Acórdão nº 987/06.0TBFAF.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Janeiro de 2012

Magistrado ResponsávelSERRA BAPTISTA
Data da Resolução12 de Janeiro de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: AA veio intentar acção, com processo ordinário, contra BB pedindo que: a) seja declarado e reconhecido ser a legítima proprietário do prédio urbano melhor identificado na p. i.; b) o réu seja condenado a reconhecer tal direito e a restituir-lhe e entregar-lhe de imediato tal prédio, inteiramente livre de coisas e de pessoas, bem como a pagar-lhe, a título de indemnização, a quantia mensal de € 750,00, desde a data de ocupação, Outubro de 1991, até à efectiva entrega.

Alegando, para tanto, e em suma: Construiu uma casa de rés-do-chão e andar, que melhor descreve, em lote que comprou à Câmara Municipal de Fafe, em 18 de Julho de 1991, aquisição esta que registou a seu favor.

Há mais de 30 e 50 anos, que, por si e passados, está no uso, posse e fruição do referido lote de terreno, à vista e com pleno conhecimento de toda a gente, de forma continuada e sem oposição, na convicção de exercer direito de propriedade.

O réu vem ocupando o prédio desde Outubro de 1991.

Citado o réu, veio o mesmo contestar e reconvir, alegando, também em síntese: Em princípios de 1990 era casado, tendo-se separado e passado a viver com a autora, em Fafe.

Resolveu, por isso, adquirir a casa de habitação em causa, que negociou com a sociedade CC, com quem celebrou respectivo contrato-promessa, em 28/11/1990, pagando na totalidade o preço de 5.500.000$00. Tomou logo posse da casa e foi habitá-la.

Por pretender evitar que a sua mulher tivesse direito a metade do prédio e estar a ser pressionado pela vendedora para celebrar a escritura, pediu à autora que fosse ela a assumir a posição formal de adquirente, acordando ambos que, logo que aquele impedimento cessasse, transferiria para si a propriedade.

Assim, comunicou à vendedora que seria a autora a outorgar a escritura, o que sucedeu.

Em 15/5/93 a sua mulher veio a falecer, tendo, então, pedido à autora que outorgasse a escritura de transmissão do prédio, o que ela recusou.

A A. intentou uma acção contra si, que, sob o nº 179/99, correu termos no 2.º Juízo de Fafe, tendo improcedido a mesma, quanto ao pedido da autora e quanto ao pedido reconvencional do réu.

Tem vindo a fazer obras no prédio, que melhor descreve, tendo, ainda, mobilado a casa, no que despendeu cerca de € 60 000,00.

Em 18/8/1998 adquiriu à CM de Fafe, pelo preço de 17.500$00, uma parcela de terreno na parte traseira da casa, que anexou ao terreno de logradouro.

Desde Novembro de 1990 que instalou a sua residência e a do seu agregado familiar no prédio.

Pede, em reconvenção, que a ré seja condenada a cumprir o mandato sem representação, nos termos do qual se obrigou a outorgar a escritura de aquisição do prédio melhor descrito na p. i., em nome próprio e a transmitir posteriormente a propriedade para o réu, celebrando a respectiva escritura de transmissão do prédio.

E, se assim não se entender, que a ré seja condenada a restituir ao réu a quantia de 5.500.000$00, ou seja, € 27 433,88, acrescida de juros vencidos de € 4 755,46 e de juros vincendos, à taxa legal, até efectivo pagamento, bem como a quantia de € 60 087,29, equivalente ao custo das obras, mobílias e terreno a que melhor alude no seu articulado.

Replicou a autora, mantendo o por si alegado, declarando que apenas aceita os factos provados na anterior acção.

Foi proferido o despacho saneador, tendo sido fixados os factos tidos por assentes e organizada a base instrutória.

No decurso da audiência interpôs o réu recurso de agravo do despacho proferido em 20 de Março de 2009, que determinou a continuação da audiência para 8 de Junho de 2009, a fim de ser ouvida a testemunha DD a apresentar pela autora, que não comparecera naquela data nem nas anteriormente agendadas. Tendo o mesmo sido recebido, com subida diferida.

Realizado o julgamento, foi decidida a matéria de facto da base instrutória pela forma que do despacho de fls 372 a 374 consta.

Foi proferida a sentença que julgou a acção improcedente, absolvendo o réu do pedido e, na procedência da reconvenção, condenou a reconvinda a cumprir o mandato sem representação celebrado com o reconvinte, transmitindo para este a propriedade do prédio descrito na CRP de Fafe sob o nº 00000000000 e inscrito na matriz sob o art. 710.

Inconformada, veio a autora interpor recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Guimarães, onde, por acórdão de 1/3/11, na sua parcial procedência, foi revogada a sentença recorrida na parte em que julgou a acção improcedente relativamente ao pedido formulado em a) da p. i., declarando-se a autora/reconvinda proprietária do prédio urbano descrito no art. 1.º da mesma p. i.

De novo irresignada, veio a autora pedir revista para este Supremo Tribunal de Justiça, formulando, na sua alegação, as seguintes conclusões: 1ª - Transitou em julgado a decisão, constante do acórdão ora recorrido, que declarou a Recorrente proprietária do prédio referido e identificado no artigo 1° da petição inicial.

2ª - Todavia, o mesmo aresto confirma a sentença que condena a mesma Recorrente "a cumprir o mandato sem representação celebrado com o reconvinte BB transmitindo para este a propriedade do referido prédio".

3ª - O contrato de mandato sem representação é uma modalidade do contrato de mandato, definido no art. 1157° do CC, e, por isso, como contrato que é, "tem na sua raiz determinante um acordo de vontades" - cfr. citado Ac. do ST J, de 29.06.93, 4ª - Sendo, "o contrato estabelecido entre quem encarrega outrem de praticar um ou mais actos jurídicos por conta do mandante, e quem aceita essa obrigação, o mandatário" - cfr. dito Acórdão do STJ.

5ª - Ora, do factualismo provado não resulta minimamente provado esse indispensável acordo de vontades que revele que o Recorrido a encarregou de comprar para ele o prédio referido e sobretudo que a Recorrente aceitou essa incumbência e se obrigou a transmitir a ele o dito prédio.

6ª - Na verdade, o facto em que assenta a constatação da existência de tal contrato é o da alínea H), onde se diz que, "Para que o prédio ficasse em nome da Autora, apesar desta e daquela firma vendedora bem saberem que o mesmo era propriedade do Réu, até que o Réu obtivesse o divórcio, para depois o prédio ser escriturado em seu nome".

7ª - Todavia, deste facto não resulta minimamente que tenha existido o acordo de vontades no sentido referido nas Conclusões 4ª e 5ª supra, e designadamente que a Recorrente se tenha obrigado a transmitir para o Recorrido o prédio descrito no artigo 1.º da petição inicial - cfr. citado ac. do ST J, de 29.06.93.

8ª – Não se verificando a existência dessa assumpção de tal obrigação, elemento típico e essencial do contrato de mandato sem representação, é óbvio que tem de concluir-se pela inexistência de tal contrato e, consequentemente, pela não existência da obrigação de efectuar tal transmissão.

9ª – Assim, por manifesta violação do disposto nos arts 1157.º, 1180.º e 1181.º, nº 1 do CC, deve o acórdão recorrido ser revogado e em sua substituição ser proferido acórdão julgando totalmente improcedente a reconvenção deduzida pelo recorrido.

10ª- Mesmo que porventura se viesse a considerar existir tal contrato de mandato sem representação, o que não se...

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