Acórdão nº 1742/06.2TBABF.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelANA PAULA BOULAROT
Data da Resolução01 de Março de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I P S, S B, R P, V S R, S R, P J R, R G, P T W, D M, E B H, M B J H, C E, J M e J L J H (estes quatro Autores como herdeiros habilitados de J H entretanto falecido), P S, D B F, T M, P S, M A O’C, S W e S B H, instauraram acção declarativa com processo ordinário contra EMPREITADAS, LDA e M J H, pedindo a declaração da nulidade dos contratos de mútuo celebrados entre os Autores e os Réus, condenando-se estes a pagarem-lhes: a) o montante de € 565.882,84 (quinhentos e sessenta e cinco mil oitocentos e oitenta e dois euros e oitenta e quatro cêntimos); b) juros à taxa acordada de 20%, desde Fevereiro de 2004 até à presente data - 18 de Julho de 2007 - calculado sobre £ 681.668,00 (seiscentas e oitenta e uma mil seiscentas e sessenta e oito libras) o que equivale a €1.001 .882,84 (um milhão, mil oitocentos e oitenta e dois euros e oitenta e quatro cêntimos) até ao parcial pagamento e sobre o restante até ao presente, o que totaliza o montante de €653.736,81 (seiscentos e cinquenta e três mil, setecentos e trinta e seis euros e oitenta e um cêntimos).

Ou, caso assim não se entenda, devem os Réus ser condenados no pagamento aos Autores das quantias referidas em a) e b), atentas as regras do enriquecimento sem causa.

  1. a condenação dos Réus a pagar aos Autores as inúmeras despesas com advogados, viagens a Portugal, alojamento, telefonemas, fazes a que aqueles, com a sua conduta ilícita, fizeram estes incorrer, em montante a liquidar em execução de sentença, mas que se computa já em €150.000 (cento e cinquenta mil euros); d) a condenação dos Réus no pagamento dos danos em que fizeram os autores incorrer e que, voluntariamente lhes causaram, utilizando em seu proveito exclusivo os montantes que haviam sido entregues com fim diverso e que se consubstanciou num prejuízo em quantia a liquidar em execução de sentença, mas que se calcula já em cerca de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros); num total de €1.619.619,65 (um milhão, seiscentos e dezanove mil, seiscentos e dezanove euros e sessenta e cinco cêntimos).

Alegaram para o efeito e em síntese: Em Dezembro de 2003, foram aliciados por G C no sentido de investirem num empreendimento imobiliário sito no Algarve, sendo o objectivo disponibilizarem montantes que se destinariam à compra de um bem imóvel, no qual seria desenvolvido o empreendimento imobiliário ficando os autores, como contrapartida, com uma das villas que iriam ser construídas, prometendo a obtenção de um rendimento dos montantes transferidos de 20% ao ano.

Numa primeira fase os montantes eram transferidos para a conta do citado G C, que se comprometia a transferir as mesmas para uma sociedade que estava em processo de constituição.

A referida sociedade veio a ser constituída em 19/02/2004 e foi, até Fevereiro de 2005 detida em 50% pelo G C. Posteriormente, foi o segundo réu tornado sócio gerente da sociedade. Após as transferências foi feito pela sociedade ré o pagamento do preço pela compra do imóvel sito em …, onde se encontra a ser construído um empreendimento. No entanto, apesar de terem recebido os depósitos para compra das referidas villas a construir, os réus recusaram-se a outorgar os respectivos contratos-promessa.

Os Autores lograram ser reembolsados de € 436.000, mas encontram-se desembolsados do montante de € 565.882,84.

Citados os Réus vieram contestar, por excepção, invocando a incompetência absoluta do Tribunal, bem como sua ilegitimidade e, por impugnação, salientando nada deverem aos autores.

Na réplica os Autores defenderam o indeferimento das excepções deduzidas e requereram a intervenção provocada de “Serviços de Consultadoria Empresarial, Lda, intervenção essa que veio a ser indeferida.

Foram julgadas improcedentes as excepções de incompetência internacional e ilegitimidade passiva.

A final foi proferida sentença a julgar a acção improcedente e absolveu os Réus do pedido.

Inconformados com tal decisão recorreram os Autores, tendo sido julgada improcedente a Apelação e confirmada a sentença recorrida.

De novo não se conformando, vieram os Autores interpor Revista, apresentando as seguintes conclusões: - G C, que veio a ser sócio e gerente da 1ª R. desde a constituição desta, invocou, antes da mesma constituição, essa futura qualidade, em declarações negociais que dirigiu aos AA.

- A invocação dessa qualidade nas referidas declarações tem de ser interpretada, nos termos do disposto no art. 236.° n.° 1 do Código Civil, como significando que o declarante actuou em nome da sociedade a constituir - a aqui R.

- Os actos praticados pela sociedade R. após a sua constituição só podem ser interpretados como manifestação da vontade da R. de cumprir os negócios celebrados com os AA. em seu nome, nos termos do art. 19.° n.°2 do Código das Sociedades Comerciais.

- A falta de comunicação expressa desta decisão aos AA. não impede estes de invocar o negócio.

