Acórdão nº 07B4660 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Janeiro de 2008
Magistrado Responsável | SALVADOR DA COSTA |
Data da Resolução | 10 de Janeiro de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I AA intentou, no ida 7 de Junho de 2002, contra BB e CC, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo a declaração de ser proprietário de identificada fracção predial autónoma correspondente ao 5º andar direito do prédio urbano sito na Praceta do ..., nº 0, Alfragide e a condenação deles a entregarem-lha livre e devoluta e a pagar-lhe a indemnização de € 5 250, equivalente às retribuições mensais relativas aos meses de Dezembro de 2001 a Junho de 2002 e € 750 por cada mês de atraso na entrega da fracção, contados desde Julho de 2002, inclusive, bem como nos juros de mora vencidos e a quantia de € 50,00 por cada dia de ocupação da fracção autónoma, contados desde a data da instauração acção até à sua entrega.
Fundamentou a sua pretensão na compra daquela fracção no dia 26 de Julho de 1991, na sua ocupação pelos réus, na exigência da sua devolução em 1 de Dezembro de 2001 e na existência de interessados no arrendamento por cinco anos e € 750 mensais desde aquela data.
Os réus, com apoio judiciário na modalidade de dispensa do pagamento da taxa de justiça e demais encargos com o processo concedido por despacho de 23 de Dezembro de 2002, afirmaram em contestação ser o réu titular do direito de retenção sobre a fracção predial que ocupam, com base em entrega decorrente de contrato-promessa celebrado no dia 1 de Julho de 1991 com TP-Construções, Ldª, resolvido sob o fundamento de esta última não ter celebrado o contrato definitivo.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 3 de Março de 2005, por via da qual o autor foi declarado proprietário daquela fracção predial e condenados os réus a entregarem-lha.
Apelaram o autor e os réus, e a Relação, por acórdão proferido no dia 28 de Junho de 2007, negou provimento ao recurso pelos últimos e deu parcial provimento ao recurso do primeiro, condenando os segundos a pagar ao primeiro € 750 mensais desde a data da citação e € 50 diários desde o trânsito em julgado da sentença até à entrega da fracção predial.
Interpuseram BB e CC recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - exercem a posse sobre a fracção predial que lhe foi transmitida, há mais de dez anos, pelo recorrido, seu proprietário, pelo que é de presumir ser legítima e titulada; - não é requisito do direito de retenção por incumprimento do contrato-promessa que quem o alega seja credor daquele que pede a restituição, designadamente o proprietário; - adquiriram o direito de retenção sobre a fracção por serem titulares de um crédito sobre a promitente-vendedora por incumprimento do contrato-promessa, declarado por sentença transitada em julgado; - quer sejam possuidores ou detentores, têm direito de retenção sobre a fracção predial oponível ao recorrido; - o direito de retenção é oponível ao proprietário do bem ainda que não seja contra este o crédito que o originou; - ao considerar o incumprimento do contrato-promessa, o tribunal reconheceu a sua validade, por TP, Ldª o ter celebrado na expectativa da aquisição da fracção predial; - o recorrente actua com abuso do direito por ter sido ele quem entregou as chaves aos recorridos na sequência da celebração do contrato-promessa; - não praticaram qualquer ilícito ao ocuparem a fracção, não violaram o direito do recorrido de gozo e fruição da fracção predial; - não têm obrigação de indemnizar o recorrido, por não ter podido arrendar a fracção predial, devendo improceder o pedido de indemnização formulado pelo recorrido; - deve revogar-se o acórdão recorrido e absolverem-se os recorrentes do pedido.
Respondeu o recorrido em síntese de conclusão: - é alheio aos contratos de promessa e de permuta e não houve tradição da fracção predial; - a entrega das chaves não foi sequencial ao contrato-promessa; - os recorrentes não têm direito de retenção sobre a fracção predial nem título para a sua ocupação; - não há abuso do direito da sua parte e a decidir-se não deverem os recorrentes entregar-lhe a casa, violar-se-á o direito constitucional de propriedade privada; - o facto gerador da responsabilidade civil foi é a ocupação da fracção predial pelos recorrentes; - os recorridos ocupam ilegalmente a fracção predial, pelo menos desde a citação, violando o seu direito de propriedade, causando-lhe prejuízos correspondentes ao valor locativo de € 750 mensais.
II É a seguinte a factualidade considerada no acórdão recorrido: 1. A aquisição do direito de propriedade sobre o prédio urbano sito na Praceta ..., n.º 0, anterior lote n.º 52-A da Célula C da Urbanização da Quinta Grande de Alfragide - em Alfragide, concelho da Amadora, descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial da Amadora sob o n.º 210, freguesia de Alfragide, inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo 448, foi inscrita na titularidade da Empresa de Construções Civis TV, Ldª no dia 21 de Fevereiro de 1989.
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O referido prédio urbano foi acabado de construir em 1991, em cimento armado, com revestimento de estuque pintado, azulejos e pedra mármore, servido por dois elevadores, e foi constituído no regime da propriedade horizontal, objecto de registo predial no dia 1 de Abril 1991, integrando as fracções autónomas designadas pelas letras A a Q.
