Acórdão nº 106/11.0TBMGR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Setembro de 2011

Magistrado ResponsávelJUDITE PIRES
Data da Resolução27 de Setembro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam os Juízes da 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra I.RELATÓRIO “R (…) SA”, pessoa colectiva nº 5......63, com sede na Avenida ....., 1099-091 Lisboa intentou providência cautelar não especificada, nos termos do artigo 381º CPC, contra “5(…), SA”, pessoa colectiva nº 5......3, com sede na Avenida ...., 1050-195 Lisboa, pedindo que seja a requerida intimada a restituir, imediatamente, à requerente, o estabelecimento situado na Marinha Grande, na Estrada Nacional nº 242, ao km 13.7, Rotunda da Zona Desportiva, composto por duas ilhas com bombas de abastecimento, uma loja de apoio e um local de lavagem de veículos.

Para fundamentar a sua pretensão, alega, em síntese, que: - no exercício da sua actividade, em 08.04.1998, celebrou com a requerida o denominado contrato de cessão de exploração, relativo ao estabelecimento comercial destinado a Posto de Abastecimento de viaturas, cuja restituição pretende; - tal contrato foi sucessivamente renovado e alteradas as respectivas condições comerciais, nos termos dos escritos que junta; - a requerida incumpriu, além do mais, com os prazos de pagamento dos combustíveis fornecidos pela requerente, acumulando dívidas; - nos termos ajustados, a requerente tinha o direito de resolver o contrato firmado, o que fez por carta datada de 05 de Fevereiro de 2010, e a requerida a obrigação de restituir o estabelecimento em causa, o que se recusou a fazer, alegando não concordar com tal resolução; - a requerida mantém o estabelecimento encerrado, o que provoca danos ambientais, coloca em causa a imagem e marca da requerente, e acarreta prejuízos pela falta de venda de combustíveis.

Citada a requerida, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 385º, nº2, do Código de Processo Civil, veio a mesma deduzir oposição nos termos constantes de fls. 348-374, pugnando pela improcedência da providência cautelar, alegando, em síntese, que: - em Novembro de 2009, a requerente, de forma totalmente inesperada, suspendeu o fornecimento de combustíveis à requerida; - fê-lo numa altura em que o saldo devedor da sua conta-corrente apresentava valores inferiores aos dos anos precedentes; - desfeito o equívoco, voltou a suspender tais fornecimentos em Dezembro de 2009, numa altura em que o saldo devedor da requerida era inferior ao valor da garantia bancária por ela prestada no âmbito do acordo celebrado com a requerente; - durante a vigência do contrato, a prática corrente entre as partes era de a requerida proceder ao pagamento das facturas emitidas pela requerente, que integravam a conta-corrente, acima de 30 dias após o seu vencimento; - tal período foi sucessivamente diminuindo, sendo que no início de 2009 a requerente exigiu que tal prazo passasse a ser de 15 dias; - a requerida, perante tais pressões, fez sempre um esforço para cumprir as exigências da requerente, ao nível dos pagamentos; - aquando do corte de fornecimento, a requerida não tinha por pagar facturas vencidas há mais de 15 dias; - por força de tal atitude, a requerida viu-se impedida de prosseguir a sua actividade, e de realizar dinheiro, sendo a exploração do posto de abastecimento a sua principal fonte de receitas; - não tem, por isso, razão a requerente para a resolução operada, dado que a requerida cumpriu o contrato e só atrasou os pagamentos quando a requerente lhe retirou a possibilidade de, no exercício da sua actividade, gerar as receitas necessárias para efectuar tais pagamentos; - acresce que, mesmo após tal resolução, a requerente continua a cobrar à requerida a taxa de exploração da loja do posto de abastecimento cuja restituição pretende; - a requerente agiu, assim, com deslealdade, pois sem qualquer justificação ou pré-aviso alterou unilateralmente a praxis contratual estabelecida com a requerida durante vários anos.

Produzida a prova, foi proferida decisão que, julgando procedente a providência cautelar, ordenou à requerida que procedesse à “restituição imediata à requerente (…), do estabelecimento situado na Marinha Grande, na Estrada Nacional nº 242, ao km 13.7, Rotunda da Zona Desportiva, composto por duas ilhas com bombas de abastecimento, uma loja de apoio e um local de lavagem de veículos, que indevidamente mantém na sua posse”.

  1. Inconformada com tal decisão, dela interpôs a requerida recurso de apelação para esta Relação, formulando com as suas alegações as seguintes conclusões: “1. Para o deferimento da providência requerida, era necessário que a Requerente alegasse, e provasse, que os prejuízos que alega resultam do comportamento da Requerida.

  2. A Requerente não alega que a Requerida, de alguma forma, tenha tido um comportamento que a impedisse de intervir nos equipamentos e nos depósitos de combustível que permitissem a não ocorrência dos danos que alega ter sofrido.