- O negócio celebrado entre os AA. e a R. é uma associação em participação, regulada nos arts. 21.° e segs. do Dec.-Lei n.° 231/81, de 28 de Julho.

- Esse negócio não está sujeito a forma especial, nos termos do art.º 23.° do citado diploma.

- O reembolso aos AA. da quantia de € 436.000,00, efectuado pela R., significa que as partes do contrato de associação em participação puseram, por acordo, termo aos efeitos do dito contrato.

- Nesse acordo, a R. obrigou-se a restituir aos AA. a quantia de € 565.882,84, subordinando esta obrigação a uma condição suspensiva, que, entretanto, se verificou.

- Ainda que não procedam as conclusões anteriores, a R. assumiu a dívida contraída por G C, nos termos do art. 595.° n.º 1 do Código Civil.

- Tratando-se de negócio consensual, a sua celebração não está sujeita a forma especial, pelo que a vontade de assumir as correspondentes obrigações se manifesta, nos termos do art. 217.° n.°1 do Código Civil, nas condutas da R., que significam a vontade de cumprir esse negócio.

- Ainda que não procedessem as conclusões anteriores, a R. emitiu uma declaração unilateral com o valor de reconhecimento de dívida, nos termos do art. 458.° do Código Civil.

- Esse reconhecimento dispensa os AA. de provar a relação fundamental.

- O mesmo reconhecimento foi subordinado a uma condição suspensiva, que já se verificou.

- Mas ainda que no procedesse nenhuma das anteriores conclusões, ter-se-ia verificado, nos termos do artº 473.° do Código Civil um enriquecimento do património da R. à custa do património dos AA. no montante de € 565,882484.

- Por conseguinte é a R. devedora dos AA. pela quantia de € 565.882,84.

- A este montante acrescem juros, contados sobre ele, à taxa legal, desde a data da verificação da condição suspensiva a que ficou subordinada a produção dos efeitos da assunção de dívida - 6 de Fevereiro de 2006 - até integral pagamento, nos termos dos arts. 804.° e segs. e 559.° do Código Civil.

Os Autores fizeram juntar com as suas alegações de recurso, um parecer do Excelentíssimo Professor Doutor Luís Menezes Leitão, no qual se conclui pela obrigação da Ré a restituir tudo o que lhe foi prestado pelos Autores, a titulo de enriquecimento sem causa, acrescendo os juros a partir do momento em que se tornou conhecida a falta do efeito que se pretendia obter com a prestação, cfr fls 1019 a 1065.

A Ré contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso. II Põem-se como problemas a resolver no âmbito deste recurso as de saber: i) da repetição das alegações; ii) dos contratosratos havidos entre os Autores e a Ré Empreitadas, Lda, contrato de mútuo e do contrato de associação em participação; iii) da intervenção de G C em nome da Ré e da vinculação desta com os Autores; iv) do reconhecimento de divida; v) do enriquecimento sem causa.

As instâncias deram como assente a seguinte factualidade: - Em data que os Autores não conseguem precisar, mas em Dezembro de 2003, estes foram aliciados por um tal G C, no sentido de investirem num empreendimento imobiliário sito no Algarve, denominado X (alínea A) dos factos assentes), - O referido G C detinha uma sociedade de direito inglês denominada “W, Ltd.” (fls. 890 a 896 do apenso), que efectuava o “marketing” e promoção de determinado empreendimentos imobiliários (alínea B) dos factos assentes).

- E, fruto dos seus conhecimentos, conseguiu angariar clientes de nacionalidade inglesa, entre eles os autores, com o propósito destes adquirirem algumas das “villas” que integrariam o aludido empreendimento designado “X” (alínea C) dos factos assentes).

- O objectivo pretendido era os autores disponibilizarem determinados montantes que se destinariam à compra de um bem imóvel, no qual seria desenvolvido o aludido empreendimento imobiliário (alínea D) dos factos assentes).

- Estipulando-se que aos autores, em virtude das verbas que disponibilizariam, ficariam como contrapartida, cada um, com uma das “villas” que iriam ser construídas no mencionado empreendimento (alínea E) dos factos assentes).

- Os montantes em causa seriam disponibilizados pelos autores mediante transferências/depósitos bancários - que eram precedidos de uma comunicação feita pela “W, Ltd” que identificada o mencionado empreendimento denominado “Atalaia” (alínea F) dos factos assentes).

- G C, “W, Ltd” solicitava a transferência de fundos (F) prometendo aos Autores a obtenção de um rendimento dos montantes transferidos, de 20% ao ano (fls. 31—32 do apenso) - artigo 1 da base instrutória (com correcção dada pelo despacho de fls. 473), dado como assente.

- Os depósitos/transferências (F) obedeciam a um mecanismo que passava pela compra de moeda pelos autores a uma corretora financeira denominada “S-X”, a uma taxa de câmbio acordada entre esta e aquelas (fls. 24 a 27) - artigo 2° da base instrutória, dado como assente.

- Em 10 de Dezembro de 2003 S W assinou com “W Limited” o documento/contrato junto a fls. 528 a 542 do apenso — onde se lê que: “Ambas as partes acordam o seguinte: 1- Atendendo à quantia de Noventa mil Libras agora pagas pelo comprador ao investidor tal...

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