Acórdão nº 07A3717 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Novembro de 2007

Magistrado ResponsávelALVES VELHO
Data da Resolução27 de Novembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. - AA intentou acção declarativa contra "BB - Companhia de Construções de Gaia, Lda" e "CC, SA", pedindo se declarasse não cumprido definitivamente o contrato-promessa celebrado entre a A. e a 1.ª Ré, por culpa e causa imputável exclusivamente àquela, se condenasse a 1.ª Ré no pagamento de indemnização no montante de 11.700.000$00, correspondente ao dobro do sinal que a A. prestou ao abrigo do mesmo contrato e se declarasse o direito de retenção que à A. assiste para ser paga, preferentemente a todos os demais credores, incluindo a 2.ª Ré, pelo produto da venda da fracção "T", penhorada em execução instaurada pela 2ª Ré.

Alegou, para tanto, ter celebrado com a 1.ª Ré, em 4.11.1991, um contrato-promessa de compra e venda, mediante o qual a 1.ª Ré prometeu vender-lhe, livre de quaisquer ónus ou encargos, tendo a A. prometido comprar-lhe, pelo preço de 6.850.000$00, uma fracção autónoma, para habitação.

A A. entregou à 1ª R. as quantias de 2.000.000$00, 1.082.500$00 e 2.767.500$00, que, em 5/3/92, lhe entregou as chaves da fracção onde a A. instalou o seu lar e residência permanente, aí permanecendo.

A escritura de compra e venda realizou-se em 31.3.1992, mas 1.ª Ré não procedeu ao cancelamento das hipotecas que oneravam a fracção, a favor da 2.ª Ré, para garantia de empréstimos que esta concedera àquela para financiamento da construção, as quais ainda hoje se mantêm, mas cuja existência a A. só conheceu em 1994.

A 1.ª Ré não pôde ou não quis desonerar a fracção da A., pelo que o tempo decorrido permite concluir que se lhe tornou impossível cumprir a prestação a que se obrigou perante a A., ou não a quer cumprir, equivalendo a mora a incumprimento definitivo, confere à A. o direito de lhe exigir o dobro do sinal, no total de 5.850.000$00.

Contestou a 2.ª Ré, alegando essencialmente que celebrada a escritura de compra e venda se cumpriu o contrato promessa, pelo que a A. não pode estribar neste o seu pedido.

Após vicissitudes várias, veio a se proferida sentença, que julgou a acção improcedente, decisão que a Relação confirmou.

A A. pede agora revista, insistindo na procedência dos pedidos formulados na acção, concluindo como segue: 1. O acórdão recorrido faz errada interpretação das normas dos art.s 762.º-1, 410.º-1 e 775º-f) do CC.

  1. Os princípios da boa fé (art. 762.º/1), do equilíbrio das prestações e da eficácia dos contratos (art. 406.º/1), entre outros fundamentais das obrigações em geral, mas também o elemento literal, impõem a interpretação e aplicação daquelas normas legais no sentido oposto ao preconizado.

  2. A celebração do contrato de compra e venda não pode ter como efeito inexorável a extinção das obrigações assumidas em contrato-promessa.

  3. Menos pode ter como efeito desonerar o promitente vendedor de libertar o prédio da hipoteca que constituiu a favor de terceiro e mantinha, sob pena de destruir-se todo o equilíbrio de valor das prestações que o contrato-promessa pressupõe: 5. A escritura de compra e venda celebrada constitui incumprimento ou cumprimento tão parcial ou tão defeituoso, atendendo a que o valor da hipoteca excede várias vezes o valor da fracção, que se equivale ao incumprimento e constitui a A. no direito à indemnização pelo dobro do sinal e no direito de retenção sobre o imóvel, para ser paga preferentemente pelo produto da venda judicial, nos termos das disposições legais dos art.s 441.º, 442.º/2, 755.º-f) e demais aplicáveis do CC.

  4. Não pode fazer-se uma cisão radical entre a modalidade jurídica do comprometimento e o conteúdo concreto da promessa, que mobilizou as vontades negociais.

  5. É radicalmente díspar prometer vender sem ónus ou encargos e contratar depois a compra e venda do bem onerado por hipoteca, muito para além da variabilidade que pode admitir-se entre as cláusulas da promessa e as do contrato efectivamente celebrado sem subverter a matriz fundadora do negócio jurídico assente pela parte que o prometeu.

  6. Correspondendo à concreta promessa ajuizada um modelo de execução específica, que contempla também a imposição ao promitente vendedor de extinguir a garantia, quer de mão própria...

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