Acórdão nº 155/10.6TTOAZ.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelFERREIRA DA COSTA
Data da Resolução07 de Novembro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Reg. N. º 794 Proc. N. º 155/10.6TTOAZ.P1 Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B… intentou acção emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, contra C…, S.A.

pedindo que se condene a R. a reconhecer que procedeu a uma diminuição da retribuição do A. e a pagar-lhe as diferenças salariais verificadas desde 2006-01-01, no montante de € 5.925,80, bem como uma indemnização por danos não patrimoniais, a liquidar oportunamente.

Alega, para tanto, o A. que foi admitido ao serviço da R. em 1991-03-01, para trabalhar sob as suas ordens e instruções, mediante retribuição base correspondente ao nível 4 do ACTV do Sector Bancário, acrescida de 60% desse valor, para além de subsídios e diuturnidades. Alega também que desde 2006-01-01 até Novembro de 2008, a R. reduziu o designado “complemento de vencimento” de € 144,37 para € 127,12, bem como reduziu a designada “isenção horária” de € 582,75 para € 269,44, no mês de Dezembro de 2008 e de € 582,75 para € 273,48, a partir de 2009-01-01. Alega, por último, que tal diminuição da retribuição é ilícita e que esta actuação da R. perturbou e indignou o A., deixando-o triste, abatido, deprimido, desmotivado e preocupado, dados os reflexos que tal conduta produz na vida deste.

A R. contestou alegando, em síntese, que a diminuição da retribuição se deveu à retirada da parcela correspondente à isenção do horário de trabalho, que deixou de existir.

Realizado o julgamento com gravação dos depoimentos prestados em audiência e assente a matéria de facto, sem reclamações, como se vê de fls. 456 a 473, foi proferida sentença, tendo o Tribunal a quo julgado a acção parcialmente procedente e, em consequência: 1 - Julgou ilícita a diminuição da retribuição do A. operada desde Dezembro e 2008; 2 - Declarou que, nos termos do contrato de trabalho o A. tem direito a receber, em cada momento, o valor correspondente à retribuição prevista para o seu nível retributivo acrescida de 60 % desse valor.

3 - Condenou a R. a pagar ao A., a título de diferenças salariais devidas desde 01-12-2008 até 31-12 2009, o valor total de € 3.968,9 (1.092,91 x 0,60 + 1.091,91 – 1.484,47) + (1.109,30 x 0,60 + 1.109,30 x 14).

4 - Condenou a R. a pagar ao A. as diferenças salariais incidentes sobre a retribuição mensal, subsídio de férias e subsídio de Natal vencidos desde 01-01-2010 a calcular da seguinte forma: retribuição correspondente ao nível retributivo do A. + 60% - retribuição efectivamente auferida.

5 - Absolveu a R. do demais pedido.

Inconformada com o assim decidido, veio a R. interpor recurso de apelação, pedindo que se revogue a sentença, tendo formulado a final as seguintes conclusões: 1. Foi julgado na douta sentença de que se recorre, que as partes acordaram aquando da celebração do contrato de trabalho, que o R. pagaria ao A. uma remuneração compostas por um valor base, acrescido de 60% do nível remuneratório 4, previsto no Acordo Colectivo de Trabalho Vertical aplicável ao Sector Bancário.

  1. Foi ainda julgado que o R. pagava o valor referido de 60% sobre o nível 4 sob as epigrafes "isenção de horário de trabalho", e outras que foram alterando em nome e quantidade com a execução do contrato.

  2. Julgou a Meritíssima Senhora Juiz do Tribunal a quo, através da matéria que considerou provada, e não provada, que se dão aqui por integralmente reproduzidas, bem como pelas regras da lógica e da hermenêutica, que a vontade real das partes não era que a prestação de trabalho fosse efectivamente realizada em regime de isenção de horário.

  3. Como entendeu também, que a remuneração a pagar sobre a epígrafe "isenção de horário de trabalho", visava apenas preencher os 60% supra mencionado, e não se referiam à prestação de trabalho em regime de isenção de horário.

  4. Por essa razão, aquela retribuição integra o núcleo retributivo do A. que está sujeito ao regime da irredutibilidade, ou irreversibilidade, da retribuição, não lhe podendo, por isso, ser retirada, nos termos em que poderia uma retribuição referente ao pagamento de uma efectiva isenção de horário.

  5. Discordando com o doutamente decidido, e com isso não se conformando, interpõe a R. recurso da douta sentença proferida nos autos, e pugnando por decisão diversa, sustenta que são fundamentais para o apuramento da vontade das partes sobre a isenção de horário de trabalho efectiva (não apenas sobre a remuneração), os depoimentos de D… no seu depoimento prestado em 20.10.2010, e gravado digitalmente desde as 11h:34m:04s até 11h:43m:05s, E…, no seu depoimento prestado em 20.10.2010, e gravado digitalmente desde as 11h:45m:11s até 12h:32m:31s e F… no seu depoimento prestado em 23.10.2010, e gravado digitalmente desde as 14h:45m:19s até 15h:11m:18s, que confirmam a vontade das partes no sentido de o A. prestar trabalho em regime efectivo de isenção de horário.

