Acórdão nº 718/03.6TBPNI.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelGABRIEL CATARINO
Data da Resolução15 de Novembro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. – Relatório.

    Desavinda com o decidido na apelação que interpôs da decisão proferida no tribunal Judicial de Peniche que tendo julgado improcedentes os pedidos formulados pelos autores/recorrentes, AA e mulher BB, recorrem de revista, havendo que considerar os sequentes, I.1. – Antecedentes Processuais.

    “I. AA e BB intentaram contra CC, DD e EE, acção declarativa com processo comum, sob a forma ordinária, pedindo que: - Se declare nula a cláusula da constituição de propriedade horizontal que considera bem comum do condomínio “dois corredores, um na parte lateral norte e outro no tardoz, lado poente, os quais dão também de servidão de passagem de pessoas para os anexos contíguos a poente”; - Se declare a extinção da servidão de passagem, em causa; - Se condenem os 2.º e 3.º réus – DD E EE –, presentes e/ou futuros inquilinos destes, de se absterem de praticar quaisquer actos que impeçam ou diminuam o pleno exercício do direito de propriedade dos autores sobre os corredores em causa; - Se condenem os réus a pagarem aos autores uma indemnização por todos os danos, prejuízos e despesas causados com a presente situação, a apurar em execução de sentença.

    Alegaram, em síntese, que os autores são donos e legítimos possuidores da fracção “A” do prédio constituído em propriedade horizontal, descrito na CRP de Peniche sob o n.º 01519, a qual adquiriram livre de ónus ou encargos; que a referida fracção “A” é uma moradia, composta também por logradouro, e é geminada com a moradia pertença da 1.ª ré, designada de fracção “B”; que a confrontar e contíguos com a propriedade dos autores – na parte do logradouro - encontram-se os prédios pertencentes aos 2° e 3° réus; que atravessando o logradouro da propriedade dos autores encontram-se dois corredores os quais são partes comuns, porquanto assim foram afectos pela constituição do regime propriedade horizontal, servindo igualmente de justificação de passagem para a propriedade dos 2° e 3° réus, sendo, no entanto, tal manutenção da servidão de passagem desnecessária, devendo, por isso, ser extinta; que a 1ª ré não necessita dos corredores para aceder à via pública, podendo aceder a esta pela sua própria fracção; que o titulo constitutivo de propriedade horizontal estabelece uma restrição ao direito de propriedade dos autores, ao constituir como bem comum do condomínio, um bem próprio daqueles, fora dos casos legal e taxati-vamente previstos no art. 1421.º, do CC, pelo que deve ser considerada nula a cláusula do título constitutivo de propriedade horizontal, que estatui que são bens comuns “dois corredores um na parte lateral norte e outro no tardoz, lado poente, os quais dão também de servidão de passagem de pessoas para os anexos contíguos a poente”; que há violação do durei-to de propriedade dos autores pela passagem desnecessária de pessoas pelo referido logradouro para os prédios vizinhos contíguos pertencentes aos 2° e 3° réus, porquanto os terrenos onde estão construídos os edifícios e seus anexos, pertença destes, sempre tiveram acesso directo (ou sua possibilidade) à estrada – via pública, podendo utilizá-la como passagem das pessoas e bens que a eles se dirigem; que os 2º e 3º réus arrendaram os ditos anexos a terceiros, mas impediram-nos do acesso à estrada pelo terreno onde estão construídos; e que, os 2° e 3° réus abusivamente, contra a vontade dos autores beneficiam da passagem em propriedade alheia e recusam-se, obstinadamente, a deixar de o fazer, apesar dos réus já terem sido várias vezes interpelados para esse efeito.

    Os réus DD e EE contestaram conjuntamente e defenderam-se por impugnação e por excepção.

    Por excepção invocaram a ilegitimidade passiva do réu DD, por não ter sido demandada a mulher deste (FF).

    Por impugnação alegaram, em suma, que os corredores em causa não são propriedade dos autores uma vez que é a própria escritura de constituição de propriedade horizontal que estabelece que os dois corredores são bens comuns; que quando os autores adquiriram a fracção de que são proprietários tinham pleno conhecimento que existiam dois corredores que eram partes comuns; que tais corredores são uma servidão de passagem, há mais de 40 anos, porquanto o terreno (onde está implantada a moradia dos autores e a dos 2.º e 3.º réus) pertencia a um único proprietário, era um terreno único – entre estradas – Travessa da Fonte dos Dominguinhos e Rua Francisco Jesus Salvador, tendo posteriormente (há mais de trinta anos) sido dividido em lotes; que os anexos, propriedade dos réus não têm, nem nunca tiveram, passagem através do logradouro propriedade destes; que os prédios do 2.º e 3.º réus não estão encravados no que diz respeito ao “prédio mãe”, mas os anexos encontram-se encravados pois não têm qualquer acesso à via pública que não seja pelos corredores em causa, situação esta que já dura há mais de 40 anos, mantendo-se os anexos tal como haviam sido construídos, sendo a passagem dos mesmos pública, visível e permanente; que o acesso dos anexos à via pública pelas propriedades dos réus implicaria alterações nas casas estes; que para além da servidão de passagem há sempre que atender à servidão vistas, uma vez que existem duas portas abertas para a servidão de passagem, e que já existem há mais de quarenta anos; e que ao autores litigam de má-fé, devendo ser condenados numa multa e numa indemnização não inferior a € 10.000.

