Acórdão nº 528/08.4TTSTR.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Setembro de 2011

Magistrado ResponsávelGONÇALVES ROCHA
Data da Resolução22 de Setembro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1---- AA, intentou uma acção com processo comum, emergente de contrato de trabalho, contra Estado Português (Direcção Regional de Agricultura e Pescas de Lisboa e Vale do Tejo), pedindo: que seja declarado ilícito o seu despedimento, com fundamento em extinção do posto de trabalho; que o Réu seja condenado a pagar-lhe todas as diferenças salariais desde 16.7.1997 até 29.09.2007, e que computou em € 36.513,08; que o Réu seja condenado a pagar-lhe uma indemnização de antiguidade de 45 dias por cada ano completo ou fracção, no valor de € 6.854,27; que o Réu seja condenado a pagar-lhe a quantia de € 650,23, referente a prestações pecuniárias já vencidas, bem como as vincendas até à data do trânsito em julgado da sentença; que o Réu seja condenado a pagar-lhe os juros de mora já vencidos até à data da propositura da acção, no montante de € 9.833,70; que o Réu seja condenado a pagar-lhe os juros de mora que se venham a vencer, desde a data da propositura da acção e até efectivo e integral pagamento das quantias em dívida e peticionadas, à taxa legal aplicável.

Alegou para tanto e em síntese, que foi contratada pelo R em 16/7/97, para lhe prestar serviço de auxiliar de limpeza em regime de substituição de uma funcionária que estava em gozo de férias, tendo, no entanto, trabalhado para o R onze anos, desempenhando as funções de administrativa, distintas portanto das funções para que fora contratada, tendo por isso direito às diferenças salariais resultantes do que lhe foi pago e do que deveria ter auferido; além disso, foi despedida pelo R na sequência dum processo de extinção do posto de trabalho que está eivado de nulidades, o que determina a ilicitude do seu despedimento.

O R veio contestar, excepcionando a nulidade do contrato, por violação das regras de constituição da relação jurídica de emprego público; e impugnando a matéria fáctica alegada pela A concluiu pela improcedência da acção; por último e em reconvenção, pediu a condenação da A no pagamento da quantia que recebeu a título de compensação pela cessação do contrato, dada a nulidade deste.

A A veio responder à matéria da contestação, mantendo os pedidos que deduzira na petição inicial.

Foi proferido despacho saneador que julgou inadmissível a reconvenção.

E efectuada audiência de julgamento, foi proferida sentença, que, julgando a acção procedente, decidiu: a) condenar o Réu a pagar à A, a título de diferenças salariais, a quantia global de € 36.609,35, acrescida dos juros de mora vencidos desde a data do vencimento de cada uma das prestações remuneratórias, à taxa legal supletiva emergente do artigo 559°, n.° 2, do Código Civil, e das Portarias n.°s 1171/95, de 25.9, 263/99, de 12.4, e 291/2003, de 8.4, ou seja, à taxa anual de 10% entre 31.8.1997 e 16.4.1999, de 7% entre 17.4.1999 e 12.4.2003, e de 4% desde 13.4.2003, bem como de juros vincendos, à taxa legal supletiva, até integral pagamento; b) declarar ilícito o despedimento perpetrado pelo R. na pessoa da A.; c) declarar nulo o contrato de trabalho existente entre A. e R; d) condenar o R. a pagar à A. a quantia de € 8.506,73, a título de indemnização por despedimento ilícito, acrescida de juros de mora vincendos, à taxa legal supletiva, desde a data da sentença e até integral pagamento; e) condenar o R. a pagar à A. uma compensação concernente às retribuições vencidas desde 24.8.2008 até à data da sentença, a liquidar em complemento da mesma, se necessário operadas as deduções a que aludem os n°s 2 e 3 do art° 437° do Código do Trabalho de 2003 (C.T.), ou seja, o montante dos rendimentos que não perceberia caso o despedimento não tivesse ocorrido, designadamente, o montante de € 3.874,52, recebido a título de compensação pela cessação do contrato, assim como o montante do subsídio de desemprego que, eventualmente, a A. tivesse recebido.

Inconformado apelou o R, tendo a Relação julgado a apelação parcialmente procedente, mas apenas na parte respeitante ao montante atribuído à A. a título de indemnização por despedimento ilícito, que foi rectificado para o valor de € 7.741,88.

Novamente irresignado, traz-nos o R a presente revista, tendo rematado a sua alegação com as seguintes conclusões: 1ª - Quando em 16 de Julho de 1997 a A é contratada pela então Direcção Regional de Agricultura do Ribatejo e Oeste (D...), actualmente Direcção Regional de Agricultura e Pescas de Lisboa e Vale do Tejo, como auxiliar de limpeza, onde apenas se manteve 15 dias, nos serviços sedeados no Palheiro do Pinto, para substituição de uma funcionária de limpeza que se encontrava de férias, a relação jurídica então estabelecida é nula, porque proibida por lei, conforme n° 1 do artigo 43° do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7/12.

