Acórdão nº 543/01 de Tribunal Constitucional (Port, 05 de Dezembro de 2001
Magistrado Responsável | Cons. Artur Maurício |
Data da Resolução | 05 de Dezembro de 2001 |
Emissor | Tribunal Constitucional (Port |
ACÓRDÃO Nº 543/01
Proc. nº 302/01
TC 1ª Secção
Relator: Consº. Artur Maurício
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1 I... intentou, em 15.12.1994, acção declarativa de despejo para habitação própria contra F... e mulher, M..., no Tribunal Judicial da Comarca de Faro.
Os réus contestaram a acção e, em 3.07.1997, vieram juntar aos autos articulado superveniente referindo que o R. marido completara 65 anos de idade na pendência da acção.
Por ter sido apresentado fora do prazo estabelecido no artigo 506º nº 3 do CPC o R marido completara 65 anos de idade , em 11/6/97 - o referido articulado superveniente não foi admitido por despacho de 13.11.1997, decisão de que os RR. agravaram para o Tribunal da Relação de Évora.
Por sentença de 25.05.1999, o Tribunal Judicial da Comarca de Faro julgou procedente a acção, declarou o contrato de arrendamento denunciado desde 18.11.1995 e, em consequência, decretou o despejo do arrendado condicionado ao pagamento pela A aos RR de uma indemnização correspondente a 2 anos e meio de renda, no montante total de 258 000$00.
Inconformados os RR apelaram para o Tribunal da Relação de Évora, tendo apresentado alegações que concluíram do seguinte modo, no que interessa ao juízo de constitucionalidade:
(...)
L. As partes estão, à partida, em pé de igualdade, cabe ao Estado ordenar a administração da Justiça para que os processos sejam decididos em prazo razoável, e cabe ao juiz tomar as providências necessárias para, com respeito pelos direitos das partes, evitar e sancionar processualmente as manobras dilatórias.
-
A referência dos efeitos da denúncia a momento diferente e anterior ao do trânsito em julgado da sentença é susceptível de conduzir a situações em que dois arrendatários, colocados em situações materialmente idênticas à data em que lhes é exigível o despejo, podem ter tratamento diferentes quanto à cessação do arrendamento, apenas porque num deles ocorreu uma causa de impedimento do exercício da denúncia antes de decorridos seis meses sobre a citação e, no outro, a mesma causa de impedimento só ocorreu após o decurso desse prazo.
-
Em tais circunstâncias, e interpretando o momento de produção dos efeitos da denúncia como a partir da data da citação, o art. 107 RAU é materialmente inconstitucional por violação do princípio da igualdade consagrado no art. 13 CRP.
O O Governo, ao aumentar de 20 para 30 anos o prazo de vigência do contrato de arrendamento, para efeitos de impedir o exercício do direito à denúncia para habitação do senhorio não preservou normas nucleares que tutelam socialmente a posição do arrendatário e legislou em contradição com a autorização legislativa, pelo que o art. 107 RAU é organicamente inconstitucional, por violação do art. 168.1.h) e 2. CRP (hoje art. 165).
-
A sentença ora sob recurso interpretou e aplicou o art. 107 RAU por forma que viola manifestamente, nos termos e pelas razões acima expostas, o disposto nos 13 da Constituição da República, e fez incorrecta aplicação dos arts. 69.1.a), 107.1, a) e 109 do Regime do Arrendamento Urbano.
-
Por outro lado, deveria ter a sentença considerado que o momento da produção dos efeitos da denúncia é o termo da renovação do contrato que se seguir ao trânsito em julgado da sentença que decreta a cessação do arrendamento e, fazendo-o, não aplicar o disposto no art. 107.1.a) RAU, mas, julgando-os organicamente inconstitucionais, aplicar, por repristinação, o artº. 2.1.b) da Lei nº. 55/79 de 15 de Setembro, na redacção da Lei nº. 46/85 de 20 de Setembro, e julgada procedente a causa correspondente de impedimento do exercício do direito de denúncia pelo senhorio, por completamento do período de vigência contratual de 20 anos antes do momento em que a denúncia deve produzir efeitos.
Por acórdão de 28.06.2000, o Tribunal da Relação de Évora negou provimento ao agravo porquanto o momento da apresentação do articulado superveniente está indexado tanto à ocorrência dos factos novos, como ao conhecimento. E se quanto à ocorrência poderia admitir-se hipotético motivo de discussão, advindo a tese dos recorrentes, e a partir da natureza do acontecimento emergente, já assim não pode ser no que diz respeito ao conhecimento, esse naturalmente instantâneo e quanto à permanência por 20 anos dos inquilinos no arrendado, concordamos com a solução dada no despacho recorrido que, como se verá, teve reflexo na sentença final, de não haver necessidade de ser trazida a articulado superveniente, por ser facto já alegado.
Também no que respeita à apelação, o recurso não teve provimento.
Vieram então os RR. requerer a reforma do acórdão, quer quanto ao agravo, quer quanto à apelação, por requerimento de 20.09.2000, pedidos que não obtiveram provimento, destacando-se quanto à apelação o seguinte:
(...) o direito constitucional à habitação representa apenas uma directiva ao executivo, com vista a ser concretizada nas condições históricas, incluindo aquelas que resultam do sufrágio eleitoral, em que se estabelece a concreta formação política conjuntural. Nestes termos, o juízo interpretativo acerca dos citados arts. do RAU a que se procedeu no acórdão, só pode relevar no interior deste círculo; por conseguinte, os parâmetros de conformidade à Constituição, têm de ser buscados na intenção do legislador comum. Foi, em boa verdade, nesta direcção que foi usado o argumento sentencial, pondo em evidencia afinal que no sopesar dos interesses legítimos de senhorios e inquilinos, na lei ordinária foi escolhido não o momento do despejo, mas o momento do termo do contrato (para que se requer a denúncia), com a finalidade de ser termo de referência da proibição fundada no tempo de permanência no locado, o que vale também para o tempo em que o despejando perfaz 65 anos ou mais de idade.
Também aqui falece razão à pretendida reforma da sentença.
Por requerimento de 20.01.2001 vieram os RR. interpor recurso para o Tribunal Constitucional para:
a) declaração da inconstitucionalidade material das normas contidas nos arts. 69.1 e 107.1 do Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pelo Decreto-Lei nº. 321-B/90 de 15 de Outubro, na interpretação de que o momento da produção de efeitos da denúncia do contrato de arrendamento urbano para habitação é outro que não seja o da cessação do contrato ou da prorrogação que ocorrer após o trânsito em julgado da sentença constitutiva que autoriza a denúncia pelo senhorio, por violação dos art.ºs 2º. (República Portuguesa como Estado de direito democrático baseado no respeito e na garantia de efectivação dos direitos e liberdades fundamentais), 13º (princípio da igualdade), 20.1 (garantia da tutela jurisdicional efectiva, conjugado com o art. 8 da Declaração Universal dos Direitos do Homem), 65...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO