Decisões Sumárias nº 126/07 de Tribunal Constitucional (Port, 06 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelCons. Mota Pinto
Data da Resolução06 de Março de 2007
EmissorTribunal Constitucional (Port

DECISÃO SUMÁRIA N.º 126/07

Processo n.º 225/07

  1. Secção

Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto

Decisão nos termos do artigo 78.º-A, n.º 1, da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional

  1. A., SA, vem interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 22 de Novembro de 2006, que negou provimento ao recurso por ela interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa que julgara improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação e cobrança da taxa de conservação de esgotos relativa ao ano de 2001, no montante de € 18 586,50 (factura/recibo n.º 20020298627), pela Câmara Municipal de Lisboa. A recorrente pretende ver apreciada a norma do “art. 77.º do Regulamento Geral das Canalizações de Esgoto da Cidade de Lisboa, Edital n.º 145/60, com redacção introduzida pelo Edital n.º76/96”, tendo suscitado a questão da sua inconstitucionalidade, por violação da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, nas alegações produzidas perante o Supremo Tribunal Administrativo, já que a referida taxa configuraria um “verdadeiro imposto”.

  2. Cumpre decidir, sendo caso de proferir decisão sumária, nos termos do artigo 78.º-A, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional, por a questão da constitucionalidade da norma impugnada ser de considerar “simples”, para os efeitos daquela norma, tendo já sido objecto de decisão deste Tribunal – no Acórdão n.º 68/2007, tirado em 30 de Janeiro de 2007 na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional (disponível em www.tribunalconstitucional.pt), num recurso interposto, aliás, também pela ora recorrente.

  3. Com efeito, no citado Acórdão n.º 68/2007 estava em causa a norma ora impugnada – a norma do artigo 77.º do Regulamento Geral das Canalizações de Esgoto da Cidade de Lisboa (Edital n.º 145/60), com a redacção dada pelo Edital n.º 76/96 da Câmara Municipal de Lisboa –, que dera origem à liquidação e cobrança de tarifa de conservação de esgotos referente a 1999, discutindo-se igualmente a qualificação do tributo em causa como taxa ou como imposto, devido, designadamente, ao facto de a sua fixação atender ao valor patrimonial do prédio.

    Concluiu-se nesse Acórdão n.º 68/2007 pela inexistência de inconstitucionalidade da referida norma. Disse-se na fundamentação desse aresto:

    3. É a seguinte a redacção da norma impugnada, que é o artigo 77.º do Regulamento Geral das Canalizações e Esgotos da Cidade de Lisboa, constante do Edital n.º 145/60, com a redacção que lhe foi dada pelo Edital n.º 76/96:

    “1. A tarifa de conservação, de 0,25% do valor patrimonial do prédio, é devida pelo proprietário do mesmo ou, no caso de usufruto, pelo usufrutuário, em 31 de Dezembro do ano a que respeitar.

    2. A tarifa de conservação é anual sendo devida a partir do ano imediato ao da ligação do prédio à rede geral de esgotos.”

    O único segmento impugnado desta norma é, porém, o da primeira parte do n.º 1, na parte em que se refere ao valor da tarifa de conservação devida pelo proprietário (“0,25% do valor patrimonial do prédio”), devendo a referência ao artigo 77.º, sem distinção, ser assim entendida: não está em causa qualquer situação de usufruto, nem o momento de pagamento, nem a sua renovação anual, nem o momento a partir do qual é devida a tarifa aí prevista.

    4. A norma impugnada prevê uma “tarifa de conservação” anual de esgotos, que a recorrente entende não corresponder, designadamente pelo modo como é calculada, a uma taxa, que pode ser aprovada por um município, sendo antes um verdadeiro imposto, cuja aprovação está reservada a lei parlamentar (ou a decreto-lei autorizado).

    No Acórdão n.º 76/88 deste Tribunal (publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 11º vol., págs. 331-359) abordou-se o posicionamento do conceito de “tarifa” face ao de “taxa” nos seguintes termos:

    “(…) impõe-se afirmar, e sem delongas, que a tarifa, no campo das finanças locais, se não delineia como uma figura tributária em absoluto nova, ou seja, como uma espécie de tertium genus entre a taxa e o imposto. Ela, de facto, e sob todos os aspectos, apresenta-se como uma simples taxa, embora taxa sui generis cuja especial configuração lhe advém apenas da particular natureza dos serviços a que se encontra ligada. Como, a propósito, se nota em La Nuova Enciclopedia del Diritto e dell’Economia Garzanti, 2.ª ed., p. 1265, a taxa «diferencia-se da tarifa pública na medida em que o serviço a que corresponde o pagamento da taxa é efectuado pela administração do Estado no desempenho das suas funções institucionais fundamentais e em ordem à realização de fins estaduais primários. Trata-se, assim, de serviços administrativos, judiciários ou de utilidade pública, que o Estado presta na sua qualidade de ente soberano, dotado do poder impositivo».

    A tarifa, se ao nível da lei ordinária pode ter significação própria, releva, porém, numa perspectiva constitucional, como categoria tributária autónoma. Nesta óptica, ela constitui apenas uma modalidade especial de taxa e nada mais.”

    Se, portanto, nominalmente uma tarifa é uma taxa, importa, porém, aferir se essa qualificação formal é materialmente fundada, já que é essa a questão que a recorrente submeteu a este Tribunal: saber se estamos perante uma taxa ou um imposto.

