Acórdão nº 03522/08 de Tribunal Central Administrativo Sul, 19 de Janeiro de 2012
Magistrado Responsável | ANA CELESTE CARVALHO |
Data da Resolução | 19 de Janeiro de 2012 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I.
RELATÓRIO Espaços ……….. – …………………., Lda.
, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal – Lisboa 2, datada de 18/07/2007 que, no âmbito da acção administrativa comum, sob a forma ordinária, instaurada contra o Município de ............
, julgou a acção improcedente, absolvendo o réu do pedido de condenação ao pagamento da quantia de € 431.341,56, acrescida de juros de mora, à taxa legal aplicável, desde a citação até efectivo pagamento.
Formula a aqui recorrente nas respectivas alegações (cfr. fls. 675 e segs. – paginação referente ao processo em suporte físico, tal como as demais referências posteriores), as seguintes conclusões que se reproduzem: “1. A sentença recorrida enferma de vício na apreciação da prova produzida, no processo lógico da sua valoração e subsequentemente, aplicou mal a lei, afastando-se clamorosamente da correcta aplicação do n° 3 do Art° 659° e do Art° 664°, ambos do CPC.
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Em discussão esteve a execução pela Recorrente, por subempreitada mas sem ter sido formalizado contrato escrito, de trabalhos de Arranjos Exteriores, para a C............, empreiteira do Recorrido.
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Perante dificuldades financeiras da empreiteira, o Recorrido assumiu o compromisso, com os empreiteiros em obra em 27Junho.2002 e com os futuros, que os valores por si pagos à empreiteira, seriam desde logo repartidos pelos subempreiteiros e fornecedores da empreitada, através de emissão de cheques que seriam de imediato endossados pela Empreiteira e entregue aos credores.
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A Recorrente, entrada em obra após a celebração desse compromisso, mas viu-o ser-lhe aplicável em Dezembro de 2002, com o pagamento de 40.300 €.
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O Recorrido veio a suspender os pagamentos aos subempreiteiros e sem que informasse, celebrou com a massa falida um acordo no qual liberta todos os meios financeiros e de garantias que poderiam e deveriam ser usados para a satisfação dos créditos da Recorrente.
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O Recorrido não leva a cabo o indispensável Inquérito Administrativo – Art° 223° e ss RJEOP.
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Quanto ao julgamento da matéria de facto, erra a sentença ao dar como não provado os quesitos 1, 3, 12, 33 e 37, já que quer documentalmente quer pela resposta positiva dada a factualidade conexa e constante de outros quesitos, a Recorrente entende que ao mesmo deveriam ser dados como provados.
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Já em sede de Apreciação, a sentença é perpassada pela focalização na aferição do exercício do direito de retenção previsto no Art° 267° do RJEOP.
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Sendo certo que passa para essa análise, depois de configurar correctamente a causa de pedir da A./Recorrente, que se funda na responsabilidade do Recorrido nos prejuízos causados à Recorrentes por actos ilícitos.
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O que importa, desde logo, incoerência e errada articulação da factualidade e de aplicação da lei.
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Nem a A. nem o R. deram impulso ou desenvolveram sob a égide daquele direito de retenção, o seu relacionamento subempreiteira/dono da obra.
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Pelo que, o Tribunal a quo ao pretender subsumir a factualidade que a A. descreve como causa de pedir, ao procedimento do Art° 267°, consome todos os vícios imputados supra.
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E, por esse caminho, mas passando pela nulidade do contrato de subempreitada por falta de forma – Art° 266° RJEOP – o Tribunal recorrido, recusa qualquer direito da A./Recorrente de haver junto do Recorrido a remuneração dos trabalhos por si executados.
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Aqui, desviando-se da boa interpretação e aplicação da lei, já que a nulidade do contrato de subempreitada por falta de forma, não pode ser invocada pelo empreiteiro, pelo que também não o pode ser pelo dono da obra – Art° 266° n°5 RJEOP.
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Reconhecendo que o Recorrido andou mal quando, no Acordo com a massa falida, libertou as garantias, bem como, quando deixou de levar a cabo o Inquérito Administrativo, a sentença, conclui, que são factos irrelevantes para a causa, pelo facto de se mostrar decretada a falência da C............ e ser no respectivo processo que todos os seus credores devem ver reclamados e ver reconhecidos os seus créditos.
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Sobremaneira, no que toca à omissão da realização do Inquérito Administrativo, tal entendimento relega esse procedimento para estatuto de menoridade que não lhe pertence, violando o disposto no Art° 223° e ss RJEOP.
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E, na verdade, depois de o Recorrido ter destruído todo o edifício, que ele próprio construiu, para que a Recorrente desenvolvesse os trabalhos da subempreitada, ao não abrir o Inquérito Administrativo, tornou irreversível os prejuízos causados.
