Acórdão nº 127/09.3PEFUN.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelSANTOS CARVALHO
Data da Resolução23 de Novembro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça 1. A, nascido em 12-10-1951, juntamente com outro, foi julgado nas Varas Mistas do Funchal, no âmbito do processo n.º 127/09.3PEFUN da 2ª secção e, por acórdão de 19/07/2011, foi condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art.º 21.º, n.º 1, do DL 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à tabela C a ele anexa, na pena de 6 anos de prisão.

  1. O arguido interpôs recurso dessa decisão para o STJ e concluiu assim: 1°- O presente recurso versa matéria de direito 2º- O arguido foi condenado a uma pena de prisão de 6 anos de prisão pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes p. p. pelo artigo 21 do DL 15/93 de 22/01.

    1. - Da quantidade de produtos estupefacientes apreendidos bem como a falta de sofisticação dos meios utilizados pelo arguido na venda de pequenas doses de produtos estupefacientes é notório que estamos perante um pequeno traficante de rua.

    2. - O arguido vendia produtos estupefacientes directamente ao consumidor junto à sua residência sem recurso a meios sofisticados, arriscando a ser detectado pelos agentes policiais conforme veio a acorrer.

    3. - A forma de actuação do arguido aliado à sua toxicodependência e à quantidade de produto estupefaciente apreendido, permite-nos concluir que estamos perante uma situação de pequeno tráfico completamente distinta da do grande tráfico, razão pela qual a actuação do arguido deveria ter sido enquadrada no previsto no artigo 25 do DL 15/93 de 22/01.

    4. - Dá-se por reproduzidos os factos constantes no relatório social do arguido.

    5. - A falta de antecedentes criminais pela prática do crime pelo qual foi condenado, bem como a sua idade avançada, o facto de ser doente, ter-se mostrado arrependido, ter projectos de trabalho no futuro e de ter deixado de consumir produtos estupefacientes, permite-nos concluir que é possível estabelecer um juízo de prognose no sentido de se concluir que a simples ameaça do crime permitirá concluir que o arguido irá manter a sua conduta de acordo com as normas sociais.

    6. - Assim a pena a aplicar ao arguido não deverá ultrapassar os 4 anos de prisão a qual deverá ser suspensa nos termos do previsto no artigo 50 do C.P.

    7. - A suspensão da execução da pena de prisão acompanhada das medidas e das condições admitidos na lei que forem consideradas adequadas a cada situação permite, além disso, manter as condições de sociabilidade próprias a condução da vida no respeito pelos valores de direito como factores de inclusão, evitando os riscos de fractura social, familiar, laboral e comportamental como factores de exclusão.

    8. - Não são considerações de culpa que devem ser tomadas em conta, mas juízos de prognósticos sobre o desempenho da personalidade do agente perante as condições da sua vida, o seu comportamento e as circunstâncias do facto, que permitam fazer supor que as expectativas de confiança na prevenção da reincidência são fundadas.

    9. - Mas mesmo que assim não se considere, parece-nos que a pena aplicada ao arguido é deveras exagerada e desproporcional tendo em consideração os factores sociais e pessoais do arguido aliado ao seu arrependimento.

    10. - O arguido é uma pessoa de idade avançada além de ser doente.

    11. - A manutenção do arguido num estabelecimento prisional por longos seis anos poderá inviabilizar a sua reinserção social além de contribuir para a sua exclusão social dado que irá ter problemas acrescidos em integrar-se no mundo laboral quando tiver mais de 65 anos de idade.

    Pelo exposto, deve ser dado provimento ao presente recurso condenando-se o arguido pela prática de um crime p. p. pelo artigo 25 do DL 15/93 de 22/01 na pena de 4 anos de prisão a qual deverá ser suspensa na sua execução nos termos previstos no artigo 50 do C.P. ou em alternativa aplicando-se ao arguido uma pena que não deverá ser superior a cinco anos de prisão.

  2. O Ministério Público, tanto na 1ª instância como no STJ, concluiu pela improcedência do recurso.

  3. Cumpre decidir.

    As principais questões a decidir são as da qualificação jurídica (tráfico comum ou tráfico de menor gravidade), depois a da medida da pena e, se a mesma vier a ser fixada em 5 ou menos anos de prisão, a da possibilidade da sua suspensão.

  4. FACTOS PROVADOS 1. Como forma de obter ganhos financeiros e, assim, prover ao seu sustento e dispor de dinheiro para todas as suas despesas, o arguido A, desde data não concretamente apurada, mas anterior a 26 de Setembro de 2009, tomou a resolução de proceder à compra e posterior revenda a terceiros de produto estupefaciente, nomeadamente, cocaína.

  5. Assim, no exercício de tal actividade, no dia 26 de Setembro de 2009, pelas 23:00 horas, na zona da entrada da sua residência sita no B, o arguido A foi surpreendido na posse de € 60,00, divididos em 3 notas de € 20,00.

