Acórdão nº 3074/06.7TTLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Outubro de 2011

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução12 de Outubro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 21 de Agosto de 2006, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, 3.º Juízo, 2.ª Secção, a COMISSÃO AA instaurou acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato de trabalho contra o INSTITUTO BB., pedindo: a) a condenação do réu «a respeitar o direito aos seguros de vida e de acidentes pessoais previstos no artigo 46.º do Regulamento Interno e concretizados através das Ordens de Serviço n.º 08/ADM/90, de 10/4/90, e n.º 09/ADM/90, da mesma data, como direito legitimamente adquirido, constituindo parte integrante da retribuição, incorporado no contrato individual de trabalho dos trabalhadores, unilateralmente irrevogável por aquela»; b) que a decisão unilateral do réu, de 18/5/2006, de proceder à cessação dos aludidos contratos de seguro de vida e de acidentes pessoais seja declarada nula, por contrária à lei (artigo 280.º, n.º 1, do Código Civil); c) se determine «a adequada constituição de mandatário legal, sendo caso disso, para representação do réu, com as legais cominações»; d) a condenação do réu «em coima por ter omitido o pedido de parecer prévio, sob a forma escrita, à Comissão de Trabalhadores, relativamente à decisão de fazer cessar os contratos de seguro de vida e de acidentes pessoais, para o que deverá ser emitida a competente certidão e remetida à Inspecção de Trabalho».

Alegou que o BB, apesar de se tratar de um instituto público, contrata, em regra, os respectivos trabalhadores no regime de contrato individual de trabalho e que, no âmbito das suas relações laborais, vigora, desde 3 de Julho de 1989, um Regulamento Interno que se completa, segundo previsão expressa, por ordens de serviço, emanadas do Conselho de Administração, sendo que o réu concedeu aos seus trabalhadores os seguintes seguros: um seguro de vida, através da Ordem de Serviço n.º 08/ADM/90, de 10/4/90; um seguro de acidentes pessoais, através da Ordem de Serviço n.º 09/ADM/90, da mesma data.

A periodicidade destes seguros é anual, iniciando-se ambos os seguros em 1 de Janeiro de cada ano, até 31 de Dezembro, sendo renováveis.

Sucede que o órgão de gestão do BB determinou, unilateralmente, em 18 de Maio de 2006, a cessação dos aludidos seguros, o que não lhe era permitido, após a adesão tácita dos trabalhadores ao Regulamento Interno. Além disso, aqueles seguros faziam parte integrante da retribuição dos trabalhadores do réu, constituindo um modo relevante de protecção da sua saúde, direito constitucionalmente previsto, logo a decisão tomada pelo órgão de gestão do réu é susceptível de lesar gravemente os direitos de retribuição e de protecção da saúde dos trabalhadores, situação que se mostra legal e constitucionalmente vedada.

O réu contestou, alegando que os seguros de vida e de acidentes pessoais concedidos aos trabalhadores resultaram de actos unilaterais por si produzidos, no uso de poderes de direcção inerentes à sua posição contratual de empregadora, não sendo expressão de uma vontade contratual, pelo que não integram necessariamente os contratos individuais de trabalho celebrados com os seus trabalhadores, por isso, tal como foram instituídos de forma unilateral, mostra-se lícita a sua revogação unilateral, não sendo de aplicar o disposto no artigo 230.º, n.º 1 do Código Civil.

Mais alegou que aqueles seguros não integram o conceito de retribuição em sentido estrito, tal como a mesma é definida por força do Regulamento do Pessoal do BB. Deste modo, as decisões de não renovação dos contratos de seguro de vida e de acidentes pessoais dos trabalhadores do BB são legalmente fundamentadas, sendo admissível a revogação unilateral desses contratos de seguro, deliberada pelo Conselho Directivo do BB, não estando a mesma subordinada à solicitação de parecer prévio da Comissão de Trabalhadores.

Entretanto, foi admitida a intervenção das requerentes CC e DD na qualidade de assistentes.

Seguidamente, foi proferido despacho saneador, com valor de sentença, que, julgando procedente a acção: (i) condenou o réu «a respeitar o direito aos seguros de vida e de acidentes pessoais previstos no art. 46.º do Regulamento Interno e concretizados através das ordens de serviço n.º 08/ADM/90, de 10/4/90, e n.º 09/ADM/90, da mesma data, como direito legitimamente adquirido, constituindo parte integrante da retribuição, incorporado no contrato individual de trabalho dos trabalhadores, unilateralmente irrevogável por aquela»; (ii) declarou nula a decisão unilateral do réu, de 18/5/2006, «de proceder à cessação dos aludidos contratos de seguro de vida e de acidentes pessoais, por contrária à lei (cfr. art. 280.º, n.º 1, do CC)»; (iii) considerou supervenientemente inútil o pedido formulado sob a alínea c) do petitório e (iv) ordenou a extracção de certidão da petição inicial, da contestação e da decisão e a sua remessa à Autoridade para as Condições do Trabalho, para os fins que tidos por convenientes, face à pretensão da Comissão de Trabalhadores.

  1. Inconformado, o réu interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, que negou provimento à apelação, mantendo a sentença recorrida.

    É contra esta decisão do Tribunal da Relação que o réu se insurge, mediante recurso de revista, ao abrigo das conclusões seguintes, explicitadas na sequência de convite que lhe foi dirigido, com vista a completar as sobreditas conclusões com as especificações previstas no n.º 2 do artigo 690.º do Código de Processo Civil: «A. O recurso ora interposto pela Recorrente versa sobre o douto acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, a fls. … e ss., o qual determinou que os seguros de vida e acidentes pessoais que a aqui Recorrente instituiu para os respectivos trabalhadores constituem retribuição em espécie, razão pela qual a ora Recorrente terá violado o princípio da irredutibilidade da retribuição.

    B. Com relevância para o objecto do presente recurso, destaca-se, em primeiro lugar, a qualificação jurídica dos seguros de vida e de acidente pessoais das Ordens de Serviços emanadas pelo Conselho de Administração da Recorrente e a eventual violação ou não do princípio da irredutibilidade salarial.

    C. Na verdade, o acórdão em questão violou os seguintes preceitos: art. 82.º do Decreto-‑Lei n.º 49.408, de 24 de Novembro de 1969, e o art. 249.º do Código do Trabalho (aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto); ao que acresce que foram violados os arts. 3.º e 6.º do Decreto-Lei n.º 14/2003, de 30 de Janeiro.

    D. Ora, antecipando desde já as considerações posteriores, podemos afirmar que o acórdão recorrido merece total censura, na medida em que não fez uma correcta aplicação do direito, pelo que deverá ser integralmente substituído.

    E. Desde já, cumpre referir que, junto da Recorrente, as relações laborais, na generalidade, regem-se pelas normas aplicáveis ao contrato individual de trabalho e, na especialidade, pelo disposto no Regulamento Interno, aprovado pelo Ministério da Indústria e da Energia.

    F. Nesta medida, através das Ordens de Serviço n.º 08/ADM/90 e 09/ADM/90, o Conselho de Administração da Recorrente concedeu aos respectivos trabalhadores um seguro de vida e um seguro de acidentes pessoais, ambos com uma validade anual.

    G...

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