  6. Assim, e face aos identificados depoimentos, deve ser revista a matéria de facto de modo a que: 8. Aos factos provados da alínea 32., que foi determinante para a formação do juízo que levou à condenação da Recorrente, devem ser dados como não provados, ou alterado para a seguinte redacção: "32º O Banco R. pagou sempre a tal retribuição designada como «isenção de horário» mesmo quando, como aconteceu em vários anos de vigência do contrato, apesar do acordo das partes, e da consequente disponibilidade efectiva do Autor para o efeito, se desconhecer se foi a isenção pedida à Inspecção de Trabalho, e dos períodos em que não foi por esta autorizada.” 9. Por outro lado, também não deveria, salvo melhor entendimento, ter sido considerado provado o vertido na alínea 41 da matéria provada: "41 O A. apenas subscreveu tal declaração por ser sua convicção que o Banco R. só pretendia proceder ao processamento de parte da retribuição base do A. como sendo a título de isenção", uma vez que o A. não fez qualquer prova da sua vontade nessa matéria, que por isso deve ser subtraída à matéria de facto dada como provada.

  7. Deve ainda ser alterado o conteúdo do facto provado n.º 37, de modo a ficar com a seguinte redacção: "O Autor subscreveu conjuntamente com a Ré, acordos para isenção de horário de trabalho em 07.08.2002, 05.04.2004, 04.05.2006, 06.02.2008, nos quais se consignou, com excepção do primeiro, que «(O presente acordo vigora até que uma das partes o denuncie.»", 11. Por último e ainda quanto à matéria de facto a relevar, deveria ter sido considerado como provado o alegado pelo A. no artigo 44° da petição inicial: 12. "O A. não subscreveu os dois últimos acordos referidos no artigo anterior", 13. Que se requer seja considerado provado.

  8. Assim, se alguma dúvida existisse acerca da análise feita à matéria de facto relevada pelo Tribunal de Primeira Instância para a decisão, se conclui que a mesma deveria ter sido diversa, e no sentido final de se admitir extinto o acordo de isenção de horário de trabalho.

  9. Ou seja, e em suma, o R. e o A. acordaram ab initio em reger a sua relação laboral num regime de prestação sem horário de trabalho, 16. Viveram-no como tal.

  10. E acordaram também, designadamente em 2008, consignado em documento escrito, que qualquer das partes poderia denunciar tal acordo, 18. O que o A. fez ao recusar assinar os documentos que lhe foram apresentados em 2009 e 2010 e consubstanciavam a sua continuidade.

  11. Outrossim, foi denunciado pela R. ao retirar ao A. parte daquela remuneração de isenção de horário.

  12. Ainda que se não releve a prova testemunhal, deve ser revogada a douta sentença recorrida, porquanto a matéria de facto provada, relevando o facto 55: "Independentemente de autorização de isenção de horário de trabalho a conceder pelo então denominado IDICT, ou de estarem reunidas as condições legais para o mesmo ser deferido, o Autor sempre deu o seu acordo em prestar o seu trabalho com isenção de horário" obriga a que a interpretação dos factos 32, 41, 44 seja consigo consentânea sob pena de contradição insanável entre os factos provados e vertidos nestas alíneas.

  13. Como ficou ainda demonstrado que a R., no exercício de direito que tem, decorrente quer do contrato de trabalho inicial, e aqui pelo menos quanto à parte da remuneração que ultrapasse 60% do valor que o nível 4 tem em cada momento, quer pelo último contrato de isenção de horário de trabalho celebrado, e aqui até na totalidade, embora não o tivesse feito, o direito de fazer cessar, ou reduzir, a prestação de trabalho em regime de isenção.

  14. O facto de o A. se ter recusado a assinar os documentos que consignavam o acordo de isenção de horário de trabalho para os anos de 2009 e 2010, bem como a R., e nessa sequência, ter deixado de pagar ao A. parte do valor da retribuição por isenção de horário de trabalho, consubstancia em si mesmo uma denúncia mútua daquele acordo, ou mais correctamente uma revogação de formação continuada.

  15. Podiam pois as partes revogarem, como revogaram o acordo de isenção de horário, violando assim a douta sentença recorrida o disposto no artigo 405° do Código Civil.

  16. Acresce que o direito de fazer cessar o regime de isenção de horário, além de previsto nos diversos documentos que consignaram o acordo de isenção de horário, decorre ainda da Convenção Colectiva de Trabalho aplicável ao A., cfr. cláusulas 53ª n.º 6, e 93ª n.º 2, pelo que ainda que se interpretasse a recusa do A. em sentido diverso do mencionado, a R. podia unilateralmente fazer cessar aquele regime nos termos destas disposições, que por isso foram violadas.

  17. Não violou pois a R. o princípio da irredutibilidade da retribuição que protege a remuneração do A. (artigo 129° n.º 1, aI. d) do Código do Trabalho).

  18. Consequentemente, foi lícita a alteração do regime de prestação de trabalho, tendo a douta sentença recorrida violado o disposto quer no contrato de trabalho, quer no último acordo de isenção de horário celebrado, quer no disposto nas cláusulas 53ª n.º 6, e 93ª n.º 2 do Acordo Colectivo de Trabalho aplicável (Acordo Colectivo de Trabalho do C…, S.A., publicado em 29 de Dezembro de 2001, no BTE 1ª Série, n.º...

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