Decisões Sumárias nº 143/05 de Tribunal Constitucional (Port, 05 de Abril de 2005
Magistrado Responsável | Cons. Benjamim Rodrigues |
Data da Resolução | 05 de Abril de 2005 |
Emissor | Tribunal Constitucional (Port |
DECISÃO SUMÁRIA N.º 143/05
Processo n.º: 198/05
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Secção
Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
1. A., identificado com os sinais dos autos, recorre para o Tribunal constitucional ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), com o seguinte requerimento de interposição de recurso:
«(...)Da origem do recurso 1º
Como nota prévia importa referir que o recorrente interpôs recurso quer para o Tribunal da Relação de Lisboa, quer para o douto Supremo Tribunal de Justiça, sem que a sua pretensão fosse totalmente atendida,
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Efectivamente, para além de ter sido julgado improcedente o recurso interposto para o Tribunal da Relação de Lisboa, foi indeferido também o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça fundamentando-se o mesmo na sua inadmissibilidade, atendendo ao disposto no artigo 400º, n.º 1, alínea f), do C. Processo Penal,
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Na sequência deste despacho de indeferimento, o ora Recorrente apresentou Reclamação para o Digníssimo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo do disposto no artigo 405º do C. Processo Penal,
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No âmbito dessa reclamação apresentada foi apontada a inconstitucionalidade da decisão de inadmissibilidade do recurso e substantivamente do disposto no artigo 400º, n.º 1, alínea f), do C. Processo Penal, tal como no âmbito do recurso apresentado para o douto Tribunal da Relação de Lisboa, se levantou a inconstitucionalidade do disposto no artigo 133º, n.º 2, do mesmo diploma legal,
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Pelo que o presente recurso para o douto Tribunal Constitucional é interposto nos termos do disposto no artigo 70º, n.º 1, alínea b), da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, na redacção dada pela Lei n.º 85/89, de 7 de Setembro e pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro.
Da inconstitucionalidade do artigo 400º nº 1 alínea f) do C. Processo Penal
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O ora recorrente foi condenado na pena única de 6 anos de prisão como autor material de um crime de burla informática agravada p. e p. pelo artigo 221º, n.º 4 alínea b), do C. Penal (na pena de cinco anos de prisão) e de um crime de passagem de moeda falsa, p. e p. pelo artigo 265º, n.º 1, alínea a), também do C. Penal (na pena de três anos de prisão).
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Para crime de burla informática agravada, p. e p. pelo artigo 221º, n.º 4, alínea b), do C. Penal a moldura penal aplicável é de 2 a 8 anos, e por sua vez quanto ao crime de passagem de moeda falsa p. e p. pelo artigo 265º, n.º 1, alínea a), também do C. Penal a sua moldura penal é até 5 anos,
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O recurso apresentado para o Supremo Tribunal de Justiça, foi indeferido com fundamento no disposto no artigo 400º, n.º 1, alínea f), do C. Processo Penal que estabelece que não é admissível recurso "de acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem decisão de primeira instância, em processo por crime a que seja aplicável pena de prisão não superior a oito anos, mesmo em caso de concurso de infracções;”,
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Considera-se que mesmo que em conjunto o arguido tenha estado sujeito a uma pena superior a oito anos, o que releva para efeitos de recurso é limite máximo resultante da soma das penas concretamente aplicadas aos diversos crimes em concurso,
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Embora, este seja o entendimento geral, a verdade é que o mesmo e até o próprio dispositivo do C. Processo Penal viola relevantes princípios constitucionais,
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Estabelece o artigo 32º, n.º 1, da Constituição da Republica Portuguesa, que "O processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso"
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O recurso é peça fundamental no processo criminal e das garantias do arguido,
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No entanto, a lei ordinária vem limitando o acesso dos arguidos a outra jurisdição, sendo disso exemplo o disposto no artigo 400º, n.º 1, alínea f), do C. Processo Penal,
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O artigo supra referido limita os recursos para o Supremo Tribunal de Justiça ao caso de acórdãos condenatórios que não confirmem a decisão de 1ª instância e que ainda aos casos em que seja aplicada pena de prisão superior a 8 anos,
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E tal acontece mesmo em caso de concurso de crimes,
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Ora, tal formulação legal, além de limitar fortemente o direito a recurso, estabelece uma situação de desigualdade que resulta directamente da fase processual em que nos encontramos,
Se não vejamos,
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O ora Recorrente esteve durante o processo até ter sido proferido o acórdão de 1ª instância sujeito a uma pena de prisão que poderia atingir o seu máximo de 13 anos,
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Tendo como pressuposto esse limite de 13 anos, os direitos e deveres do arguido foram assim definidos, como o caso dos prazos de duração da prisão preventiva,
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No entanto, já em fase de recurso os direitos são definidos de outra forma: o arguido e recorrente vê o seu direito de recurso limitado, à pena máxima de cada crime, não podendo se socorrer do cúmulo das penas máximas,
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Assim, em diferentes fases processuais, deparamo-nos com diferentes tratamentos, em clara violação também ao Princípio da Igualdade, consagrado no artigo 13º da C. República Portuguesa,
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I - A gravidade do crime (que justifica a intervenção do STJ no recurso) resulta, não da pena efectivamente aplicada, mas da moldura penal abstractamente aplicável pois ao longo do processo é esta moldura que acarreta para o arguido determinadas sujeições processuais muito penosas, respeitantes por exemplo, à aplicação e duração da prisão preventiva. Daí que violaria o princípio da lealdade processual considerar-se o crime como “muito grave” (face à pena abstractamente aplicável) para impor deveres ao arguido, mas “pouco grave” (face à pena efectivamente aplicada) para lhe retirar o direito de recorrer.
