs. 153º nº 1 e 155º nº 1 al. a) do Cód. Penal, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa à taxa diária de € 10,00 (dez euros) e ainda a pagar à demandante D… a quantia de € 1.250,00 a título de indemnização pelos danos morais sofridos.

Inconformado com a sentença condenatória, dela veio o arguido interpor o presente recurso, extraindo das respetivas motivações as seguintes conclusões: ……………………………………… ……………………………………… ……………………………………… 6. Estando a ameaça de prática de crime contra a vida prevista no nº 1 do artº 153º e não sendo possível executá-la por meios que constituam um crime punível com pena de prisão não superior a três anos, a ameaça de morte só pode constituir o crime previsto naquela norma legal; 7. Mesmo que assim se não entenda, não constitui o crime de ameaça agravada, previsto naquela norma e na alínea a) do nº 1 do artº 155º, a ameaça com um anúncio de morte genericamente formulada, sem descrever os meios mediante os quais se poderá vir a concretizar; 8. As afirmações “da primeira vez escapaste mas desta vez vais para o cemitério” e “depois trato de ti”, porque não especificam a que arma se referem, nem quaisquer outros meios mediante os quais a ameaça se poderia vir a concretizar, constitui um anúncio de morte genericamente formulado e, como tal, um crime de ameaça simples; ……………………………………… ……………………………………… ……………………………………… 10. Ao decidir como decidiu, o tribunal a quo incorreu em erro notório na apreciação da prova e violou, por erro de interpretação, nomeadamente o disposto nos artºs. 153º nº 1 e 155º nº 1 do CPP, 496º do CC e o princípio in dubio pro reo.

*Na 1ª instância, o Mº Público respondeu às motivações de recurso concluindo pela respetiva improcedência, quanto à alteração da matéria de facto provada, mas concordando com o recorrente quanto à qualificação jurídica de tais factos, que em sua opinião integram a prática de um crime de ameaça p. e p. no artº 153º do Cód. Penal.

*A assistente não respondeu às motivações de recurso, não obstante ter sido expressamente notificada.

*Neste Tribunal da Relação do Porto o Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido da procedência parcial do recurso, apenas no que respeita à qualificação jurídico-penal dos factos provados, que entende integrarem a prática pelo arguido de um crime de ameaça simples, p. e p. no artº 153º nº 1 do C.Penal, importando a redução da pena de multa aplicada para 60 dias à mesma taxa diária.

*Cumprido o disposto no artº 417º nº 2 do C.P.P., não foi apresentada resposta.

*Efetuado exame preliminar e colhidos os vistos legais, foram os autos submetidos à conferência.

* *II – FUNDAMENTAÇÃO A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos: (transcrição) 1. O arguido foi casado com C… e viveu com ela na Rua …, …, Maia, onde também morava D…, sua nora.

  1. No dia 14/8/2008, no interior da aludida residência, na sequência de uma discussão sobre a partilha dos bens do casal, o arguido virou-se para a D… e disse-lhe de forma séria e convincente: “da primeira vez escapaste mas desta vez vais para o cemitério”, querendo com isto significar que a mataria.

  2. Quando ouviu tal anúncio, a ofendida temeu pela sua vida e chamou a PSP. Apercebendo-se que a polícia vinha a caminho, o arguido disse a D… “depois trato de ti”.

  3. Com o uso das expressões acima referidas o arguido quis causar medo à ofendida, como efetivamente causou, e sabia que a sua atuação era de molde a alcançar tal desígnio.

  4. O arguido atuou de forma consciente e livre, sabendo que a sua atuação proibida e punida por lei.

    Do PIC 6. A assistente temeu não só pela sua vida mas também pela vida da sua filha porque estava grávida de 7 meses.

  5. A queixosa é professora do ensino secundário e sempre foi tida como séria e honesta.

  6. É uma pessoa educada, recatada e sensata.

  7. A demandante tinha receio de aproximação do arguido.

    Mais se provou que: 10. O arguido não tem antecedentes criminais.

  8. O arguido está reformado com uma pensão de 1.600,00€. Habita casa própria. Paga uma pensão de alimentos no valor de 250€ à ex-mulher. Possui um automóvel. Tem uma doença renal crónica.

  9. O arguido é pessoa considerada pelos amigos e colegas de trabalho.

    *Foram considerados não provados os seguintes factos: (transcrição) ……………………………………… ……………………………………… ………………………………………*A matéria de facto encontra-se motivada nos seguintes termos: (transcrição) ……………………………………… ……………………………………… ………………………………………* *III – O DIREITO O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente Da respectiva motivação, sendo apenas as questões aí sumariadas as que o tribunal de recurso tem de apreciar[1], sem prejuízo das de conhecimento oficioso, designadamente os vícios indicados no art. 410º nº 2 do C.P.P.[2].

    Ora, face às conclusões das motivações apresentadas, as questões que o recorrente pretende ver reapreciadas resumem-se à impugnação da matéria de facto, à qualificação jurídica dos factos provados e ao quantum fixado a título de indemnização.

    Quanto à impugnação da matéria de facto: Como se refere nos acórdãos do S.T.J de 15.12.2005 e de 09.03.2006[3], e é jurisprudência uniforme, «o recurso de facto para a Relação não é um novo julgamento em que a 2.ª instância aprecia toda a prova produzida e documentada em 1ª instância, como se o julgamento ali realizado não existisse: antes se deve afirmar que os recursos, mesmo em matéria de facto são remédios jurídicos destinados a colmatar erros de julgamento, que devem ser indicados precisamente com menção das provas que demonstram esses erros».

    A gravação das provas funciona como uma “válvula de escape” para o tribunal superior poder sindicar situações insustentáveis, situações-limite de erros de julgamento sobre matéria de facto[4].

    E, como se refere no acórdão desta Relação do Porto de 26.11.2008[5], «não podemos esquecer a percepção e convicção criada pelo julgador na 1.ª instância, decorrente da oralidade da audiência e da imediação das provas. O juízo feito pelo Tribunal da Relação é sempre um juízo distanciado, que não é “colhido directamente e ao vivo”, como sucede com o juízo formado pelo julgador da 1ª. Instância». A credibilidade das provas e a convicção criada pelo julgador da primeira instância «têm de assentar por vezes num...

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