Acórdão nº 161/09.3GCALQ.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelMANUEL BRAZ
Data da Resolução23 de Novembro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: No 1º juízo do Tribunal Judicial da comarca de Alenquer, em processo comum com intervenção do tribunal colectivo, foi, em 18/02/2011, proferido acórdão, que, além do mais, condenou o arguido AA.

-a 8 anos de prisão, pela prática de um crime de roubo agravado, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 210º, nºs 1 e 2, alínea b), e 204º, nºs 1, alínea a), e 2, alíneas e), f) e g), do Código Penal, sendo ofendida BB; -a 8 anos de prisão, por um crime de roubo agravado, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 210º, nºs 1 e 2, alínea b), e 204º, nº 2, alíneas a), e), f) e g), do mesmo código, sendo ofendida “Casa ......... – Companhia das Vinhas, SA”; -a 8 anos de prisão, por cada um de dois crimes de roubo agravado, p. e p. pelas disposições conjugadas desses artigos 210º, nºs 1 e 2, alínea b), e 204º, nº 2, alíneas e), f) e g), sendo ofendidos CC e DD; -a 15 meses de prisão, por cada um de três crimes de sequestro, p. e p. pelo artigo 158º, nº 1, do CP; -a 15 meses de prisão, pela prática de um crime de burla informática, na forma continuada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artºs 221º e 79º do CP; -a 1 ano e 9 meses de prisão, pela prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86º, nºs 1, al. c), e 2, da Lei 5/2006, na redacção que lhe foi dada pela Lei 17/2009, de 6 de Maio, e ainda, ao abrigo do artº 90º, na pena acessória de interdição do uso e porte de arma por 3 anos; -a 6 meses de prisão, pela prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86º, nºs 1, al. d), e 2, do mesmo diploma; -a 1 ano e 8 meses de prisão, pela prática de cada um de dois crimes de falsificação de documento, p. e p. pelo artigo 256º, nºs 1 e 3, do CP; -a 3 anos e 6 meses de prisão, pela prática de um crime de resistência e coacção sobre funcionário, p. e p. pelo artigo 347º, nº 1, do CP; e -em cúmulo jurídico, na pena única de 16 anos e 8 meses de prisão. O arguido interpôs recurso desse acórdão para a Relação de Lisboa, que, por acórdão de 06/07/2011, decidiu: -considerar que não opera a qualificativa da alínea g) do nº 2 do artº 204º relativamente a qualquer dos crimes de roubo, por não se terem provado factos que integrem a figura de bando; -absolver o arguido da acusação relativamente ao crime de roubo de que seria ofendida “Casa ......... – Companhia das Vinhas, SA”; -manter as penas aplicadas por cada um dos restantes crimes; -aplicar, em cúmulo, a pena única de 13 anos e 6 meses de prisão.

Ainda inconformado, o arguido AA interpôs recurso do acórdão da Relação para o Supremo Tribunal de Justiça, concluindo assim a sua motivação: «1. Existe deficiência parcial da gravação da sessão de 29.09.2010, como do suporte digital da gravação consta (CD 1) parte substancial do que o recorrente relatou ao Tribunal (protestando, no pouco que se ouve, a sua inocência), resulta completamente inaudível nas suas declarações produzidas entre os minutos 2.28 e os 4m.12, sendo que a referida omissão de gravação constitui nulidade inominada prevista no art° 201° CPC, aplicável ao processo penal por força do art° 4° do CPP.

  1. Consistindo essa mesma nulidade (por violação do requisito cominado no art° 363° do CPP) na omissão de uma formalidade (gravação audível em suporte digital da totalidade das declarações do arguido).

  2. Podendo essa mesma omissão influenciar no exame ou na decisão da causa (“apud”, o mencionado art° 201° do CPC, aplicado “in casu” por integração de lacuna (art° 4° do CPP). E sendo certo que se intui da parte anterior à que não se encontra audível que o recorrente falava sobre se costumava deslocar ou não a Espanha, sendo que tal circunstância assume relevo processual para a defesa do recorrente.

  3. Por tal razão, a apontada deficiência tem efectivamente relevância para a decisão da causa (já que um dos argumentos utilizados no acórdão para a condenação do recorrente foi o ter-se considerado que “os arguidos já trabalharam em Espanha, local onde estavam e se deslocavam frequentemente” (relembrado no recorrido acórdão a fls. 54 – 2° parágrafo).

  4. Ao assim não decidir, o acórdão ora em crise não fez a melhor nem a mais acertada interpretação do disposto no art° 201° do CPC (com interpretação subsidiária ao processo penal por força do art° 4° do CPP). Mantendo o recorrente que tal nulidade deve ser declarada.

  5. Estando o arguido – ora recorrente – em tempo de invocar essa mesma nulidade (art° 204° n° 2 do CPC) entre outros ou ainda dada a previsão do disposto no art° 118°, n° 1, do CPP concatenado com o disposto no art° 363° do CPP (a omissão em causa constitui nulidade processual por violação do apontado preceito: o art° 363° do CPP), devendo por isso tal nulidade ser reparada nos termos do disposto no art° 123°, n° 2, do CPP).

  6. Da omissão de pronúncia – art° 379°, 1-e), do CPP: Havendo o recorrente alegado, em sede de motivação do recurso para a Veneranda RL que ... “no essencial, os depoimentos de ofendidos e testemunhas de acusação, em tempo arroladas pelo Digno Ministério Público, depondo acerca do que viram e ouviram, não se encontraram em condições de identificar, por uma vez que fosse o aqui recorrente, como o autor de algum dos perpetrados roubos e sequestros. ” E que: “Nesta conformidade, na audiência não se logrou fazer prova da factualidade constante dos apontados itens 1 a 28 (com excepção do item 20 a fls. 10) da matéria de facto, no tocante à eventual participação criminosa do recorrente AA. E ainda que: “Não só o arguido nega peremptoriamente a prática desses crimes, (CD 1 in gravação da audiência de 29.09.2010 11h. 09 a 11h. 49) como da Acta parcelarmente consta, como os mesmos não foram confessados pelos seus co-arguidos, como ainda (e o que é mais relevante) nenhum dos ofendidos reconheceu em audiência, ou em Auto de Reconhecimento efectuado nos termos legais (art° 147° do CPP) os arguidos” deveria o douto acórdão de que ora se recorre tecer pronúncia sobre essa alegação.

  7. Uma vez que a impugnação da matéria e facto cumprira os ditames e exigências legais, nomeadamente os requisitos contidos no art° 412°, n° 4, do CPP.

  8. 0 recorrido acórdão, ao acentuar que o TRL “não tem de analisar todos os argumentos aduzidos pelos arguidos” e como corolário dessa análise que “não se irá rebater todos os argumentos dos arguidos recorrentes, já que o que interessa é saber se os factos estão correctamente julgados” concluindo-se que “quanto à matéria de facto constante dos autos, consideramos que a mesma foi correctamente julgada, pelo que no que respeita à apreciação e fundamentação dos factos dados como provados, bem como no que respeita ao exame critico das provas, remetemos para o acórdão recorrido em face do rigor e clareza do mesmo” (a fls. 52 do acórdão do TRL) comete a nulidade de omissão de pronúncia prevista no art° 379°, n° 1-e), do CPP, a qual deve ser declarada.

  9. Já num outro ângulo de apreciação processual, (que também teria sido violado, pela primeira instância, por erro interpretativo, o disposto nos art°s 127° e 355° do CPP, na parte em que não teceu pronúncia sobre a violação alegada pelo recorrente ao se considerar provada a participação do aqui recorrente AA no tocante à comparticipação criminosa nos crimes de sequestro, roubo e coacção sobre funcionário), o douto e recorrido acórdão não teceu pronúncia, cometendo também por tal facto a apontada nulidade de omissão de pronúncia.

  10. Quanto ao crime de resistência e coacção sobre funcionário deveria o recorrente ter sido absolvido, por ausência absoluta de prova nesse sentido (o exame pericial não prova que o recorrente tivesse disparado e o depoimento dos inspectores da PJ mostra-se inconclusivo como se alegou atempadamente e não mereceu reparo por parte do recorrido acórdão).

  11. Das medidas das penas parcelares: Sempre sem conceder, as penas aplicadas mostram-se de grande severidade e demasiado elevadas atentos os critérios erigidos no art° 40°, n°s 1 e 2, do Código Penal e as finalidades das penas na sua dupla vertente: reposição do valor jurídico (comunitário) na norma violada e reintegração do agente na sociedade. Assim, atenta a primariedade do recorrente, a sua juventude e a confissão parcial dos factos, deveria ter este sofrido as seguintes penas parcelares: 13. Quanto aos crimes de roubo agravado a pena não deveria exceder 6 anos e seis meses por cada um deles. Quanto aos crimes de sequestro atender-se-ia como mais ajustada a pena de 12 meses de prisão por cada um. No crime de burla informática, bem como nos crimes de falsificação, na forma continuada a pena, a pena a aplicar deveria situar-se em 1 ano de prisão.

  12. Ou seja, uma vez operado o respectivo cúmulo jurídico, deveria o recorrente ser condenado em pena que não ultrapassasse os 9 anos de prisão. Ao assim não decidir o recorrido acórdão violou o disposto no art° 40°, 1 e 2, e 71°, 1 e 2, do C.P.

    Não tanto pelo sucintamente alegado, ao declarar as apontadas nulidades e ao absolver o recorrente da prática do crime de resistência e coacção sobre funcionário (mas mantendo a condenação pela detenção de arma proibida) e libertando-o da pesada pena de prisão que lhe foi aplicada – antes reformulando o cúmulo em ordem a uma condenação que não ultrapasse os 9 anos de prisão – revogando a decisão ora em crise nos requeridos termos, e substituindo-a por outra que, por mais douta e acertada, decida como peticionado, exercerão Vossas Excelências a melhor e mais acostumada JUSTIÇA».

    Respondendo, o MP defendeu a improcedência do recurso.

    O recurso foi admitido.

    Neste Supremo Tribunal, o MP pronunciou-se deste modo: -não se verifica qualquer das nulidades arguidas pelo recorrente; -a pretendida absolvição releva do inconformismo do recorrente com a decisão da matéria de facto, de que o STJ não pode conhecer; -as penas parcelares, todas não superiores a 8 anos de prisão, são insusceptíveis de reexame; -a pena única foi correctamente fixada.

    Foi cumprido o artº 417º, nº...

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