Acórdão nº 680/98 de Tribunal Constitucional (Port, 02 de Dezembro de 1998

Magistrado ResponsávelCons. Maria dos Prazeres Beleza
Data da Resolução02 de Dezembro de 1998
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 680/98

Processo nº 456/95

  1. Secção

Relatora: Maria dos Prazeres Pizarro Beleza

  1. Por acórdão do 3º Juízo Criminal da Comarca de Lisboa, de 13 de Janeiro de 1994, foram os recorrentes, R. Mt. e J. A., condenados como co-autores de um crime de corrupção activa, nas penas, respectivamente, de 4 anos e seis meses de prisão e de 130 dias de multa, e de 4 anos de prisão e 110 dias de multa.

    Interpostos recursos para o Supremo Tribunal de Justiça por ambos os arguidos, alegaram estes nas respectivas motivações, por entre o mais que ora não releva: a inconstitucionalidade do "nº 2 do artigo 374º" do Código de Processo Penal, na interpretação acolhida no Acórdão recorrido, por violação do nº 1 do artigo 32º da Constituição; a inconstitucionalidade de "uma interpretação das normas pertinentes do CPP, nomeadamente do artigo 374º, nº 2, e 410º, nº 2, als. b) e c), no sentido de dispensar a indicação dos elementos que conduziram a que a convicção do tribunal se formasse em determinado sentido ou valorasse de determinada forma os diversos meios de prova apresentados em audiência", por violação dos princípios informadores do Estado de Direito Democrático; a violação do princípio da presunção de inocência, por o acórdão não ter indicado "qualquer prova positiva", susceptível de afastar a referida presunção.

    Por Acórdão de 3 de Maio de 1995, o Supremo Tribunal de Justiça decidiu negar provimento aos recursos, confirmando integralmente a decisão recorrida.

    Interpuseram então os arguidos recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional (Lei nº 28/82, de 15 de Novembro). Tal como haviam feito na motivação dos recursos interpostos para o Supremo Tribunal de Justiça, vieram acusar de ser inconstitucional a interpretação acolhida no Acórdão recorrido, que confirmara a decisão da primeira instância, "das normas dos arts. 374º, nº 2 e 410º, nº 2 als. b) e c), todas do Código de Processo Penal..., por ser uma interpretação violadora dos princípios basilares do Estado de direito Democrático e nomeadamente dos artºs 32º, nºs 1 e 2 da Constituição da República Portuguesa". Defendem os recorrentes que "a invocação do art. 32º, nº 1 da Constituição refere-se à necessidade de fundamentação das decisões..., para que o tribunal de recurso possa julgar da correcção da aplicação dos princípios de direito probatório, estabelecidos pela Constituição... sem o que será violada a garantia constitucional de que ‘o processo criminal assegurará todas as garantias de defesa’;

    A invocação do art. 32º, nº 2 da Constituição refere-se ao princípio probatório da presunção de inocência que no entendimento do arguido é um princípio substancial de direito probatório e não apenas um princípio formal disciplinador das fases do processo, implicando consequentemente para o seu afastamento que seja produzida prova positiva em contrário da presunção".

    "A invocação dos princípios basilares do Estado de Direito Democrático refere-se ainda à necessidade de fundamentação das decisões judiciais em matéria de facto como condição da legitimação democrática do poder judicial" (As transcrições são tiradas de ambos os requerimentos de interposição de recurso, que têm um texto idêntico).

  2. Os recorrentes concluem as suas alegações (apresentadas conjuntamente) produzidas neste Tribunal da seguinte forma:

    "a) O artigo 32º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa, ao garantir que ‘o processo criminal assegurará todas as garantias de defesa’ não se refere apenas à produção de prova na audiência em 1ª instância, mas a todas as fases e actos do processo.

    b) A fundamentação exigida pelos artºs. 97º, nº 4, e 374º, nº 2, do Código de Processo Penal, não consiste na mera enumeração dos meios de prova utilizados para a decisão, com o que se conseguiria tão-só, e limitadamente, verificar se foram ou não utilizadas provas proibidas.

    c) As garantias de defesa consagradas no artº 32º, nº 1, da CRP abrangem todos os meios necessários à efectiva defesa dos arguidos, nomeadamente de defesa contra os erros de julgamento e arbítrio dos julgadores.

    d) Para que seja possível a defesa contra tais possíveis erros e abusos e ainda quanto à legalidade da decisão no domínio probatório, importa que a motivação do juízo em matéria de facto conste da decisão, sem o que se veda ao arguido a possibilidade de requerer o controlo da legalidade pela via do recurso.

    e) A interpretação acolhida no Acórdão recorrido dos artºs. 374º, nº 2, e 410º, nº 2, do CPP, no sentido de dispensar a indicação dos elementos probatórios que conduziram a que a convicção do tribunal se formasse em determinado sentido ou valorasse de determinada forma os diversos meios de prova apresentados em audiência, viola basilares princípios informadores do Estado de Direito Democrático, nomeadamente a transparência das decisões judiciais, o do controle das decisões judiciais pela via do recurso, e as garantias de defesa do arguido.

    f) A garantia do efectivo direito de defesa do arguido, consagrada no artº 32º, nº 1, da CRP, impõe que na sentença sejam indicados os elementos que em razão das regras da experiência ou de critérios lógicos constituem o substracto racional que conduziu a que a convicção do tribunal se formasse em determinado sentido ou valorasse de determinada forma os diversos meios de prova apresentados em audiência.

    g) A interpretação acolhida no Acórdão recorrido, no sentido de não exigência dos motivos que fundamentam a decisão em matéria de facto, é materialmente inconstitucional, por violar o direito de defesa, consagrado no artº 32º, nº 1, da Constituição.

    h) O Acórdão de 1ª Instância, objecto do Acórdão proferido em recurso e ora recorrido, apenas indica como motivação da decisão em matéria de facto o sentido das respostas de todos os arguidos, limitando-se a remeter no demais para os meios de prova produzidos em audiência, que simplesmente enumera.

    i) Não foi indicada qualquer prova positiva que contrarie o princípio da presunção de inocência, consagrado no artº 32º, nº 1, da Constituição.

    j) Tal princípio, o da presunção de inocência, só pode ser afastado por uma prova positiva, e não por prova negativa, como é a resultante dos depoimentos dos arguidos ao negarem os factos objecto da acusação.

    l) Essa prova positiva, contrária à presunção de inocência é necessária para afastar esta presunção, deve constar da motivação da decisão, sem o que não é possível verificar se a decisão violou aquela garantia constitucional.

    m) O Acórdão recorrido, ao não dar provimento ao recurso dos arguidos, decidindo não ser necessária a indicação na fundamentação da decisão da 1ª instância dos motivos da decisão, bastando-se com a mera enumeração dos meios de prova, violou a garantia constitucional consagrada no artº 32º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa.

    n) O mesmo Acórdão violou também a garantia constitucional da presunção de inocência do arguido, consagrada no artº 32º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa, ao decidir que os motivos que afastam essa garantia não necessitam de ser indicados na decisão.

    o) O Acórdão recorrido violou também o artº 32º, nº 2, da CRP, ao decidir que o princípio da presunção de inocência apenas significa que o arguido só se considera culpado após trânsito em julgado da sentença condenatória.

    p) E violou também a garantia da presunção de inocência e o direito de defesa ao decidir por mera presunção que da "prova variada e abundante" produzida em audiência de julgamento resultou prova positiva bastante para afastar o referido princípio da presunção de inocência.

    q) A legitimação democrática do poder judicial passa necessariamente, no sistema constitucional português, pela necessidade de motivação das decisões judiciais em matéria de facto.

    r) A interpretação dada no Acórdão recorrido aos artºs...

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