Acórdão nº 296/07.7TTFIG.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Setembro de 2011

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução14 de Setembro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 11 de Outubro de 2007, no Tribunal do Trabalho da Figueira da Foz, AA instaurou acção declarativa, com processo comum, contra S...G..., Lda., pedindo que, (A) reconhecido que «a trabalhadora pôs termo licitamente ao seu contrato por justa causa», a ré fosse condenada a pagar-lhe: (B) € 4.572,56, a título de diferenças entre a retribuição paga e a que efectivamente lhe era devida por Regulamentação Colectiva de Trabalho; (C) € 1.816,02, a título de diuturnidades; (D) € 2.287,52, a título de proporcionais de férias, de subsídio de férias e de subsídio de Natal, vencidos à data da cessação do contrato de trabalho; (E) € 14.642,10, a título de indemnização «pela ilicitude do comportamento da ré e por ter dado causa à resolução do contrato de trabalho […]»; (F) € 5.000, a título de indemnização por danos não patrimoniais; (G) a quantia que se vier a apurar a título de juros moratórios vencidos desde o efectivo vencimento de cada uma das prestações peticionadas até efectivo e integral pagamento.

Frustrada a conciliação empreendida na audiência de partes, a ré apresentou contestação — a que a autora respondeu —, em que invoca a prescrição dos créditos peticionados, a caducidade do direito de resolução do contrato de trabalho, o abuso do direito e a improcedência dos créditos salariais reclamados.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que, concluindo no sentido da caducidade do direito à resolução do contrato de trabalho e da prescrição dos créditos reclamados, julgou a acção improcedente, absolvendo a ré.

  1. Inconformada, a autora interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Coimbra, que julgou a apelação parcialmente procedente, confirmando a sentença recorrida na parte referente à caducidade do direito de resolução do contrato e revogando-a, no mais, por considerar não ter ocorrido a prescrição dos créditos reclamados, e, em consequência, condenou a ré a pagar à autora a quantia global de € 6.771,80 (€ 4.049,60 de diferenças salariais, € 614 de diuturnidades e € 2.108,13 de proporcionais de férias e subsídios de férias e de Natal do ano da cessação do contrato), acrescida de juros de mora, devidos desde o vencimento de cada uma das prestações identificadas e até efectivo e integral reembolso.

    É contra esta decisão que autora e ré agora se insurgem, mediante recurso de revista — sendo o da ré subordinado —, em que formulam as seguintes conclusões: RECURSO DA AUTORA: «I. O douto Acórdão de que se recorre terá de ser parcialmente revogado, com a procedência integral da presente Revista, porquanto viola, por incorrecta aplicação e ou interpretação os artigos 441.º, 442.º, 443.º, 444.º, 381.º, todos do CTrabalho, 436.º, 329.º, 8.º e 9.º do CCivil, 20.º, 53.º, 58.º, 13.º da Constituição da República Portuguesa.

    1. O Acórdão terá de ser parcialmente revogado, porquanto errou ao considerar que o despedimento da trabalhadora não integrava o elemento da actualidade, fundamental para que a resolução por justa causa opere licitamente.

      Contrariamente à tese plasmada na decisão que ora se coloca em crise, o início do cômputo do prazo de caducidade de resolução contratual não pode ser alheio ao facto de se tratar de uma violação de direitos que se esgote num único acto, instantâneo, ou de uma violação de direitos que seja duradoura, permanente, contínua, que se renove ou que se vá agravando.

    2. A trabalhadora foi alvo, por parte da entidade empregadora, de violação do seu direito de efectivo exercício de funções correspondentes à sua categoria funcional, tendo sido alvo de uma ilícita baixa de categoria. Porém, não tendo sido uma alteração da categoria nominal, mas antes, consubstanciando-se em alterações de funções que globalmente permitiam revelar que a categoria funcional da trabalhadora se alterara, com violação do seu direito e expectativa de carreira, com violação do conteúdo funcional e alteração unilateral do objecto do seu contrato de trabalho, esta agressão não se pode isolar num momento, mas na sucessão de actos, de dias em que as tarefas não são atribuídas à trabalhadora, em que são entregues a outrem, em que lhe não são devolvidas.

    3. A justa causa de despedimento ou o direito de a trabalhadora resolver de imediato o seu contrato de trabalho, não fica preenchido no primeiro acto que assim ocorre, mas somente quando é reposto o direito, ou, sem prescindir, quando muito porque a gravidade é crescente e decorre da sucessão de condutas violadoras, até ao momento em que a trabalhadora toma consciência de que a situação é irreversível, permanente e em que igualmente, pela soma das agressões, toma consciência não dos factos a que foi sujeita, mas dos factos e danosidade que em si provocaram, e sente que o seu contrato não pode subsistir.

      Não pode exigir-se a um trabalhador uma tomada de decisão irreflectida e imatura sobre a cessação do seu vínculo contratual, obrigando-o a reagir a qualquer agressão.

