Acórdão nº 244/00 de Tribunal Constitucional (Port, 12 de Abril de 2000

Magistrado ResponsávelCons. Guilherme da Fonseca
Data da Resolução12 de Abril de 2000
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 244/00

Processo nº 131/99 FALTA DECLARAÇÂO de VOTO

  1. Secção

Relator: Cons. Guilherme da Fonseca

(Consª. Fernanda Palma)

Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. O Banco N...,SA deduziu junto do Tribunal Tributário de 1ª Instância de Lisboa (2º Juízo) impugnação judicial relativa à liquidação do IRS do ano de 1992, referente ao imposto devido por "juros decorridos" (juros de títulos transaccionados relativos a um período em que os títulos permanecem na posse de outrem). Na respectiva petição inicial, o impugnante não suscitou qualquer questão de constitucionalidade ou de legalidade normativa, questionando "a liquidação impugnada", por estar "ferida de ilegalidade".

    O Tribunal Tributário de 1ª Instância de Lisboa, por decisão de 19 de Maio de 1997, julgou a impugnação improcedente.

  2. O Banco N...,SA interpôs recurso da decisão de 19 de Maio de 1997 para o então Tribunal Tributário de 2ª Instância. Nas alegações, o recorrente afirmou, no texto, que o entendimento, segundo o qual "qualquer rendimento está sujeito às normas de incidência de IRS", é inconstitucional, "por violar o princípio (...) da tipicidade tributária" (artigo 106º, nº 2, da Constituição). Nas conclusões, sustentou que "as posições doutrinais que sustentam o recurso a uma interpretação extensiva da alínea c) do artigo 6º do Cód. do IRS" não são de aceitar, "uma vez que as mesmas, no caso em apreço, sempre colidiam com as garantias dos contribuintes decorrentes do princípio constitucional da tipicidade tributária".

    O Tribunal Central Administrativo, por acórdão de 24 de Março de 1998, declarou-se incompetente em razão da hierarquia.

    Os autos foram entretanto remetidos ao Supremo Tribunal Administrativo (4ª Secção - Contencioso Tributário) que, por acórdão de 25 de Novembro de 1998, negou provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida. Para tanto, fez aplicação expressa do artigo 6º, nº 1, alínea c), do Código, relativo ao imposto sobre rendimento das pessoas singulares, na redacção do Decreto-Lei nº 263/92, de 24 de Novembro, considerando ainda que "o mais importante foi a introdução do nº 3 a esse artº 6º do CIRS".

  3. O Banco N....,SA interpôs recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão de 25 de Novembro de 1998, ao abrigo do disposto no artigo 70º, nº 1, alíneas b) e f), da Lei do Tribunal Constitucional, afirmando a inconstitucionalidade da interpretação autêntica do artigo 6º, nº 1, alínea c), do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, doravante Código do IRS, realizada pelo artigo 1º do Decreto-Lei nº 263/92, de 24 de Novembro, bem como a ilegalidade da interpretação administrativa do disposto nos artigos 9º e 10º, do Decreto-Lei nº 215/89, de 1 de Junho, e no artigo 75º do Código do IRS, efectuada pelas Circulares nºs 16/89 e 17/90, de 9 de Novembro e de 27 de Maio, respectivamente.

  4. Junto do Tribunal Constitucional o Banco recorrente apresentou alegações que concluiu do seguinte modo:

    "A. Os "juros decorridos" não só não constituem um rendimento de capital, em virtude de não provirem da aplicação de um activo, como não se integravam na previsão da norma que tributava tais tipos de rendimentos, dado que o legislador, contrariamente à intenção evidenciada, apenas adoptou uma determinada concepção de rendimento acréscimo.

    1. Tais operações que, segundo o entendimento da Administração Fiscal, originavam uma situação de evasão fiscal lícita, apenas passaram a ser tributadas com a publicação do Decreto-Lei nº 263/92, de 24 de Novembro.

    2. Contudo, tal regime jurídico apenas poderá ser aplicado às situações jurídico-tributárias que se verifiquem posteriormente à data da vigência deste diploma.

    3. Contrariamente ao sustentado no Acórdão em crise, o regime jurídico consignado nesse diploma não constitui uma mera explicitação da previsão da norma de incidência dos rendimentos de capital, pelo que não consubstancia uma mera lei interpretativa.

    4. Aliás, seria absurdo que o legislador concebesse a necessidade de produzir uma alteração legislativa, quando essa solução já se continha na previsão de uma norma existente no ordenamento jurídico.

    5. Diplomas deste género, cujo sentido e alcance não possa ser expectado pelos contribuintes revestem, a natureza retroactiva e afectam o princípio da segurança jurídica.

    6. Princípio esse, cuja violação era tutelada pela Jurisprudência deste Alto Tribunal, desde que a mesma se traduzisse numa lesão grave da segurança jurídica.

    7. Situação que se verificou no caso presente, dado ser convicção dos operadores financeiros que a venda de títulos da dívida pública antes da data do seu vencimento, apenas poderia gerar mais-valias não tributadas.

      1. Não podendo o diploma em causa ser qualificado como lei interpretativa, por encerrar normas modificativas do regime jurídico instituído, a sua aplicação para sustentar a decisão proferida é manifestamente inconstitucional, por força do duplo princípio da legalidade e tipicidade tributária, consagrado no nº 2, do artigo 103º, da Lei Fundamental.

    8. Mesmo que assim se não entenda, o que só por mera hipótese académica se admite, ainda assim a aplicação desse regime sempre se traduziria na sua aplicação retroactiva, igualmente proibida pela Constituição da República Portuguesa, conforme tem sido entendimento deste Alto Tribunal, que já mereceu acolhimento expresso no nº 3, do artigo 103º.

    9. Deste modo, deve ser declarada a inconstitucionalidade do Douto Acórdão proferido, em virtude de ter aplicado o regime constante do Decreto-Lei nº 263/92, de 24 de Novembro à situação em apreço, violando os princípios da legalidade, tipicidade...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT