Acórdão nº 125/03.0TBSRQ.L1.S1. de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Outubro de 2011

Magistrado ResponsávelSILVA GONÇALVES
Data da Resolução06 de Outubro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA e mulher BB intentaram a presente acção declarativa de condenação contra CC e mulher DD alegando, em síntese: - são proprietários de um prédio que identificam, que confronta, nomeadamente, a Norte, com as barrocas do mar; - fazendo parte integrante do referido prédio, existe uma faixa de terreno delimitado, a Norte, pelas barrocas do mar, a Sul com duas paredes de pedra paralelas à linha de costa, a Leste com um prédio dos réus e a Oeste com o limite da serventia para veículos que termina no prédio dos autores; - desde 1981 e até ao presente, os AA. usufruem do prédio em causa, em nome próprio e em toda a sua extensão, sem excepção da referida faixa, prédio que adquiriram por usucapião; - os réus, desde que adquiriram o prédio contíguo ao dos autores, por comodidade de acesso a tal prédio, passaram a utilizar a faixa de terreno acima referida, com a tolerância dos autores; - porém, a partir de dada altura, passaram os réus a comportar-se como sendo donos de tal faixa de terreno, nela levando a cabo, para além de outros actos, a construção de muros e portões, sempre com a oposição dos autores.

Concluem pedindo, para além do mais, que sejam reconhecidos como proprietários do prédio identificado, no qual se inclui a faixa de terreno referida e que os réus sejam condenados a restituir tal faixa de terreno e a absterem-se da prática de qualquer acto que impeça ou diminua a utilização de tal parcela de terreno pelos autores.

Regularmente citados vieram os réus apresentar a sua contestação, alegando factos tendentes a demonstrar a não verificação da invocada aquisição por usucapião alegada pelos autores e concluindo pela improcedência da acção.

Os autores apresentaram articulado de resposta.

Foi proferido despacho saneador e organizadas a especificação e a base instrutória.

Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento e, após ter sido proferida sentença, dela foi interposto recurso de apelação, tendo sido proferido acórdão por esta Relação nos seguintes termos: - dando resposta restritiva ao ponto 55 e considerando não escrita a resposta dada ao ponto 57, - anulando o julgamento da matéria dos pontos 1, 2 3, 20 e 30 da base instrutória, determinando que se procedesse à produção de prova sobre a referida matéria, - anulando o julgamento da matéria dos quesitos 44, 45 e 46, que deverão ser reformulados de acordo com o aí exposto e produzida prova sobre os mesmos, sem prejuízo do tribunal ampliar o julgamento a outros pontos da matéria de facto, com o fim exclusivo de evitar contradição da decisão, revogando-se a sentença proferida.

Tendo-se procedido a nova audiência de julgamento, foi dada nova resposta aos pontos 1º a 3º, 29º, 30º e 44º a 46º da base instrutória.

Foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, decidiu: - absolver os réus do pedido de pagamento dos lucros cessantes resultantes do arranque de uma planta de vinha; - declarar os autores proprietários do prédio rústico sito à......., composto por terreno de vinha com casa de adega, com a área de 24,20 ares, descrito na conservatória do registo predial de S. Roque do Pico com o nº 0000 , da freguesia da Prainha , nele se incluindo a faixa de terreno sita a norte que se estende desde a serventia para veículos que termina no limite oeste do dito prédio até um afloramento rochoso mais elevado a leste, denominado “o mirante” ; - condenar os réus a restituírem aos autores a faixa de terreno acima identificada; - condenar os réus a absterem-se da prática de qualquer acto que impeça ou diminua a utilização pelos autores da referida faixa de terreno; - condenar os réus a reconstruírem integralmente o segmento de parede que delimita os prédios a leste , até à altura do afloramento rochoso ali existente; - condenar os réus a reconstruírem o muro que delimita o prédio dos autores a oeste, com 1,30 metros de altura e 0,60 metros de espessura; - condenar os réus a reconstruírem a mesa em betão , com coluna de 85 cm de altura e respectiva base de betão; - condenar os réus a retirarem da faixa acima referida todos os materiais de construção utilizados, bem como a demolirem a edificação com base em betão e paredes de alvenaria que ali edificaram; - condenar os réus a pagar aos autores a quantia que se apurar em liquidação de sentença, respeitante ao valor da planta de vinha.

Inconformados, os réus recorreram para a Relação de Lisboa que, por Acórdão de 01.03.2011 (cfr. fls.507 a 534), julgou improcedente o recurso e, em consequência, confirmou a sentença recorrida.

Novamente inconformados, recorreram para este Supremo Tribunal, os réus CC e mulher DD, apresentando as seguintes conclusões:

  1. Um dos pontos fundamentais que se encontra em discussão é a existência ou não de autonomia entre as duas realidades prediais em causa, o prédio do facto provado em 1. e a faixa de terreno do facto provado em 3.

  2. Na alteração da resposta ao ponto 7.

    da base instrutória decide-se essa questão no sentido de que a faixa faz parte do prédio, ao dar-se por provado que pelos autores ou em seu nome foram praticados determinados actos na vinha plantada no prédio referido em um, em toda a sua extensão, sem excepção da faixa de terreno id. na al. C)".

  3. Ficou assim a existir na prova dada por feita uma resposta que é conclusiva na medida em que corresponde a uma conclusão e não a factos, tendo sido cometido consequentemente erro na apreciação da prova dada por feita e devendo ser dada por não escrita (n.° 4 do art. 646.° do CPC).

  4. Da nova resposta resulta também que ficaram a ser consideradas como provadas duas situações que permitem conclusões contraditórias entre si, a autonomia da faixa e a sua inclusão no prédio.

  5. Tendo-se verificado em consequência que a mesma não deve ser tida por provada, dada a violação do n.° 4 do art. 712.° do CPC.

  6. Da restante matéria de facto dada por provada retira-se que a faixa deve ser considerada como um espaço autónomo relativamente ao prédio (factos n.°s 3, 4, 5, 6, 12, 37, 38, 39, 42, 43, 48, 63 e 67).

  7. A plantação do pé de vinha nesse espaço ocorreu desde que o anterior proprietário do prédio dos réus o comprou em 1992 e até à respectiva venda aos réus que fez em 21-10-2001, dado que essa plantação foi aceite por ele enquanto gozou o mesmo naquele período (factos 56, 57, 13, 68 e 59).

  8. O que não permite a concretização do prazo necessário para a respectiva aquisição usucapião, violando-se assim o art. 1296.° do CC.

  9. O acesso ao prédio dos réus só se pode processar pelo lado leste, ou seja, pela faixa. j) Os autores não se opuseram à actuação dos anteriores proprietários do prédio dos réus e destes relativamente à faixa (delimitação da mesma com a construção de duas paredes e de um portão numa), ao respectivo uso para acesso por aqueles e após a compra pelos réus pelo menos no período inicial.

  10. A compra desse imóvel pelos réus foi feita quando o acesso dos vendedores se processava por aquela forma, tendo continuado a usar a faixa com essa finalidade e na convicção de que fazia parte do seu prédio.

  11. Assim, e a entender-se que a faixa pertence aos autores, verificar-se-á um abuso do respectivo direito com a consequência de dever ser mantido o gozo existente dado a posição dos autores exceder manifestamente os limites impostos pela boa fé.

    Terminam pedindo que seja concedido provimento ao presente recurso revogando-se correspondentemente o acórdão e absolvendo-se os réus.

    Contra-alegou a recorrida BB pedindo a manutenção do julgado.

    Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

    As instâncias consideraram provados os factos seguintes: 1.

    Em......., freguesia de Prainha, existe um prédio rústico composto por terra de vinha com casa que foi de adega, com 24,20 ares, que confronta a sul com caminho, leste com EE e a oeste com FF, inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo 5.186° e descrito na Conservatória do Registo Predial de S. Roque do Pico sob o n° 0000, de freguesia da Prainha (al. A) da matéria assente).

    1. O prédio descrito em 1 encontra-se inscrito na Conservatória do Registo Predial de S. Roque do Pico a favor dos autores, encontrando-se a...

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