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No dia 4 de Janeiro de 1991, representantes de TP - Construções, Ldª e de MM, Ldª, declararam, por escrito: - a primeira ser dona do apartamento T2 que constitui a fracção autónoma designada pela letra "I" do prédio urbano sito no Castelinho, lote 3, Montechoro, Albufeira, e a última ser dona do apartamento T 2 que constituia a fracção autónoma designada pela letra "I", a que corresponde o 5º andar direito do Lote 59-A, sito na Quinta Grande, Alfragide; - permutarem entre si os referidos apartamentos, e que o remanescente do preço de 3 000 000$ a favor de TP, Ldª seria pago através de fornecimento de mármore por parte de MM, Ldª; - ser a escritura de permuta feita no prazo de quinze dias a contar da comunicação de qualquer outorgante à outra, e, em vez da escritura de permuta, poderem as outorgantes transmitir directamente qualquer dos apartamentos para outra pessoa ou entidade, mediante acordo prévio.
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No dia 1 de Julho de 1991, representantes de TP-Construções, Ldª, por um lado, e o réu, por outro, declararam, por escrito: - ser a primeira promitente compradora do apartamento T 2 que constitui a fracção O, do prédio mencionado sob 1, cuja dona era MM, Ldª, e prometer vendê-la ao último por 12 500 000$; - ser a escritura realizada na primeira hipótese logo que o total pagamento esteja satisfeito, ou, na segunda hipótese, logo que se realize o empréstimo; - pagar o último à primeira, com a assinatura do contrato, 4 000 000$, por via de uma letra de 1 500 000$ e de um cheque de 2 500 000$, e ser o restante pago: a) primeira hipótese 200 000$ por mês até Dezembro de 1992, fazendo-se em Agosto de 1992 reforço de 5 000 000$ e, por dilação do prazo, pagará juros à taxa de 20% pela importância em dívida a partir de 1 de Outubro de 1991; b) segunda hipótese - procura entretanto de outra solução de empréstimo junto da banca para um financiamento para a compra.
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Na base do negócio celebrado entre o réu e TP-Construções, Ldª, mencionado sob 5, existia um outro cuja concretização dependeria da celebração do contrato prometido, e o primeiro cumpriu tudo a que se havia comprometido.
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No dia 26 de Julho de 1991, em escritura pública lavrada no 4º Cartório Notarial de Lisboa, AV e FV, em representação de Construções Civis TV, Ldª, por um lado, e o autor, por outro, declararam, a primeira vender e o último comprar, por 8 000 000$, a fracção autónoma designada pela letra "O", correspondente ao quinto andar direito, com arrecadação ao nível da cave, do identificado prédio.
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A última prestação do preço mencionado sob 4 foi entregue a TP-Construções, Ldª em Janeiro de 1993, e as chaves da fracção foram entregues aos réus pelo autor e este ajudou o réu na celebração dos contratos da água, luz e gás junto dos serviços competentes.
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A aquisição da fracção predial mencionada sob 6 está definitivamente inscrita na Conservatória do Registo Predial da Amadora desde 22 de Julho de 1997, e da inscrição matricial consta o valor patrimonial de € 34.589,14.
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Por carta de 6 de Fevereiro de 2002, o réu dirigiu a FC, gerente de TP-Construções, Ldª uma carta, expressando: "Venho por este meio declarar resolvido o contrato-promessa de compra e venda celebrado com TP-Construções, Ldª em 1 de Julho de 1991 relativo ao 5º andar direito do Lote 52-A, Urbanização ...Alfragide, dado que, encontrando-se pago, na íntegra, desde 5 de Janeiro de 1993, o preço acordado de 12 500 000$, nunca por parte dessa sociedade e desde a data atrás referida foi providenciada qualquer diligência com vista a honrar o compromisso assumido, sendo certo ainda que, não obstante a interpelação por mim feita - através do meu procurador, Dr. ..., para comparecer no 20º Cartório Notarial de Lisboa pelas 11 horas do dia 10 de Dezembro de 2001, a fim de celebrar o negócio prometido, TP, Ldª não compareceu nem se fez representar. Em face do condicionalismo agora expresso, perdeu o signatário definitivamente o interesse no negócio celebrado, razão porque irá recorrer às instâncias judiciais a fim de ser ressarcido dos prejuízos sofridos.
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Os réus demandaram, no dia 23 de Abril de 2002, TP-Construções, Ldª, pedindo a sua condenação, por incumprimento do contrato mencionado sob 4, no pagamento de 40 000 000$ correspondente ao valor de mercado da fracção à data do incumprimento, em 10 de Dezembro de 2001.
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Por sentença proferida no dia 7 de Novembro de 2003, na acção mencionada sob 8, foi TP-Construções, Ldª condenada a pagar aos réus € 174 579,26, acrescidos de juros de mora desde a data da citação, à taxa de 7% ao ano até 30 de Abril de...
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