  3. Igualmente na sentença a Senhora Juiz, ao considerar terem existido tais danos – de degradação de equipamentos e de imagem – não estabelece qualquer comportamento da Requerida que seja a razão directa dos mesmos.

  4. Da prova produzida e antes indicada, resulta claro que nunca a Requerente pretendeu tomar qualquer iniciativa para proteger os seus bens, nem a Requerida, por qualquer forma e em qualquer momento, se opôs a que a Requerente tomasse tal iniciativa.

  5. Igualmente não é alegado, nem ficou provado, o valor dos danos que a Requerente diz ter sofrido, pelo que não podem os mesmos serem considerados como fundamentos do deferimento do procedimento cautelar.

  6. Não se verificam, assim, os fundamentos de facto e de direito necessários à decisão, pelo que a mesma é nula, tendo sido violadas as alíneas b) e c) do artigo 668.º do Código de Processo Civil.

  7. Caso assim não se entenda, acresce ainda que a Senhora Juiz a quo errou na apreciação e na valoração da prova.

  8. Deu como provados documentos da autoria da Requerente, juntos com o requerimento inicial para prova dos valores devidos pela Requerida em Novembro e Dezembro de 2009, sem que a eles alguma testemunha fosse perguntada.

  9. Não deu como provados os documentos juntos pela Requerida para prova dos valores em dívida à Requerente nos meses de Novembro e Dezembro de 2009, os quais são da autoria da Requerente e que, para além de terem visto o seu teor confirmado por prova testemunhal, fazem prova plena dos factos que forem contrários ao interesse da Requerente.

  10. A ter considerado provados tais documentos, a Senhora Juiz a quo daria uma resposta diferente aos n.ºs 42, 43, 44 e 45 da resposta aos factos provados, a qual indicaria que às datas das suspensões de fornecimento, em Novembro de 2009 e em Dezembro de 2009, não havia facturas vencidas há mais de 15 dias e, daria como provada a matéria alegada pela Requerida, em sede de oposição, sob os artºs nºs 28 a 45, 51 e 52, 126 e 127 e 129 e 130.

  11. Esta resposta também sempre teria de ser dada atendendo apenas aos depoimentos que sobre tal matéria foram prestados, atendendo à contradição existente nos depoimentos das duas primeiras testemunhas da Requerente, ao depoimento da testemunha da Requerente (…) que confirmou explicitamente que a interrupção no fornecimento do combustível se ficou a dever a uma alteração na política de risco da Requerente e, aos depoimentos das duas testemunhas da Requerida que, de forma clara e inequívoca, confirmaram não haver, à data das suspensões de fornecimento, facturas por pagar vencidas há mais de 15 dias.

  12. Assim sendo, e porque no processo constam todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto agora em causa, e porque estes impõem uma resposta diferente, deve a Relação alterar, em conformidade, a resposta indicada matéria.

    São termos em que deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência: a) Ser a sentença recorrida declarada nula por oposição entre os fundamentos e a decisão; b) Ainda que assim não se entenda, ser reapreciada a prova produzida nos autos e supra especificada, se necessário com renovação dos depoimentos das testemunhas, e, em consequência, ser modificada a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal a quo, revogando-se a sentença recorrida; d) Ainda que assim não se entenda, a aplicação do direito aos factos indiciariamente assentes deverá ser alterada nos termos expostos, revogando-se a sentença recorrida e substituindo-se por decisão que indefira a providência cautelar inicialmente decretada.

    Só assim, efectivamente, será possível que, como se impõe e a ora Apelante espera, em concreto se cumpra a lei, produzindo-se DIREITO e fazendo-se triunfar a verdadeira JUSTIÇA!” A recorrida contra-alegou, pugnando pela confirmação da decisão recorrida.

    Colhidos os vistos, cumpre apreciar.

    II.OBJECTO DO RECURSO 1. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelo recorrente e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras[1], importando destacar, todavia, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito[2].

  13. Considerando, deste modo, a delimitação que decorre das conclusões formuladas pelo recorrente, no caso dos autos cumprirá apreciar fundamentalmente as seguintes questões: - nulidade da sentença; - erro na apreciação da matéria de facto; - mérito do julgado.

    III. FUNDAMENTO DE FACTO São os seguintes os factos considerados provados pela primeira instância e relevantes para a apreciação do objecto do presente recurso: Do requerimento inicial: 1. Por escritura de 28.12.2005, outorgada no Cartório Notarial de Lisboa a cargo da Notária Wanda Maria Coutinho Morais Silva, e exarada de fls. 104 a 107 verso do Livro 9 desse Cartório, a “R (…), SA” incorporou, por fusão, mediante a transferência global do património das sociedades incorporadas, com todos os direitos e obrigações que lhes pertenciam, entre outras...

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