Acórdão nº 313/02 de Tribunal Constitucional (Port, 03 de Julho de 2002

Magistrado ResponsávelCons. Tavares da Costa
Data da Resolução03 de Julho de 2002
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 313/02

Processo n.º 171/98

  1. Secção

    Rel. Cons. Tavares da Costa

    Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

    I

    1. - Por sentença proferida no processo correccional n.º 259/89, da 1ª Secção do 1º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Matosinhos, A e B, identificados nos autos, foram condenados pela prática de um crime de usurpação, previsto e punido nos artigos 195º, n.º1, e 197º do Código dos Direitos de Autor e Direitos Conexos (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 63/85, de 14 de Março, na redacção da Lei n.º 45/85, de 17 de Setembro), e de um crime de concorrência desleal, previsto e punido nos artigos 212º e 213º do Código da Propriedade Industrial – texto aprovado pelo Decreto nº 30 679, de 24 de Agosto de 1940 e alterado pelo Decreto-Lei nº 176/80, de 30 de Maio (as ulteriores citações destes dois Códigos reportar-se-ão aos textos mencionados) – nos seguintes termos:

    1. O primeiro, como autor, pela prática do crime de usurpação, na pena de 16 meses de prisão e de 130 dias de multa à taxa diária de 6.500$00, o que perfaz o montante global de 845.000$00, ou, em alternativa, em 86 dias de prisão, e, pela prática do crime de concorrência desleal na pena de 140.000$00 de multa e dois meses de prisão;

    2. O segundo, como autor pela prática do crime de usurpação na pena de 13 meses de prisão e 100 dias de multa à taxa diária de 6.500$00, no montante global de 650.000$00, a que correspondem, em alternativa, 66 dias de prisão, e, como cúmplice pela prática do crime de concorrência desleal, na pena de 80.000$00 de multa.

      Em cúmulo jurídico das penas de prisão aplicadas ao primeiro arguido, foi este condenado na pena única de 17 meses de prisão.

      As penas de prisão aplicadas a cada um dos arguidos foram declaradas suspensas na sua execução pelo período de dois anos e meio e, nos termos do artigo 14º, n.º1, alínea b) da Lei n.º 23/91, de 4 de Julho, declarou-se perdoado metade do valor das penas de multa aplicadas e a totalidade do tempo de prisão fixado em alternativa à multa.

      Nos termos da mesma decisão foram ainda os arguidos condenados solidariamente no pagamento das quantias de 44.851.248$00 a favor da assistente "BMG – Ariola Munich GMBH", e de 11.398.407$50 aos autores cujas obras foram ilicitamente fabricadas, podendo este último pagamento ser efectuado à Sociedade Portuguesa de Autores, no caso de provar o mandato da parte desses autores.

      1. - Inconformados, os arguidos interpuseram recurso para o Tribunal da Relação do Porto que, por acórdão de 5 de Janeiro de 1994, decidiu confirmar, embora com fundamentação diversa, a decisão da 1ª instância de rejeição dos documentos apresentados pelo recorrente A com as suas alegações, e alterar a sentença recorrida nos seguintes termos:

    3. Condenar B também como autor (e não como cúmplice) de um crime de concorrência desleal, previsto e punido pelos artigos 212º, n.º1 e 213º do Código da Propriedade Industrial, na pena de multa 140.000$00 e dois meses de prisão e, em cúmulo jurídico, na pena única de 14 meses de prisão e na multa total de 790.000$00, sendo de 66 dias de prisão a alternativa correspondente à multa parcial de 100 dias de multa à taxa diária de 6.500$00;

    4. Englobar na suspensão da execução da pena todas as sanções impostas e não só as penas de prisão, reduzindo-se o prazo de suspensão da execução das penas para dois anos; e

    5. Determinar que o perdão previsto pela Lei n.º 23/91, de 4 de Julho, só seja aplicado, na 1ª Instância, na hipótese de uma eventual revogação da suspensão da execução da pena.

      Deste aresto interpuseram recurso para o Supremo Tribunal de Justiça os réus A. por requerimento de fls. 1897, apresentado em 17 de Janeiro de 1994, e B, por requerimento de fls. 1898, da mesma data, ambos pugnando pela sua absolvição, recursos esses que vieram a ser recebidos por despacho do Conselheiro relator datado de 18 de Setembro de 1997 (fls. 1952).

      Conforme a síntese do acórdão de 16 de Outubro de 1997, concernente à argumentação dos recorrentes:

    6. O artigo 195º do Código dos Direitos de Autor e Direitos Conexos ser inconstitucional, por ofensa dos princípios da legalidade (previsão do facto por lei anterior à prática deste) e da tipicidade;

    7. Não ter ficado provada a falta de acordo dos autores das obras que se dizem contrafeitas para a prática dos actos que os recorrentes praticaram, pois apenas se terá demonstrado a falta de acordo da Sociedade Portuguesa de Autores, sem que esta represente aqueles, e das produtoras C e D, que não são nem autores, nem artistas ou produtores de fonogramas;

    8. Os factos terem sido praticados em 1986, data em que a nossa lei não previa a protecção dos produtores fonográficos estrangeiros, qualidade que tinha a assistente C;