    Como se escreveu no Acórdão n.º 1139/96 (publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 35º vol., págs. 314 e segs.), depois de se citar passos do Acórdão n.º 76/88:

    “Mister é que se analise a realidade das coisas, a fim de se concluir se, por um lado, com as tarifas em causa não estará a ser exigido um contributo que não corresponda a uma contraprestação ou a uma contrapartida de um serviço prestado pela autarquia, destinando-se, como equivalente jurídico, a financiar os custos acarretados pelo depósito, remoção e tratamento dos detritos sólidos e, por outro, para quem assim possa eventualmente entender, se o pressuposto ou, se se quiser, o índice que foi elegido como base da sua prestação, não tem suporte realista, escondendo uma real obtenção de receitas sem aquele princípio de contrapartida, dada a indeterminação resultante de tais pressuposto ou índice”.

    5. É sabido que a distinção entre as figuras da taxa e do imposto tem sido objecto de abundante jurisprudência do Tribunal Constitucional.

    Sobre o tema disse-se no Acórdão n.º 610/2003 (publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 57.º vol., págs. 1171 e segs.):

    4. Como se sabe, existe uma abundante jurisprudência constitucional sobre a distinção entre imposto e taxa (cfr., para uma resenha, J. Casalta Nabais, “Jurisprudência do Tribunal Constitucional em matéria fiscal”, in Estudos sobre a Jurisprudência do Tribunal Constitucional, Lisboa, 1993, esp. págs. 254 e segs., Direito fiscal, 2ª ed., Coimbra, 2003, págs. 24 e segs., e J. M. Cardoso da Costa; “O enquadramento constitucional do direito dos impostos em Portugal: a jurisprudência do Tribunal Constitucional”, in Jorge Miranda, org., Perspectivas constitucionais. Nos 20 anos da Constituição de 1976, vol. II, Coimbra, 1997, esp. págs. 401 e segs.).

    Para extremar a noção de “imposto” constitucionalmente relevante da de “taxa”, o Tribunal tem-se socorrido essencialmente de um critério que pode qualificar-se como “estrutural”, porque assente na “unilateralidade” dos impostos (cfr., por exemplo, os Acórdãos n.ºs 76/88, 412/89, 382/94, publicados respectivamente em DR, I Série, n.º 93, de 21 de Abril de 1988, e II Série, n.ºs 213, de 15 de Setembro de 1989, e 208, de 8 de Setembro de 1994), admitindo ainda, porém, como factor adicional de ponderação, que se tome em consideração a “razão de ser ou objectivo das receitas em causa”, quer para recusar a certas receitas o carácter de imposto, quer como argumento ponderoso para afastar o carácter de taxa a uma dada prestação pecuniária coactiva (elemento, este, finalístico, que transparece, por exemplo, nos Acórdãos n.ºs 7/84, 497/89 ou 70/92, publicados respectivamente em DR, II Série, n.ºs 102, de 3 de Maio de 1984, 27, de 1 de Fevereiro de 1990, e 189, de 18 de Agosto de 1992).

    Esta orientação jurisprudencial não foi, aliás, alterada nos mais recentes arestos sobre a matéria, podendo citar-se, a título exemplificativo, os Acórdãos n.ºs. 558/98 (taxas de publicidade em veículos particulares, in DR, II Série, n.º 261, de 11 de Novembro de 1998), 621/98 (taxas do IROMA, in DR, II Série, n.º 65, de 18 de Março de 1999), 747/98 (direitos compensadores, inédito), 63/99 (taxa de publicidade, in DR, II Série, n.º 76, 31 de Março de 1999), 307/99 (taxa de radiodifusão, in DR, II Série, n.º 166, de 19 de Julho de 1999), 357/99 (regulamento da taxa municipal de urbanização de Amarante, in DR, II Série, n.º 52, de 2 de Março de 2000), 369/99 (DR, II Série, n.º 58, de 9 de Março de 2000), 370/99 (inédito), 473/99 (DR, II Série, n.º 262, de 10 de Novembro de 1999), 481/99, 512/99, 581/99 (inéditos), e 130/2000 (taxa da peste suína, inédito), 582/99 (regulamento municipal de obras da Câmara Municipal do Porto, inédito), 515/2000 (taxas da Câmara Municipal de Sintra, in DR, II Série, n.º 19, de 23 de Janeiro de 2001), 346/2001 (inédito) e 96/2000 (taxa de publicidade, in DR, I Série-A, n.º 65, de 17 de Março de 2000), 143/02 (estampilha da Liga dos Combatentes, in DR, I Série-A, n.º 107, de 9 de Maio de 2002), 273/02 (inédito), 274/02, 286/02, 305/02 (inéditos) e 308/02 (tabela de emolumentos notariais, inédito), 306/02 (tabela de emolumentos do registo predial, inédito), 336/02 (emolumentos do Tribunal de Contas, in DR, II Série, n.º 237, de 14 de Outubro de 2002), 349/02 (custas judiciais, in DR, II Série, n.º 264, de 15 de Novembro de 2002) ou 415/02 (regulamento de obras na via pública da Câmara Municipal de Lisboa, in DR, II Série, n.º 291, de 17 de Dezembro de 2002).

    Assim, assinalou-se no Acórdão n.º 143/02 (DR, I Série-A, n.º 107, de 9-5-2002), quanto àquele...

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