Acórdão nº 4130/09.5TACSC.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelLU
Data da Resolução09 de Novembro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência na 4ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra Em decisão instrutória proferida nos autos supra identificados, decidiu o tribunal: “(…) por se entender que os factos apurados não constituem indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou medida de segurança, o tribunal decide não pronunciar o arguido, A..., pela prática dos crimes de que vem acusado pela assistente, B....” Inconformada com o decidido, a assistente interpôs recurso no qual apresentou as seguintes conclusões (transcrição): 1° As testemunhas da Recorrente não tiveram conhecimento dos factos que o Recorrido articulou no requerimento de alegações porque a Recorrente deles lhes deu conhecimento, 2° Mas porque acompanharam o processo de responsabilidades parentais, como também uma delas foi testemunha da Recorrente naquele processo.

  1. E porque assistiram e constataram como a Recorrente se sentiu abalada, moralmente ofendida e enxovalhada na sua honra e consideração com as afirmações do Recorrido naquela peça processual; 4° Não foram apenas as testemunhas da Recorrente que tiveram conhecimento do teor das alegações do Recorrido no processo de responsabilidades parentais, como também os Exmos. Senhores Juízes, Magistrados, funcionários judiciais, restantes testemunhas da Recorrente, bem como as testemunhas do Recorrido, assistentes sociais que subscreveram os relatórios sociais e ainda todos aqueles que tomaram e / ou vão tomar conhecimento daquela peça processual.

  2. E desde logo a Recorrente, quando tomou conhecimento do requerimento do Recorrido se sentiu profundamente ofendida, enxovalhada, humilhada, denegrida com tais afirmações do Recorrido, que puseram em causa o seu bom-nome, enquanto mãe, mulher e profissional.

  3. Os crimes contra a honra consumam-se quando a imputação difamatória ou injuriosa é compreendida pelos destinatários. É nesse momento que se viola uma pretensão de respeito pela dignidade devida à pessoa humana.

  4. No que diz respeito ao elemento subjectivo do crime, cimentou-se a orientação na doutrina e jurisprudência de que basta o dolo genérico, em qualquer das suas formas, de directo, necessário ou eventual para integrar o elemento subjectivo da infracção.

  5. Por se tratar de crimes de perigo, para a verificação do elemento subjectivo nos crimes de difamação e injúria, não é necessário que o agente, com o seu comportamento, queira ofender a honra ou a consideração alheias, nem mesmo que se haja conformado com esse resultado, ou sequer que haja previsto o perigo, bastando a consciência da genérica perigosidade da conduta ou do meio da acção previstos nas normas incriminatórias.

  6. Basta que o agente tenha consciência que as expressões utilizadas são de molde a produzirem ofensa á honra e consideração do lesado.

  7. Os factos e juízos imputados à Recorrente pelo Recorrido são claramente ofensivos da honra e consideração devida a qualquer pessoa e constituem um comportamento com objecto eticamente reprovável, de forma a que a sociedade não lhe fica indiferente, reclamando a tutela penal de dissuasão desse comportamento.

  8. O Recorrido, ao utilizar as expressões que constam do seu requerimento de alegações, acima, parcialmente, reproduzidas, teve, sem qualquer margem de dúvida, consciência que estava a ofender a honra e consideração da Recorrente.

  9. E utilizou aquelas expressões intencionalmente para ofender a honra e consideração da Recorrente, bem sabendo que tal lhe era proibido por lei.

  10. As ofensas à honra que decorram do exercício de um direito só podem ter-se como justificadas, desde que sejam proporcionais e necessárias ao processo em causa.

  11. As expressões usadas pelo Recorrido não justificam o exercício legítimo de um direito, como se pode constatar da decisão proferida pelo Meritíssimo Juiz do processo de Alteração das Responsabilidades Parentais, junta aos presentes autos, que não lhe faz qualquer alusão.

  12. O Recorrido não logrou provar aqueles factos, inverídicos e desonrosos, que imputou à Recorrente.

  13. Tal não impediu que o Meritíssimo Juiz decidisse alterar o exercício de regulação das responsabilidades parentais, fixando a residência das menores com o pai, o aqui Recorrido.

  14. O comportamento do Recorrido foi premeditado e com intenção de chocar a sensibilidade da Recorrente e de a maltratar.

  15. As expressões usadas pelo Recorrido não estão justificadas pelo contexto em que foram proferidas, porque desnecessárias ao exercício dos seus direitos processuais, revelando-se assim especialmente censuráveis, porquanto extravasam do normal e ultrapassam os limites impostos ao exercício do contraditório, 19° Colidem com a honra, consideração e bom-nome da Recorrente e fazem incorrer o Recorrido na prática de factos integradores dos crimes de difamação e injúria, por tal devendo este ser pronunciado.

  16. O Recorrido já foi condenado por crime de injúrias cometido contra a Recorrente, no processo nº 222/08.6SAGRD, 20 Juízo Criminal, Tribunal Judicial da Guarda e no foi também arguido no pro-cesso nº 206/09.7SAGRD, 2° Juízo Criminal, Tribunal Judicial da Guarda, no âmbito do qual formalizou um pedido de desculpas á Recorrente, tendo esta desistido da queixa crime apresentada com aquele.

  17. O Meritíssimo Juiz de Instrução devia ter proferido despacho de pronúncia, não o tendo feito violou os artigos 1800, 1810 e 182 do C. Penal, o art. 308° do C. P. Penal e o art. 1540 do C. P. Cvil.

  18. Pelo supra exposto e ainda pelo que doutamente se suprirá, deve a decisão instrutória recorrida ser revogada e substituída por decisão que pronuncie o arguido, aqui Recorrido, pelos factos descritos, com as legais consequências.

Respondeu o arguido e o Ministério Público defendendo a manutenção da decisão recorrida.

O recurso foi admitido para subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito suspensivo.

Nesta instância o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no qual se manifesta pela improcedência do recurso.

No âmbito do art.º 417.º, n.º 2 do Código Penal a assistente nada disse.

Os autos tiveram os legais vistos após o que se realizou a conferência.

Cumpre conhecer do recurso Constitui entendimento pacífico que é pelas conclusões das alegações dos recursos que se afere e delimita o objecto e o âmbito dos mesmos, excepto quanto àqueles casos que sejam de conhecimento oficioso.

É dentro de tal âmbito que o tribunal deve resolver as questões que lhe sejam submetidas a apreciação (excepto aquelas cuja decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras).

Cumpre ainda referir que é também entendimento pacífico que o termo “questões” não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir.

Questões a decidir segundo as conclusões: - Integração jurídico-criminal dos factos indiciados Passamos a transcrever os trechos do despacho recorrido que consideramos relevantes para a decisão: “(…) B..., com os sinais dos autos, deduziu acusação particular contra A..., imputando-lhe a prática, em autoria material e na forma consumada de crimes de difamação e injúria, ps. e ps. pelos art°s 180° n° 1 e 181 ° n° 1, “ex vi” do art° 182°, todos do C. Penal, agravados nos termos da alínea a) do n° 1 do art° 183°, também do C. Penal, por força do meio pelo...

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