Acórdão nº 522/01.6TACBR.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Fevereiro de 2012
Magistrado Responsável | JORGE DIAS |
Data da Resolução | 08 de Fevereiro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra, Secção Criminal.
No processo supra identificado foi proferido acórdão que julgou procedente a pronúncia deduzida contra o arguido: A...
, com residência … e actualmente recluso no Estabelecimento Prisional da Guarda.
Sendo decidido: a)-Condenar o arguido pela prática de dois (2) crimes de burla qualificada, p. e p. pelos artigos 217 nº 1 e 218 nº 1 do Código Penal nas penas de oito (8) meses de prisão por cada um.
b)-Condenar o arguido pela prática de quatro (4) crimes de burla qualificada, p. e p. pelos artigos 217 nº 1 e 218 nº 2 alínea a) do Código Penal, respectivamente, nas penas de três (3) anos e dois (2) meses de prisão, dois (2) anos e quatro (4) meses de prisão, dois (2) anos e seis (6) meses de prisão e de dois (2) anos e seis (6) meses de prisão.
c)-Condenar o arguido pela prática de seis (6) crimes de falsificação de documento, p. e p. pelo artigo 256 nº 1 alínea c) e nº 3 do Código Penal, na redacção anterior à entrada em vigor da Lei nº 59/2007 de 4 de Setembro, respectivamente, nas penas de um (1) ano de prisão, um (1) ano de prisão, dois (2) anos de prisão, um (1) ano e dois (2) meses de prisão, um (1) ano e três (3) meses de prisão e um (1) ano e três (3) meses de prisão.
d)-Efectuado o cumulo jurídico das referidas penas, condenar o arguido numa pena única de seis (6) anos de prisão.
***Inconformado, da sentença, interpôs recurso o arguido.
São do seguinte teor as conclusões, (as conclusões servem para o recorrente resumir as razões do pedido – art. 412 nº 1 do CPP, sendo que o aqui recorrente em vez de concluir quase se limita a repetir a motivação do recurso, pelo que se fará resumo das mesmas) as quais delimitam o seu objecto: A)-Erro notório na apreciação da prova, pontos 5,8,10,11,15,18,21,24,25,26,27, dos provados e b) dos não provados.
1-No Acórdão recorrido, foi dado como não provado no Ponto b).
2-Salienta-se a perplexa, não reacção do ofendido perante os bancos e as entidades policiais aquando das sucessivas interpelações para o pagamento das letras e sobre as quais o ofendido sempre teve conhecimento.
3-Não mencionando o Acórdão, nem as testemunhas, ou ofendido, que o ofendido tenha feito qualquer participação as entidades judiciais ou tenha pedido esclarecimentos as entidades bancárias, quando devidamente advertido da existência destas mesmas letras por estas instituições.
4-Também não se provou que o ofendido tenha realizado qualquer chamada telefónica ao arguido, dando-lhe conta da sua insatisfação por este ter apresentado letras junto das instituições bancárias em que a assinatura do ofendido aparecia, indevidamente no local reservado ao aceitante.
B)-As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida 1- Da prova produzida fica-se a saber pelo depoimento do ofendido que este não tinha, nem tem, qualquer relação de amizade com o arguido.
2- Conheceram-se através de um amigo comum, e o contacto entre ofendido e arguido reportou-se, tão só, a um negócio que nem se veio a concretizar.
3- Não havendo qualquer outro tipo de relação pessoal ou negocial, entre ambos.
4- A partir de determinada data, o ofendido começou a ser confrontado com avisos de pagamento de letras em que seu nome constava como aceitante, sendo que o arguido era o sacador das mesmas.
5- Letras estas, que em determinada altura, final do ano de 1998, chegaram a atingir os 50.000.000$00, (cinquenta milhões de escudos).
6- Que mesmo após o conhecimento da existência de letras onde constava o seu nome no lugar de aceitante veio, em data posterior, o ofendido a ser notificado do vencimento de todas as letras em apreço nestes autos, através de sucessivas interpelações das entidades bancárias.
7- Que nunca se dirigiu as entidades bancárias e, ou, aos agentes judiciais para negar da autenticidade da sua assinatura.
8- Dos factos dados como provados nenhuma referencia se faz aos fictícios contactos telefónicos entre o arguido e o ofendido.
9- Motivo desde logo contraditório com o facto de o Tribunal "A quo” ter dado como não provado que o ofendido C... confrontado com as notificações referidas em 23) nada tivesse feito.
10- Na verdade o ofendido nada fez para fazer perecer a conduta "ilícita" do arguido.
C)- Ademais o tribunal" a guo" não fundamenta gue: 1- não tendo sido provado que o arguido tenha aposto pessoalmente os nomes manuscritos de B…, inscritos nas letras supra referidas designadamente nos locais destinados à assinatura do aceitante ou que tivesse pedido alguém para o fazer, (Cfr ponto b) dos factos provados, condene o arguido com base em que este tinha conhecimento da falsidade das assinaturas.
2- Ora verificado os "factos provados" os "factos não provados" e a fundamentação do douto acórdão, não se vislumbra de que forma, e em que medida, o arguido sabia da falsificação das assinaturas do ofendido à data da apresentação das letras.