    Concluem, pedindo que a acção seja julgada improcedente por não provada, absolvendo-se os réus do pedido e se condenem os autores como litigantes de má-fé.

    A ré CC contestou, tendo alegado que toda a situação se encontra bem definida e esclarecida desde o início; que é alheia ao presente litígio; que os autores quando adquiriram a fracção tinham conhecimento da passagem de acesso aos prédios dos 2.º e 3.º réus; que não existem factos posteriores à compra que tenham alterado os limites do direito de propriedade dos autores; e que os autores litigam de má-fé, devendo ser condenados em multa e em indemnização de valor não inferior a € 5.000,00.

    Conclui, pedindo que a acção seja julgada improcedente por não provada, absolvendo-se os réus do pedido e se condenem os autores como litigantes de má-fé.

    Os autores replicaram, tendo requerido a intervenção principal provocada de FF.

    Neste articulado alegaram ainda que a servidão de passagem não foi constituída por usucapião e que o que se encontra em causa nos autos não é o modo de aquisição dos RR., mas a desnecessidade objectiva e subjectiva da manutenção da servidão de passagem. Concluem pedindo que seja considerada sanada a ilegitimidade passiva do réu DD e, como consequência dos pedidos formulados na petição inicial, se ordene o encerramento e tapamento das portas dos anexos dos 2.º e 3.º réus, bem como a condenação dos réus e respectiva mandatária forense como litigantes de má-fé, em multa e indemnização a fixar pelo tribunal.

    Por despacho de fls. 200 foi admitida a requerida intervenção principal de FF.

    Citada, silenciou.

    Foi elaborado despacho saneador e organizada a condensação com os factos assentes e a base instrutória.

    Realizado o julgamento, foi proferida sentença, na qual se julgou a acção improcedente, sendo os réus absolvidos dos pedidos, tendo os autores sido condenados como litigantes de má fé, na multa de 4 UC e na indemnização a favor dos réus, a fixar oportunamente.

    Desta decisão foi interposta apelação, tendo, por douto acórdão, de 22 de Fevereiro de 2011, o Tribunal das Relação de Lisboa, julgado parcialmente procedente a apelação “[revogando] a sentença recorrida na parte em que na mesma se condenaram os autores como litigantes de má fé, em multa e em indemnização, absolvendo-os do mesmo pedido”. Interposto recurso de revista, pelos demandantes, não obteve resposta por parte dos recorridos. I.2. – Quadro Conclusivo.

    Para a pretensão que impetram, alinham os recorrentes o epítome conclusivo que a seguir queda extractado.

    “A) - O objecto do presente recurso é o Douto Acórdão, a fIs. ... , dos autos do Venerando Tribunal da Relação “a quo”, que considerou a passagem existente no prédio dos ora recorrentes foi constituída por destinação do pai de família e não a declarou extinta. Ainda absolveu os recorridos dos pedidos de condenação em indemnização e de litigância de má fé. Contudo, salvo o devido respeito por melhor opinião, perante os factos provados, não houve uma correcta e Justa aplicação do Direito.

    1. - Desde logo, verificou-se a incorrecta qualificação da constituição da passagem por destinação do pai de família, pela inaplicabilidade do art. 1549.º do Código Civil, aos factos provados constantes nos pontos 1), 4), 5), 9) a 13) e 28), porquanto, existiu um terreno que pertencia a um único proprietário, que foi divido em 4 lotes pertencentes, cada um, a proprietários diferentes; quando era um único terreno, inexistia a passagem, em causa, e a passagem sequer ficou consignada em documento, aquando da separação dos prédios ou fracções em relação de domínio.

    2. - A própria evolução histórica do desmembramento e divisão da propriedade (dos terrenos), fez carecer de sentido a aplicação dos princípios do “destino de pai de família”, em áreas urbanas ou urbanizáveis.

    3. - Acresce que, a passagem, em causa, não tinha natureza real (art. 1306.º, n.º 1 do Cód. Civil) E) - Desde logo, porque, inicialmente, os segundos e terceiros recorridos acediam à via pública, quer pelos seus próprios terrenos, quer por passagem pelo lote descampado (que haveria de pertencer aos recorrentes). Esta passagem era, assim, utilizada por mero comodismo daqueles. Depois, foi edificada a habitação (que pertence, actualmente, aos ora recorrentes) e os recorridos apenas a pretenderam manter abusivamente, porque sempre serena, objectiva e subjectivamente, desnecessária, inútil e ilegal.

    4. - Mais, o prédio dos ora recorrentes foi adquirido livre de quaisquer ónus ou encargos [conforme Escritura Pública (doc. 3, junto à p.i.)] e nunca constou na respectiva descrição Predial, qualquer averbamento de ónus ou...

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