Acórdão nº 243/10.9T3ETR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Outubro de 2011

Magistrado ResponsávelPAULO GUERRA
Data da Resolução12 de Outubro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

41 I - RELATÓRIO 1.

No Processo Tutelar Educativo n.º 243/10.9T3ETR, no Juízo de Família e Menores de Estarreja, na comarca do Baixo Vouga, por decisão do tribunal singular (cfr. artigo 30º/2 «a contrario sensu» da Lei Tutelar Educativa, aprovada pela Lei n.º 166/99 de 14/9, seguidamente sempre apelidada de LTE) datada de 30 de Março de 2011, em sede de desfecho da fase jurisdicional do processo (artigo 115º da LTE), foram arquivados os autos no que respeita ao menor A...

, por não se ter logrado provar a prática por parte do jovem dos factos que lhe eram imputados (qualificados pela lei penal como um crime de furto qualificado p. e p. pelos artigos 203º/1 e 204º/2 e) do CP e um crime de dano p. e p. pelo artigo 212º do mesmo diploma legal).

  1. O Ministério Público, nos termos dos artigos 121º/1 a), 122º/1 e 123º a) da LTE, recorreu de tal DECISÃO, assim concluindo o seu recurso (em transcrição): 1- Face às declarações e aos depoimentos atrás indicados, indicação essa que aqui se dá por reproduzida, deve ser alterada a decisão sobre a matéria de facto dando-se como provado que, no dia 10 de Abril de 2010, o menor A... acompanhava o B... quando este se dirigiu à residência do ofendido D..., com ele tendo praticado, em co-autoria material, todos os factos constantes da decisão recorrida (art. 685-B e 712, n.º. 1, ambos do Cód. Proc. Civil).

    2- Consequentemente, o menor A... constituiu-se co-autor material de um crime de furto qualificado p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 203, n.º.1 e 204, n.º.2, al. e), em concurso real com um crime de dano p. e p. pelo art. 212, todos do Cód. Penal.

    3- Assim, impõe-se a aplicação ao menor da medida tutelar educativa adequada à sua educação para o direito e à sua inserção de forma digna e responsável na vida em comunidade, propondo-se a medida tutelar de imposição de obrigações de frequência da actividade escolar com sujeição de controle da sua assiduidade e aproveitamento.

    De acordo com o exposto, e sempre com o douto suprimento de Vs Exs, deverá a douta decisão recorrida ser revogada e proferido Acórdão que altere a matéria de facto provada nos termos atrás propugnados e aplique ao menor A... a pertinente medida tutelar educativa, assim se fazendo, como sempre, JUSTIÇA».

  2. O menor respondeu a este recurso, defendendo a justeza do sentenciado, pedindo a final a negação de provimento a este recurso.

  3. Nesta Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto deu o seu PARECER, defendendo a procedência do recurso.

  4. Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal (ex vi artigo 128º da LTE), foram colhidos os vistos, após o que foram os autos à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 126º da LTE.

    II – FUNDAMENTAÇÃO 1.

    Conforme jurisprudência constante e amplamente pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. artigos 119º, n.º 1, 123º, n.º 2, 410º, n.º 2, alíneas a), b) e c) do CPP, ex vi artigo 128º da LTE, Acórdão de fixação de jurisprudência obrigatória do STJ de 19/10/1995, publicado em 28/12/1995 e, entre muitos, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 25.6.1998, in B.M.J. 478, p. 242 e de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271).

    Assim, balizados pelos termos das conclusões Diga-se aqui que são só as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas conclusões da respectiva motivação que o tribunal de recurso tem de apreciar (cfr. Germano Marques da Silva, Volume III, 2ª edição, 2000, fls 335 - «Daí que, se o recorrente não retoma nas conclusões as questões que desenvolveu no corpo da motivação (porque se esqueceu ou porque pretendeu restringir o objecto do recurso), o Tribunal Superior só conhecerá das que constam das conclusões») – Cfr. ainda Acórdão da Relação de Évora de 7/4/2005 in www.dgsi.pt.

    formuladas em sede de recurso, as questões a resolver consistem em · 1º- saber se há que modificar a matéria de facto apurada, por ocorrência de erro de julgamento; · 2º- saber se, face a tal modificação, há prova bastante da prática pelo menor A... dos factos narrados no requerimento da abertura da fase jurisdicional; · 3ª- saber qual a medida tutelar educativa a aplicar ao menor, caso se entenda responder afirmativamente à 2ª questão.

  5. DA DECISÃO RECORRIDA 2.1. Na DECISÃO recorrida, é este o rol de FACTOS PROVADOS (em transcrição): «1. No dia 12/04/2010, B..., acompanhado outros dois indivíduos cuja autoria não foi possível apurar, dirigiram-se à residência do ofendido D..., sita na Rua …na freguesia de …, nesta cidade, área deste Município, tendo-se todos introduzido na mesma através da janela da sala que, para o efeito partiram.

    Uma vez no interior da habitação do ofendido, percorreram a casa toda, procurando bens e valores de que pretendiam apropriar-se, e dali retiraram e colocaram num saco, nos anexos da casa: - 1 base de lâmpada em alumínio - 1 suporte de uma lâmpada em latão - cinco adaptações de mangueira em latão, - Dez torneiras em bronze - Dois redutores de botija de gás, - Dois tubos de aço inox - Doze joelhos galvanizados - 7 Uniões galvanizadas - Dois misturadores de casa de banho - quatro puxadores de janela em ferro.

    - Oito niples roscados de ferro fundido, - Um pedaço de chumbo derretido - Sete tubos de lâmpadas em latão - Trinta peças diversas em latão.

    Os bens supra referidos têm um valor concreto não apurado.

    Pretendiam apropriar-se, fazendo-os seus, os bens supra referidos, contra a vontade do seu legítimo proprietário, para o que os transportaram para os anexos da referida habitação, apenas não tendo conseguido os seus intentos devido à intervenção da GNR, que chegou ao local antes de os três indivíduos terem retirados os bens da propriedade do ofendido.

    Para se introduzirem nos supra referidos anexos, onde penetraram sem para tal estarem autorizados, estroncaram, partindo-a e inutilizando-a, a porta exterior que dava acesso aos mesmos.

    A reparação global dos estragos provocados na janela e na porta orça em € 700,00.

    Os bens foram recuperados e entregues ao seu proprietário.

    Agiram voluntária, livre e conscientemente com o propósito de se apoderarem dos referidos objectos, que só não integraram no seu património e fizeram seus devido à pronta intervenção da GNR, e ainda com o propósito de danificarem a janela e a porta. Não desconheciam que actuavam contra a vontade e sem autorização do seu legítimo proprietário e que a sua conduta era proibida e punida pela lei penal.

  6. Sempre actuando de acordo com o plano que previamente tinham traçado, cortaram ainda os cabos (3 extensões de electricidade, com 10 metros cada), da bomba de água propriedade do lesado, a qual se encontrava na residência supra referida.

    Cada um dos cabos tinha um valor de pelo menos €30,00.

    Nos referidos anexos procederam à queima dos 3 cabos eléctricos supra referidos, a fim de, por essa forma, se apropriarem do cobre de que são feitos.

    Agiram voluntária, livre e conscientemente, com o propósito de se apoderarem do referido cobre, que só não integraram no seu património e fizeram seus devido à pronta intervenção da GNR. Não desconheciam que actuavam contra a vontade e sem autorização do seu legítimo proprietário e que a sua conduta era proibida e punida pela lei penal.

  7. Ainda dentro da propriedade do ofendido, abeiraram-se da viatura de matrícula …, propriedade do ofendido, que ali estava estacionada, e estroncaram, partindo-o e inutilizando-o, o canhão de ignição da mesma, sabendo que provocariam, como provocaram, estragos na referida viatura, cuja reparação orçou em € 483,11.

    Agiram voluntária, livre e conscientemente, bem sabendo que estavam a danificar o veículo automóvel, que actuavam contra a vontade e sem autorização do seu legítimo proprietário e que a sua conduta era proibida e punida pela lei penal.

    Provou-se ainda que: 4. A... é o segundo de três filhos de E..., tendo a paternidade sido registada em 04.10.2010.

    O jovem vive com a irmã (F..., menor de idade, que frequenta o ensino primário), a mãe (solteira, 4° ano, doméstica) e o pai G... (casado, 4° ano, pedreiro da construção civil).

    A... vive actualmente com os progenitores, em XX..., em casa arrendada, sendo humildes as condições vivenciais partilhadas. O meio de inserção é de características mistas (rural e residencial), não referenciando o jovem especial apreço pelo nível de vida familiar, que reconhece difícil por escassez de recursos.

    Esta dificuldade suscita conflitos materno-filiais, por solicitações do jovem para aquisição de bens ou artigos a que a mãe não possa corresponder.

    A condição económica do agregado é desfavorecida, sendo o sustento familiar assegurado com recurso ao vencimento do companheiro da mãe do jovem e que rondará os 400,00€. Acresce o montante referente ao abono de família, tendo sido cessado o benefício de Rendimento Social de Inserção por alegado incumprimento de acordo de inserção, designadamente a obrigação de frequência escolar do jovem.

    Apesar das limitações de ordem económica, parecem asseguradas as necessidades elementares.

    A... iniciou a sua escolarização em idade dita normal, sendo um aluno com historial de retenções (no 1º ciclo e no 2º ciclo do ensino básico), registando duas retenções no 6° ano. No ano lectivo transacto, por sua iniciativa, abandonou a escola regular, intentando a frequência de um curso de formação em Aveiro, sucedendo não ter conseguido efectuar qualquer progressão nos estudos nesse ano lectivo.

    A nível comunitário, a família é referenciada pelos recursos modestos e escassa concertação de esforços educacionais, sendo o jovem percepcionado como um adolescente com uma autonomia precoce, com saliente absentismo escolar (sendo instaurado processo nº. 646/08na CPCJ de Estarreja) e exploração de contextos e pares convivenciais alheios à família, aspectos que não têm sido atalhados pelo casal E... e G....

    No decurso do ano lectivo passado, o jovem abandonou a frequência escolar...

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