  6. De seguida, concretamente no período compreendido entre as 23:00 horas e 01:00 horas, já no interior da residência do arguido A, situada na morada a que acima se fez referência, foi localizado o seguinte: (i) uma embalagem contendo um produto, que se veio a revelar ser 23,730 g de cocaína, que se encontrava dentro de uma gaveta da mesinha de cabeceira do quarto do arguido; (ii) uma embalagem contendo um produto, que se veio a revelar ser 0,192 g de cocaína, que se encontrava em cima da mesinha de cabeceira do quarto do arguido; (iii) € 1450, 00 em notas do Banco Central Europeu, divididas em 20 notas de € 50,00, 22 notas de € 20,00 e 1 nota de € 10,00, que se encontravam dentro do bolso de uma camisa, no interior do guarda-fatos do quarto do arguido; (iv) um telemóvel de marca «Nokia», (v) um telemóvel, cuja marca se desconhece, mas que pertence à operadora Vodafone»; (vi) uma balança digital, marca «Becken, Pesice», embrulhada num cobertor, no interior do guarda-fatos do quarto do arguido; (vii) um moinho de café, marca (Taurus, Aromatic», embrulhado num cobertor, dentro do guarda-fatos do quarto do arguido; (viii) um punhal, de marca «Muela Bowie», que se encontrava em cima da mesa de cabeceira, no quarto do arguido; 4. Os objectos acima elencados eram usados pelo arguido A no negócio de compra e venda de produto estupefaciente, concretamente na sua preparação, corte, pesagem e acondicionamento.

  7. O dinheiro provinha dessa actividade, na medida em que tais substâncias eram adquiridas pelo arguido a um preço inferior ao preço de revenda, permitindo obter, concomitantemente, um lucro.

  8. Na sequência dos factos acima referidos, em 28 de Setembro de 2009, pelas 16:35 horas, o arguido A foi submetido ao interrogatório judicial, onde se considerou indiciada a prática de um crime de tráfico de estupefacientes, tendo-lhe sido aplicadas as medidas de coação de Termo de Identidade e de Residência, de apresentações semanais no posto policial da área da sua residência e de proibição de se ausentar da ilha da Madeira.

  9. Porém, não obstante ter sido surpreendido na posse do produto estupefaciente e dos demais objectos supra mencionados e da solene censura feita em sede de 1º interrogatório judicial, o arguido manteve o propósito de adquirir para posterior revenda produto estupefaciente, nomeadamente cocaína.

  10. Assim, desde essa data, na execução desse propósito, o arguido A, a partir da sua residência, sita na C, e na imediação da entrada da mesma vendeu por número não determinado de vezes tais produtos aos consumidores que o procurassem e que se mostrassem interessados.

  11. O arguido procedia ao embalamento de doses individuais destinadas a ser entregues, a troco de dinheiro e outros valores, a indivíduos que as quisessem adquirir.

  12. O arguido A era contactado, pessoalmente e através dos seus vários telemóveis, por consumidores de cocaína, os quais lhe solicitavam a entrega destes produtos em doses individuais, sendo que o arguido acordava com eles o preço e a quantidade do produto, bem como o local da sua entrega.

  13. No dia 22 de Outubro de 2010, por volta das 21:45 horas, no hall de entrada da residência do arguido A, sita na C, área desta comarca do Funchal, o arguido A transportava consigo: (1) no bolso da camisa, 2 embalagens de um produto, que se veio a revelar ser 21,680 g de cocaína; (ii) num dos bolsos das calças, uma balança electrónica de bolso, marca "Tangeant", e (iii) um telemóvel, marca "Nokia"; 12. Nessas mesmas circunstâncias de tempo de lugar, o arguido A autorizou a entrada dos agentes da Polícia de Segurança Pública na sua residência.

  14. Nesse local foram ainda encontrados: (i) 8 embalagens, contendo um produto que mais tarde se veio a revelar ser 148,335 g de cocaína encontradas dentro de uma bolsa azul, num compartimento da sala; (ii) 2 embalagens, contendo uma substância que se velo a revelar ser 17,070 g de cocaína; (iii) 2 embalagens, contendo uma substância que se veio a revelar ser 9,183 g de cocaína; (iv) € 1060,00 em notas do Banco Central Europeu, encontradas dentro de um saco no interior de uma gaveta da mesinha de cabeceira do quarto do arguido A; (v) € 2 070, 00, em notas do Banco Central Europeu, encontradas dentro de uma bolsa azul num compartimento da sala; (vi) uma balança de cozinha, marca "Becken" encontrada dentro da mesma bolsa azul; (vii) um moinho de café, marca "Beckcn", encontrado no interior de um móvel de cozinha; uma...

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