    9. Não haver lugar à fixação da indemnização, em termos de equidade, como foi decidido, por se não ter feito prova da existência dos danos correspondentes;

    10. O artigo 212º do Código da Propriedade Industrial ser igualmente inconstitucional, por falta de determinação da tipicidade;

    11. Os factos provados não permitirem ter como configurada a previsão deste artigo;

    12. A não admissão de documentos apresentados pelo arguido A depois do seu interrogatório, feita pela primeira instância e confirmada pela Relação, ser violadora do princípio da averiguação da verdade material, pelo que deverá ser revogada;

    13. A condenação do arguido B como autor do crime de concorrência desleal, quando se encontrava acusado como cúmplice, corresponder a uma "reformatio in pejus" proibida, em virtude de o artigo 7º do Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de Fevereiro, ao abrigo do qual foi feita a aplicação do Código de 1929, se dever considerar como inconstitucional, na medida em que mantém em vigor um regime processual penal mais gravoso do que o resultante da aplicação da lei nova.

      As assistentes C, e Sociedade Portuguesa de Autores, nas suas alegações conjuntas, vieram defender a manutenção do decidido.

      O Ministério Público, em contra-alegações, para além de suscitar a questão prévia da falta de apresentação de conclusões dos recursos dos recorrentes, veio defender que se não verificam os vícios por eles apontados, ainda que, numa visão mais alargada do problema, se possa vir a aceitar a invocada inconstitucionalidade do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 78/87, de 7 de Fevereiro, e, em consequência, a alterar a incriminação do arguido B para a cumplicidade do crime de concorrência desleal, tal como constava da acusação.

      1. - O Supremo Tribunal de Justiça, no aludido acórdão de 16 de Outubro de 1997, decidiu que "os recursos (...) improcedem na totalidade, e a decisão recorrida não enferma de qualquer vício que implique a alteração do julgado, quer quanto ao enquadramento jurídico-penal das condutas dos arguidos, quer quanto às penas, quer, ainda, quanto ao montante das indemnizações arbitradas, pelo que se confirma integralmente a mesma".

        Contra este aresto reagiram os recorrentes invocando a nulidade da decisão, alegando que não foram convidados a apresentar as conclusões das suas alegações, que estavam em falta, não terem sido notificados da junção de um parecer jurídico apresentado pelas assistentes posteriormente à junção das respectivas contra-alegações e por não se ter conhecido "oficiosamente" da prescrição do procedimento criminal, que no seu entendimento já havia ocorrido.

        Por acórdão de 15 de Janeiro de 1998, o Supremo Tribunal de Justiça, concluindo pela inexistência das apontadas nulidades, indeferiu o requerido.

      2. - Inconformados, vieram os recorrentes interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º1 do art. 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC), em ordem à apreciação da constitucionalidade:

    14. Das normas dos artigos 118º, n.º1, 117º n.º1, alíneas c) e d), 119º n.º1, alínea b), e n.º2, e 120º, nº 1, alínea c), e n.º3, todos do Código Penal de 1982, na interpretação feita pelo acórdão de 15 de Janeiro de 1998, em violação do estatuído nos artigos 29º n.ºs 1 e 4, 32º, n.ºs 1 e 2, e 205º, n.ºs 1 e 2, da Constituição; e

    15. Da norma do artigo 212º do Código da Propriedade Industrial, na interpretação e aplicação dela feita pelo acórdão de 16 de Outubro de 1997, que entendem desconforme com o artigo 29º, n.º1, da Lei Fundamental.

      Alegaram ainda que só agora suscitaram a primeira questão de constitucionalidade "por anteriormente, sobre a questão, jamais haver sido proferida decisão expressa desfavorável aos recorrentes, nem tal ser previsível, segundo um critério de normalidade, e, por conseguinte, não ter havido oportunidade e, mais que isso, motivo para a arguir".

      Notificados, apresentaram os recorrentes as suas alegações, que concluíram nos seguintes termos:

      "1ª) Por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça [...], que confirmou in totum o acórdão do Tribunal da Relação do Porto [...], os ora recorrentes foram julgados autores materiais de:

    16. um crime de usurpação, previsto e punível nos termos dos artºs. 195, 1, e 197 do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos;

    17. um crime de concorrência desleal, previsto e punível pelos artºs. 212º, 1º, e 213º do Código da Propriedade Industrial.

      Os factos por que os réus, aqui recorrentes, foram condenados ocorreram, alegadamente, «entre 1 de Abril de 1986 e 23 de Dezembro do mesmo ano».

  2. ) O art.º 118º, 1 do Código Penal (de 1982) preceituava que «o prazo de prescrição para o procedimento criminal corre desde o dia em que o facto se consumou » mas, «nos crimes continuados (...), desde o dia da prática do último acto criminoso [n.º 2, b)].

  3. ) O prazo prescricional que se aplica ao crime de usurpação é de cinco anos (art.º 117º, 1, c), do Código Penal), pois a pena prevista para punir quem o praticar é a «de prisão até três anos e multa de cinquenta a cento e cinquenta dias» (art.º 195º, 1, e 197º do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos); e ao crime de concorrência desleal é de dois anos (artºs. 117, 1, d), do Código Penal), já que a pena...

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