Acórdão nº 0414/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Setembro de 2011

Magistrado ResponsávelFERNANDA XAVIER
Data da Resolução20 de Setembro de 2011
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I- RELATÓRIO O PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE GONDOMAR, bem como o contra-interessado A…, com os sinais dos autos, vieram recorrer da sentença do Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel proferida a fls. 759 e segs., que concedeu provimento ao presente recurso contencioso e declarou nulo o despacho da entidade recorrente que deferiu, ao ora recorrente particular, o licenciamento de uma construção e a emissão do respectivo alvará.

A entidade recorrente terminou as suas alegações, formulando as seguintes CONCLUSÕES: 1. O acto recorrido é o despacho datado de 6 de Setembro de 2002 que deferiu o pedido de licenciamento e não, conforme refere a sentença recorrida, o despacho de aprovação do projecto de arquitectura.

  1. Face à prova produzida e aos elementos do p.a. o tribunal deveria ter dado como não provado que: a construção do prédio recorrido eleva-se em mais de três metros das construções vizinhas, que a sua volumetria é o dobro das construções vizinhas, que toda e qualquer construção vizinha do prédio do Recorrido particular fique por este ensombrado.

  2. O edifício em causa foi construído antes de 18 de Maio de 1995, data da entrada em vigor do Plano Director Municipal, constando do processo administrativo tal facto a fls.273,299 e 369.

  3. O RPDM não é aplicável ao caso atento a sua irrectroactividade e a salvaguarda dos direitos legitimamente adquiridos.

  4. Na sequência do exposto, o artigo 66 do PU refere « A Câmara Municipal poderá proceder à legalização de construções efectuadas ilegalmente, sem licença de construção, comprovadamente edificadas antes da entrada em vigor do Plano Director Municipal e que obedeçam cumulativamente aos requisitos seguintes: satisfaçam a legislação aplicável ao licenciamento municipal de obras particulares; não prejudiquem, de forma grave, quer o interesse público, quer o ordenamento do território municipal, não prejudiquem a capacidade construtiva das parcelas confinantes; cumpram o definido no Regulamento Geral das Edificações Urbanas.» 6. Face ao exposto, nos presentes autos era apenas necessário verificar se a aprovação em causa respeitou as condições previstas nesse artigo.

  5. Ora, a construção foi aprovada com base em dois pareceres técnicos que referem, sem margem para dúvidas, que a construção não prejudica o interesse público, nem o ordenamento do território municipal, porque a volumetria e a tipologia estão de acordo com o nº2 do artº30º e nº. 2 do artº31º do Regulamento do Plano de Urbanização de S. Cosme, não prejudicando a capacidade construtiva das parcelas confinantes, e por outro, pelo facto de a construção respeitar o definido no RGEU.

  6. O artº30º do PU prevê a possibilidade de naquele local construir habitação multifamiliar, desde que esta não afecte negativamente a área envolvente, quer do ponto de vista paisagístico e funcional.

  7. A edificação em causa destina-se a habitação pelo que se enquadra na área envolvente – área predominantemente residencial.

  8. Por outro lado e conforme consta dos autos, a Rua de … não é uma rua plana, tendo uma inclinação, ora a edificação em causa encontra-se no início da Rua, no sentido ascendente, pelo que apesar da edificação do Recorrido particular se elevar das demais construções, tal facto não se evidencia, nem afecta negativamente a área envolvente face a característica própria da Rua.

  9. A edificação em questão encontra-se num gaveto, assim sendo, apesar da sua volumetria exceder a volumetria das construções vizinhas, tal facto não consubstancia uma afectação negativa da área envolvente, em virtude da sua localização específica – gaveto – isto é encontra-se numa zona mais desafogada, pelo que a sua volumetria, apesar de superior não se destaca negativamente.

  10. O tribunal a quo não teve em linha de conta as características específicas na Rua em que se encontra a edificação em causa.

  11. Acresce ainda que tem sido entendido pela jurisprudência, que os conceitos como os referidos no nº2 do artº30º do PU, assentam em critério do domínio da discricionariedade técnica, no qual o controle jurisdicional só é possível em caso de erro manifesto ou grosseiro.

  12. Ora atento aos elementos dos autos, a edificação em causa destina-se a habitação, situa-se num gaveto, no início de uma rua com inclinação.

  13. E aos factos não provados, ou seja, não ficou provado que a rua em questão tem um alinhamento constante, nem que a construção do prédio recorrido se eleva em mais de três metros das construções vizinhas, nem que a volumetria do prédio do recorrido é o dobro das construções vizinhas, nem que toda e qualquer construção vizinha do prédio do Recorrido particular fique por este ensombrado.

  14. Não resulta ter havido erro grosseiro por parte da aqui Recorrente pelo que o Tribunal não poderia ter concluído que o prédio habitacional não permite estabelecer uma correcta relação com a tipologia predominante.

  15. Relativamente ao nº2 do artº29º do PU, o prédio em questão, à data, era servido por uma fossa séptica à semelhança do que acontece com o prédio dos Recorrentes e já se encontrava previsto a rede geral de saneamento.