D)- Erro notório da valoração da prova no depoimento do ofendido.
1- Conforme já supra citado o tribunal "a quo" violando os princípios da livre apreciação da prova deu como provado que nas letras em apreço nestes autos que a assinatura constante dos aceites tenha sido aposta sem o conhecimento ou o consentimento de B… ou da sociedade W...- Lda.
2- E, mesmo após o ofendido ter referido que teve conhecimento da existência de todas as letras antes do seu vencimento ou reforma, pois que era devidamente notificado pelas diversas agencias bancárias do seu vencimento.
3- E inerentemente do valor nelas inscritos, que segundo o mesmo ofendido chegaram a ser no valor de Esc. 50.000.000$00.
4- Certo é que, o ofendido não mantinha qualquer relação de amizade com o arguido e que - ainda segundo o ofendido - bastou-se por um simples telefonema ao arguido para que passasse, desde logo a acreditar piamente na palavra deste de que iria cumprir com as diversas e sucessivas letras "forjadas" em quantias que já nos longínquos anos de 1997 e 1998, se reportavam elevadíssimas quantias.
5- Na verdade, tendo sempre em consideração a experiencia do mais comum do mortais, não é sustentável, e com isso poder condenar o arguido a 6 anos de prisão, ter a plena convicção de que o ofendido não sabia, não permitiu, nem fez, antecipadamente, a aposição da sua assinatura nas referidas letras.
6- Tanto insustentável é esta "certeza", do tribunal "a quo" que em 06 Julho de 2011, no processo que correu termos na Vara de Competência Mista de Coimbra no Proc. n° 6656/00.7TDPRT o ofendido enquanto testemunha e depondo sobre os mesmos factos dos aqui em apreço, manteve a mesma peculiar versão.
7- No entanto, o Meritíssimo Juiz, suportando-se na sua sábia experiencia jurídica e nas regras de experiencia comum foi peremptório em afirmar da estranheza do "conto dos factos" trazido pelo ofendido.
8- E, assim neste caso, o Tribunal resolveu absolver o arguido, por Acórdão de 14 de Julho de 2011, sendo que uma das letras constante na acusação neste processo em que o arguido foi absolvido - Proc. Nº 6656/00.7TDPRT da Vara Mista de Coimbra, reportava-se a uma letra que tinha sido apreciada nos presentes autos e que o tribunal "a quo", com uma insustentável regra de experiencia, vem a condenar o aqui recorrente.
9- Os factos que serviram de fundamento à condenação resultam de um notório erro na valoração da prova que se traduziu numa sentença injusta violando ostensivamente o plasmado no art° 410, nº2 al c), e, por previdência, o art. 449, nº1, al c) ambos do C.P.Penal.
10- Requer a renovação da prova aos pontos 5, 8, 10, 11, 15, 18, 21, 24, 25, 26, 27 e b).
E)- Do crime de burla e falsificação 1- Observado o Acórdão constata-se que dos 6 documentos aqui em apreço, 5 referem-se a reforma de Letras e não a Letras Originárias.
2- Ora, no quadro da reforma, mesmo ocorrendo a falsificação, é indubitável que a Instituição bancária já recebeu parte do valor em débito e continua titular do direito sobre a Letra originária; 3- Mesmo que o aceite inicial fosse logo falso, é certo que a reforma não colocou o banco em situação pior do que aquela que já tinha e que o prejuízo ocorreu no momento da falsificação da letra originária e não da nova letra para reforma; 4- Por todo o exposto, com a entrega das letras descritas na acusação ao banco, em instância de reforma, o arguido não provocou qualquer prejuízo para os bancos e não os burlou, 5-O crime de burla pressupõe, desde logo, a intenção de obter um enriquecimento ilegítimo ou de causar um prejuízo e, no caso em apreço, tal intuito nunca se observou, justamente por a situação de reforma ser em absoluto insusceptível de obter um tal resultado.
6- À luz da mais singela experiência comum, tendo em consideração que os aceitantes são avisados pelos bancos para pagamento das letra em vencimento, não é minimamente verosímil que o arguido viesse a utilizar documentos que sabia serem falsificados para proceder, imagine-se, a pagamentos de valores de 2.000.000$00, 1.000.000$00, 1.000.000$00, 1.000.000$00, 1.500.000$00 e referente às reformas das 5 letras constantes do Douto Acórdão - daí não se poder dar como provado que o arguido ao apresentar esses títulos, para reforma, junto das instituições bancárias tivesse conhecimento que as assinaturas aposta no lugar do aceite fossem falsificadas, se é que o são.
7- Por outro lado, tratando-se de situação de reforma de títulos já descontados, mesmo a ter existido falsificação, resulta da natureza da operação que ela não é compatível com o intuito de prejudicar e/ou obter enriquecimento, justamente porque, como já se sublinhou, nas reformas o arguido pagou e o banco recebeu e, intuitos que não conduzissem a estes resultados não seriam susceptíveis de serem atingidos.
F)- Da não verificação do tipo legal de crime de falsificação de documento 1- Mutatis Mutandis do que se observou para o crime de Burla: Este crime tal como o de burla, é um crime intencional, não bastando o acto material de falsificação, é necessário que o agente actue com intenção de causar prejuízo a outrem ou de obter para...
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