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O Recorrido, com a emissão de um compromisso que foi exibido e invocado sempre que disso precisou para que os subempreiteiros e fornecedores prosseguissem a empreitada, já que o empreiteiro se mostrava completamente incapacitado, abandonando o cumprimento desse compromisso, formando acordo com a massa falida delapidador das garantias financeiras e de fiança, que eram o meio que o Recorrido tinha para honrar junto dos subcontratantes, acrescendo a omissão do Inquérito Administrativo, comportou-se de forma idónea a causar prejuízos, afectando a confiança que a Recorrente nele depositara.
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Sendo que essa confiança não era estranha à qualidade do Recorrido, Administração Autárquica.
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A sentença em recurso, nega que a Recorrente possa ter confiado plenamente no compromisso do Recorrido, intui que a Recorrente, considerando o grau de cultura do seu sócio gerente e o facto de ser amigo de um funcionário da C............, sabia que podia ficar sem receber as quantias empregues na realização dos trabalhos entregues ao Recorrido.
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Convicção do Tribunal que, além de seguir um discurso intelectivo de absurdo, é contrariada pela prova produzida.”.
Termina pedindo a revogação da sentença e a procedência da acção.
* O ora recorrido, notificado, não apresentou contra-alegações.
* O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA, não emitiu parecer.
* Colhidos os vistos legais foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II.
DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660º, n.º 2, 664º, 684º, nºs 3 e 4 e 690º, n.º 1 todos do CPC ex vi artº 140º do CPTA.
As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de: 1.
Erro de julgamento da matéria de facto, em relação aos quesitos 1, 3, 12, 33 e 37 [conclusões 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7]; 2.
Erro de julgamento de direito, com fundamento no errado enquadramento e configuração da causa de pedir, em especial, em relação ao exercício do direito de retenção [conclusões 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20 e 21]; III.
FUNDAMENTOS DE FACTO O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos: “1 – O R., através da Câmara Municipal de ............, pôs a concurso público a construção da obra designada por “Remodelação dos Arranjos Exteriores e das Escolas Preparatória e Secundária de ............”, de acordo com o programa de concurso e caderno de encargos (facto assente A)); 2 – Foi concorrente a esta obra a sociedade “C………… – Empreiteiros, S.A.”, além de outras, como a “S………..– Engenharia, S.A.” e “S……….– Construções, S.A.”, (facto assente B)); 3 – Apresentadas as propostas destas sociedades em 20/02/2001, foi deliberado em reunião ordinária da Câmara Municipal de ............ de 14/05/2001, adjudicar a execução da empreitada em causa à C……… – Empreiteiros, S.A., pela importância de 522.060.023$00 acrescida do IVA, tudo no valor de 548.163.024$00 (2.734.225,64€), (facto assente C)); 4 – No dia 20 de Junho de 2001 foi celebrado o contrato para a execução da empreitada supra referida, entre o Município de ............, ora Réu e a referida sociedade C………..– Empreiteiros, S.A., (facto assente D)); 5 – Consta da proposta a concurso da C…………– Empreiteiros, S.A., aprovada e integrada no contrato de empreitada referido, a declaração desta sociedade, conforme previsto na alínea f) do ponto 14.2 do Programa de Concurso, (facto assente E)); 6 – Este ponto concreto do Programa de Concurso determinava aos concorrentes que a sua proposta deveria ser instruída com vários documentos, entre eles o previsto na al. f) que consistia: “Declarações de compromisso subscritas pelo concorrente e por cada um dos subempreiteiros, nos casos e termos previstos no n° 6 do art.°. 266 do Dec. Lei n° 59/99, de 2 de Março.”, (facto assente F)); 7 – Em cumprimento da disposição prevista na al. f) do ponto n° 14.2 do Programa, a sociedade C…………. junta a sua declaração, em que expressamente refere: “… declara que não se aplica atendendo a que a empresa é detentora de todas as subcategorias/categorias solicitadas no Programa de concurso, conforme documentos anexos.”, (facto assente G)); 8 – O R. deu de empreitada, por contrato de 20 de Junho de 2001 à “C………. – Empreiteiros, SA” a execução da “Remodelação de Arranjos Exteriores e das Escolas Preparatória e Secundária de ............”, no valor inicial de 2.604.024,42, acrescido de IVA, (facto assente H)); 9 – Em 10 de Julho de 2001, teve lugar a consignação da empreitada geral contratada pelo R. com a “C………..”, (facto assente I)); 10 – O R. conhecia, pelo menos, desde 24 de Abril de 2002, que a “C…………” não se encontrava a cumprir com as suas obrigações perante os terceiros que lhe prestavam serviço na execução da empreitada do R., (facto assente J)); 11 – Em 4 de Junho de 2002, o Senhor Vice Presidente da Câmara convocara a “C………….” para uma reunião, “com carácter urgente”, para “analisar criteriosamente o reinicio das respectivas obras” de Remodelação das Escolas Secundária e Preparatória de ............ e Arranjos Exteriores, na sequência de reunião de obra na qual fora informado...
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