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Em nada é atenuada esta limitação, quando nos deparamos que a situação é bem diferente se for o Ministério Público a recorrer, neste caso a limitação do artigo 400º, n.º 1, alínea f), do C. Processo Penal não funciona,
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Não estando sujeito o Ministério Publico, à proibição da reformatio in pejus, o arguido pode ver assim a sua pena agravada encontrando-se deste modo sujeito à pena máxima dos crimes dos quais vem acusado que é de 13 anos,
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Esta interpretação permite uma disparidade de situações conforme nos encontremos do lado do Ministério Público ou do arguido, prejudicando deste modo o direito de recurso até às ultimas instâncias deste ultimo, violando o Princípio do Contraditório e da estrutura acusatória que determina a igualdade de armas processuais, artigo 32º, n.º 5, da C. República Portuguesa,
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Deste modo, o disposto nos artigos 400º, n.º 1, alínea f), e 432º, alínea b), ambos do C. Processo Penal são inconstitucionais uma vez que negam ao arguido o duplo grau de jurisdição, que se encontra consagrado como Direito no artigo 32º da Constituição da República Portuguesa,
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E se o supra referido artigo constitucional assegura ao arguido os seus direitos nessa qualidade, incluindo o seu direito a recurso, não o limitando, não se compreende que a lei o faça desobedecendo claramente ao dispositivo constitucional,
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É assim inconstitucional não só a interpretação efectuada do disposto no artigo 400º, n.º 1, alínea f), do C. Processo Penal, como quaisquer limitações que a lei imponha ao direito amplo de recurso do arguido consagrado no artigo 32º da C. República Portuguesa são inconstitucionais, e devem assim ser consideradas.
Da inconstitucionalidade do artigo 133º, n.º 2, do C. Processo Penal
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Nos presentes autos, determinante para a condenação do ora Recorrente foi o depoimento prestado por um co-arguido B., arguido este que tem recurso pendente, mantendo por isso a qualidade processual,
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E nessa sua qualidade de arguido, prestou um depoimento pouco credível, mas que determinou a procedência da acusação publica, que culminou na condenação do ora recorrente nos termos supra referidos,
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Conclui-se neste sentido, lendo o próprio acórdão de 1ª instância em que se afirma que “As eventuais dúvidas a esse respeito ficaram definitivamente esclarecidas com o depoimento do B., ...”,
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Isto quando em audiência de julgamento a Exma. Sra. Dra. Procuradora, em alegações finais, pediu a absolvição do arguido por falta de prova,
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Pese embora o juiz esteja sujeito à livre apreciação da prova (artigo 127º do C. Processo Penal), há interesses que o mesmo não se pode esquecer, nomeadamente de o arguido usar o seu depoimento como instrumento de defesa,
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"O depoimento de co-arguido, não sendo, em abstracto, uma prova proibida em Direito português, é no entanto um meio de prova particularmente frágil, que não deve ser considerado suficiente para basear uma pronúncia; muito menos para sustentar uma condenação.
Não tendo esse depoimento sido controlado pela defesa do co-arguido atingido nem corroborado por outras provas, a sua credibilidade é nula.
A sua valoração seria ilegal e inconstitucional “2
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Assim, podemos concluir que foi violado o disposto no artigo 32º, n.º 2, da C. República Portuguesa, que estabelece o principio do in dúbio pró réu,
Se não vejamos,
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Estabelece o artigo constitucional citado que em caso de dúvida, será imperativo a absolvição do arguido,
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Ora, quando a dúvida existe, como na situação dos autos, não será o depoimento de um arguido que irá esclarecer, mais que não seja porque esse mesmo depoimento é tendencioso e usado como instrumento de defesa,
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Daí afirmar-se que de modo algum o depoimento de um arguido pode servir de base a uma condenação,
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Consequentemente, deve o artigo 133º, n.º 2, do C. Processo Penal ser declarado inconstitucional por violação do disposto no artigo 32º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa,
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Pelo que se apresentam as seguintes
Conclusões:
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Vem o presente recurso interposto para este douto Tribunal Constitucional nos termos do disposto no artigo 70º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção dada pela Lei n.º 85/89, de 7 de Setembro e pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro,
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O mesmo visa a declaração da inconstitucionalidade do artigo 400º, n.º 1, alínea f), do C. Processo Penal por violação do disposto no...
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