  16. O tribunal a quo não se pronunciou sobre a questão da aplicabilidade ou não do artigo 66 do PU, pelo que a sentença é nula por força do disposto no artº668º, nº1 d) do CPC.

  17. Por tudo o exposto a sentença recorrida viola o disposto nos artº668º, nº1 CPC, 660º, nº1 CPC e artº66º do PU, tendo feito uma incorrecta interpretação e aplicação do artigo 30º do PU.

    *O recorrente particular formulou, por sua vez, as seguintes CONCLUSÕES: 1ª. Este recurso é interposto da douta sentença proferida a fls. 758 e seguintes, nos termos da qual o tribunal “ a quo” concedeu provimento ao recurso contencioso, e declarou o acto recorrido nulo, consistindo este despacho do Sr. Presidente da Câmara Municipal de Gondomar datado de 6.9.2002 que aprovou o projecto de arquitectura para o prédio do aqui Recorrente Particular e mandou emitir o alvará de licenciamento.

    1. Deve ser ampliada a matéria de facto no sentido de consignar que a edificação do recorrente particular já estava concluída em data anterior a 18.5.1995 com os mesmos elementos de facto que constam dos pontos 3º a 11º da matéria de facto constante da douta decisão recorrida ( cf. fls. 762 e 763).

    2. A douta decisão recorrida incorreu em erro na determinação da norma aplicável, porquanto é inaplicável o disposto nos artº29º e 30º do Regulamento do Plano de Urbanização S. Cosme e Valbom ao caso vertente, face ao facto de o prédio do recorrente particular estar concluído antes da data de 18.05.1995, que é a data da entrada em vigor do PDM Gondomar.

    3. É aplicável à construção do recorrente particular a norma do artº66º do predito Regulamento, tendente à legalização da edificação, encontrando-se presentes todos os pressupostos de facto e de direito previstos no preceito.

    4. Sem prescindir e quanto à aplicação dos artº29º e 30º do predito Regulamento, o certo é que não está provada a afectação da área envolvente nas vertentes paisagística ou funcional.

    5. Não obstante, as conclusões retiradas pelo distinto tribunal recorrido acerca dos conceitos insertos no nº2 do mencionado artigo 30º não exaram que ocorreu erro grosseiro ou manifesto, únicos casos em que a sindicância jurisdicional desses conceitos é admissível, pelo que o entendimento diverso do recorrente público enquadra-se dentro de juízos de mérito admissíveis de acordo com o conceito de discricionariedade técnica.

      *Contra-alegaram os recorrentes contenciosos, ora recorridos, CONCLUINDO assim: 1ª. Não deve a fundamentação de facto da sentença ser alterada no sentido de se incluir como não provado, de forma discriminada e especificada, que: 1- A construção do prédio recorrido eleva-se em mais de três metros das construções vizinhas; 2- Que a volumetria do prédio do recorrido é o dobro das construções vizinhas.

      3- Que toda e qualquer construção vizinha do prédio do recorrido particular fique por este ensombrado.

    6. Contrariamente ao pretendido pela autoridade administrativa recorrida, a douta sentença em crise não viola o disposto nos artº 668º, nº1 e 660º, nº2 do Código de Processo Civil, porquanto conheceu de todas as questões suscitadas pelas partes que lhe competia conhecer.

    7. Dos elementos juntos aos autos a que o recorrido particular e a autoridade administrativa recorrida fazem alusão ( requerimento de fls.273 do PA, registado sob o nº2316 de 7 de Julho de 1993, com uma fotografia anexa pelo recorrente, requerimento de fls.299 do PA, datado de 19 de Abril de 1995, registado sob o nº5517, relatório de fls.369 do PA que descreve, em súmula, um resumo cronológico dos factos relativos ao processo de licenciamento nº 1655/87 ), não é possível concluir que a edificação do recorrente particular já estava concluída em data anterior a 18 de Maio de 1995 ou em data anterior a Maio de 1995, mas apenas e tão só que, não obstante o embargo administrativo decretado pela edilidade sobre a obra de edificação em causa, o recorrido particular continuou a obra e que a mesma, em Maio de 1995, já se encontrava em estado muito avançado, sem contudo se poder precisar qual seja esse estado.

    8. Para além disso, esse concreto ponto da matéria de facto em questão não reveste qualquer interesse para a descoberta da verdade material e a boa decisão da causa segundo as diversas soluções plausíveis de direito.

    9. Pelo que não deverá esse concreto ponto da matéria de facto em questão ser julgado provado.

    10. Contrariamente ao defendido pela autoridade administrativa recorrida, não assiste ao recorrido particular qualquer direito adquirido em relação à obra de edificação em apreço, que mereça a tutela do direito, antes da prática em 6/9/2002, do acto administrativo judicialmente impugnado, isto é, antes da entrada em vigor do RPDM e ou do respectivo PU.

    11. Tendo o recorrido particular pedido, através do requerimento registado sob o nº4547...

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