  1. - Tal nulidade não foi por qualquer forma sanada com a entretanto publicada Lei nº 23/2004, de 22/6, que aprovou o regime jurídico do contrato individual de trabalho na administração pública, e sob cuja vigência veio a ocorrer a cessação das funções exercidas pela A. ao serviço do recorrente.

    3a - Sendo o Estado Réu e entidade empregadora e tendo sido declarado ilícito o despedimento por incumprimento das normas do CT aplicáveis à situação em que a cessação da relação laboral tem como causa a extinção do posto de trabalho, era indispensável um labor analítico que permitisse concluir se tais disposições têm uma aplicação em bloco ou se alguns dos normativos, compreensivelmente aplicáveis nas relações jurídico laborais entre privados reguladas pelo CT, deveriam ser excluídos por estarem em contradição com as normas e princípios reguladores da LCITAP (lei que aprova o regime jurídico do contrato individual de trabalho da administração pública) - Lei nº 23/2004 de 22/06, e anterior Decreto-Lei nº 427/89, de 7/12).

  2. - Assim, se aquela Lei nº 23/2004, no seu art° 18°, n° 1, alínea b) e n° 2, alínea c), estatui como causa da cessação da relação laboral a extinção do posto de trabalho com fundamento na reestruturação dos Serviços, e especificando que a reestruturação significa a reorganização de um serviço que tenha por objecto a alteração da sua estrutura orgânica ou do seu quadro de pessoal, acompanhada ou não de redefinição das suas atribuições e competências, e se dentro desse quadro o Réu, comunicou a cessação do vínculo laboral expressamente referindo: "a extinção do posto de trabalho com fundamento na reestruturação dos Serviços", e "Nesse contexto e inserido na reestruturação dos serviços em curso, com alteração da estrutura orgânica, acompanhada da redefinição das atribuições e competências, verificou-se a redução de efectivos", a única pergunta que subsiste, uma vez que se verifica tal fundamento, é qual a razão porque as instâncias concluíram pela ilicitude? 5ª - A resposta é a de que as instâncias concluíram pela ilicitude da cessação da relação laboral não em razão da substância, mas por razões formais, em virtude de terem sido incumpridos pelo Réu requisitos (normativos) considerados essenciais e procedimentais inscritos no Código de Trabalho, quando regulamenta a figura da cessação do vínculo laboral tendo como causa a extinção do posto de trabalho.

  3. - A aplicação integral da LCT e do C.T. aos contratos de trabalho nulos celebrados pela administração não foi querida pelo legislador; inúmeras disposições legais apontam no sentido de várias restrições (v.g., art° 15°, n.° 3, da LCT, face ao disposto no art° 10°, nºs 7 e 8 do Decreto-Lei n.° 184/89), ou a norma do art° 10°, nº 2, da Lei 23/2004, de 22/6 (similar ao disposto no art.° 18°, n.° 4, do Decreto-Lei n.°427/89, de 7/12), que impede que um contrato de trabalho a termo resolutivo se possa converter em contrato por tempo indeterminado, - tudo indiciador de um quadro legislativo que tem em vista atenuar as consequências desvantajosas que possam resultar para a administração pública/Estado de compromissos contratuais que violem o regime legal.

  4. - As citadas normas do CT citadas e aplicadas pelas instâncias (arts 402° a 404°; arts 423°, 425° e 432°...) devem ser observadas a esta luz interpretativa, que mais não é que a intenção do legislador, reiteradamente afirmada nos diplomas que têm regulado esta matéria e acima citados, reportando-se as referidas disposições [vg. art. 423°) a comunicações a serem feitas pela entidade empregadora à comissão de trabalhadores ou à comissão intersindical ou sindical e aos restantes trabalhadores envolvidos (art0 423°, do CT), in casu inaplicáveis.

  5. - Assim, a remissão genérica consagrada no nº 1 do citado artigo 18° da Lei 23/2004 para o referido CT não significa que sejam aplicáveis todas as normas, substanciais ou procedimentais que nos termos do mesmo código se encontram estatuídas na situação em que a causa do despedimento é a extinção do posto de trabalho, uma vez que, sem a devida ponderação, tal aplicação pode conduzir a uma aplicação manifestamente contraditória com a norma específica que na citada Lei 23/2004 prevê essa mesma causa de extinção contratual.

    Tal contradição é clara quando no acórdão sob revista se afirma que a carta enviada à A. a comunicar-lhe a cessação do contrato, a que se refere a ai D) dos factos provados, está longe de satisfazer as exigências do referido art. 425°, omitindo designadamente qualquer referência a hipotéticos postos de trabalho alternativos, tal como ao montante da compensação devida, e à forma e lugar do respectivo pagamento.

  6. - Fruto dessa errada interpretação, o douto acórdão entra em manifesta contradição quando afirma que a carta em que foi comunicada a cessão da relação laboral omite uma referência a hipotéticos postos de trabalho alternativos sendo certo que anteriormente, após consignar que a contratação da A. ocorreu na vigência do Decreto-Lei nº 427/89, de 7/12, que proibia a constituição de relações de emprego com o Estado por forma diferente das previstas nesse mesmo diploma, veio a concluir que nenhuma norma do diploma que se lhe seguiu (Lei 23/2004) veio convalidar os contratos...

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