    4. Decidir-se de outro modo, fazendo coincidir o início do prazo de 30 dias para a resolução do contrato, com o primeiro acto violador do princípio da correspondência e tendencial imutabilidade do conteúdo funcional contratual, é consagra [sic] um direito de antecipada renúncia ao direito de reagir, pela resolução, contra agressões de matriz idêntica que ocorram após aqueles primeiros 30 dias.

      O prazo de caducidade não poderá esgotar-se enquanto se mantiver a situação anti--contratual ou de violação, porquanto até esse momento a infracção se renova continuamente, ou, quando muito, não poderá iniciar-se senão a partir do momento em que a trabalhadora sente que o seu contrato não pode persistir.

    5. Muito embora tivessem decorridos mais do que 30 dias entre o momento em que a entidade empregadora deixou de atribuir à trabalhadora funções de Chefe de Departamento de Recursos Humanos (sem alteração de nomen) e o momento da resolução contratual, porque a situação de violação se mantinha, sem reposição do status quo ante, a resolução é actual e lícita.

    6. Constitui fundamento de resolução com justa causa o facto de a trabalhadora ter sido alvo de um processo disciplinar injusto e injustificado, que reage ao facto de a trabalhadora exercer o seu direito de escusa de prestação de trabalho suplementar, processo disciplinar que durante 4 meses não teve qualquer desenvolvimento que não o da Nota de Culpa e Resposta à Nota de Culpa, sem que fossem promovidas diligências instrutórias e designadamente a inquirição das testemunhas arroladas pela trabalhadora, e sem que tivesse conhecido qualquer decisão final.

    7. A conduta da entidade empregadora é persecutória da trabalhadora e pretende influir no seu exercício de direitos laborais, bem como lhe denega um efectivo direito de defesa e direito a uma decisão justa e célere. Decisão que sendo justa culminaria com a absolvição da Arguida ou que, mesmo injusta, sempre permitiria à trabalhadora o recurso ao controle jurisdicional para impugnação de eventual sanção.

    8. O comportamento assim descrito da entidade empregadora era actual à data em que a trabalhadora se despediu, foi invocado como fundamento do despedimento, era grave, provocou desânimo, instabilidade e tristeza na trabalhadora e é um comportamento culposo, pois a entidade empregadora bem sabia que o processo disciplinar era injusto e injustificado, mas mesmo assim quis e conseguiu reagir ao exercício de direitos da trabalhadora, tornando-a Arguida permanente de um processo disciplinar sem direito de provar a sua inocência.

    9. Este comportamento foi invocado pela trabalhadora como fundamento do seu despedimento quer na declaração de resolução contratual, quer na Petição Inicial, provando-se em juízo, o preenchimento de todos os elementos da justa causa de despedimento.

    10. A cessação do contrato de trabalho operada pela trabalhadora ocorreu por resolução, por justa causa, lícita, por baixa de categoria e injusto processo disciplinar, sendo suficiente qualquer um daqueles fundamentos para a licitude dessa resolução. Pelo que a douta Sentença Recorrida erradamente considerou não actual a “baixa de categoria” ou destituição de funções, bem como erradamente considerou que a agressão cometida com o injusto processo disciplinar não foi culposa ou não tem em si mesma identidade e substância fundamentante da resolução.

    11. Porque a trabalhadora fez cessar o seu contrato por resolução com justa causa lícita e fundada em comportamento culposo da entidade empregadora subsumível aos n.os 1 e 2 do artigo 441.º do Código do Trabalho, a trabalhadora tem direito a indemnização prevista no artigo 443.º do Código do Trabalho, que deverá ser fixada em 45 dias de retribuição de base por cada ano (proporcional na fracção) de antiguidade, atenta a ilicitude, culpa, danos sofridos pela trabalhadora e a sua retribuição.

    12. Pelo que, sendo lícita a resolução com justa causa operada pela trabalhadora e não estando prescritos quaisquer créditos à data da citação da Ré na presente acção o douto Acórdão proferido terá de ser parcialmente revogado por outro que conclua como na PI pela condenação da Ré a pagar à Autora indemnização pela ilicitude do despedimento igual a 45 dias de retribuição por cada ano de antiguidade da Autora, bem como a compensar a Autora de danos morais em quantia não inferior a € 5.000.» Termina afirmando que o recurso deve ser julgado procedente, revogando-se o acórdão recorrido, «substituindo-se por Acórdão que reconheça que o contrato de trabalho cessou por resolução contratual lícita e licitamente operada, com fundamento em violação grave dos direitos e garantias legalmente protegidos da trabalhadora, perpetrada pela entidade empregadora de forma grave e culposa, que essa conduta era actual à data do despedimento e que foi a mesma que tornou impossível a subsistência do vínculo laboral e que condene a Ré a pagar à Autora todas as quantias peticionadas, a título de créditos emergentes da cessação do contrato de trabalho, e...

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