Acórdão nº 449/03 de Tribunal Constitucional (Port, 10 de Outubro de 2003

Magistrado ResponsávelCons. Gil Galvão
Data da Resolução10 de Outubro de 2003
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 449/03 Proc. n.º 513/03 3ª Secção Relator: Cons. Gil Galvão

Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:

I ? Relatório

  1. A. (ora reclamante) intentou, no Tribunal de Trabalho de Cascais, contra B. (ora reclamada), providência cautelar de suspensão de despedimento, a qual foi julgada improcedente.

  2. Inconformada, apelou a ora recorrente para o Tribunal da Relação de Lisboa, tendo formulado as seguintes conclusões:

    ?1. O contrato de trabalho entre uma entidade patronal portuguesa e um trabalhador estrangeiro que se encontre em Portugal é válido, mesmo que o estrangeiro não disponha de autorização de residência ou de permanência.

  3. A entidade patronal está obrigada, nos termos do artº 4°, 1 da referida lei a "previamente à data do inicio da actividade pelo trabalhador estrangeiro, promover o depósito do contrato de trabalho na delegação ou subdelegação do IDICT .

  4. O incumprimento deste normativo não prejudica a validade do contrato de trabalho celebrado com trabalhador estrangeiro se, entretanto, a entidade empregadora aceitar que ele inicie a prestação laboral.

  5. Havendo uma normal e regular prestação da actividade laboral por um trabalhador contratado nestas condições, não pode pôr-se termo ao contrato de trabalho por despedimento, com fundamento [na] não prestação de informação favorável por parte do IDICT .

  6. O princípio da igualdade dos estrangeiros, consagrado no artº 15° da Constituição e o principio da não discriminação consagrado no artº 59º ,1 da mesma Lei fundamental, justificam que, nestes caso, atenta a protecção constitucional do emprego, se lance mão do dispositivo excepcional do artº 88° do DL n° 244/98, de 8 de Agosto.

  7. Conflituando uma disposição constitucional que garante a igualdade ao trabalhador estrangeiro em matéria de segurança no emprego com uma norma ordinária que exige como condição da prestação de trabalho um visto prévio de trabalho, deve prevalecer o respeito pelo normativo constitucional, abrindo-se mão do regime excepcional do referido artº 88° da Lei dos Estrangeiros, para assegurar a manutenção do vínculo laboral.

  8. A douta sentença recorrida ofendeu, assim, os artºs 15°,1 e 59º da Constituição.

  9. E ofendeu ainda o disposto no artºs 38° e 39° do CPT , na medida em que, não havendo processo disciplinar, sempre a providência haveria de ser decretada, tanto mais que expressamente se reconhece que houve um despedimento.

  10. Decisões como a recorrida são adequadas a favorecer a exploração dos trabalhadores estrangeiros, que a Lei n° 20/98 quis proteger.?

  11. O Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 4 de Junho de 2003, julgou o recurso improcedente, tendo afirmado, nomeadamente, o seguinte:

    ?[...]FUNDAMENTOS DE DIREITO

    [...] No caso em apreço, a Requerente/Agravante não demonstrou sequer a aparência do seu direito, porquanto sendo cidadã estrangeira, extra-comunitária, a validade da celebração do contrato de trabalho estava dependente, pelo menos, da autorização de permanência, nos termos do art. 55° n° 1 al. a) do DL 244/98 de 8.08, na alteração introduzida pelo Dec-lei 4/2001 de 10.01 (diploma que veio permitir a legalização de estrangeiros a trabalhar ilegalmente em Portugal), a qual não foi concedida à requerente por não preencher os requisitos exigidos pela Resolução do Conselho de Ministros de 30.11.2001, razão pela qual a requerida declarou a cessação imediata do seu contrato de trabalho.

    Com efeito, nos termos do art. 3° n° 3 da Lei 20/98 de 12.05 deve ser apenso ao contrato de trabalho de trabalhador estrangeiro o documento comprovativo do cumprimento das disposições relativas à entrada e à permanência ou residência do cidadão estrangeiro em Portugal. E nos termos do art. Art. 4º n° 1 do mesmo diploma deve a entidade empregadora, previamente à data do início do contrato, promover o depósito do contrato de trabalho na competente delegação do IDJCT .

    O Dec-Lei 244/98 de 8.08 (com as alterações do DL 4/2001 de 10.01 e Dec. Regulamentar n 5-N2000 de 26.04 na redacção dada pelo Dec-Reg. 9/200l de 31.05 esclarece que sempre que um cidadão estrangeiro pretenda trabalhar em Portugal deve estar munido de um dos seguintes documentos: visto de residência (art. 27º al. d), 34 e 43), visto de trabalho (art. 27° al. f), 36 e 43), autorização de residência (art. 80°) devendo o requerente estar munido de visto de residência válido, autorização de permanência emitida nos termos do art. 55°. Ora, a requerente não possuía nenhum desses documentos.

    Apesar disso, era-lhe possível à data da celebração do contrato de trabalho obter a autorização de permanência nos termos do art. 55° do DL 244/98, na redacção dada pelo Dec-Lei 4/2001, bastando a posse de proposta ou contrato de trabalho com informação favorável da IGT. E foi nesta perspectiva que foi celebrado o contrato de trabalho em causa. Acontece, porém, que a decisão do IDICT não foi favorável devido à Resolução do Conselho de Ministros de 30.11.2001 (fls. 42 dos autos).

    Não tendo a requerente obtido a autorização de permanência, era legalmente vedado à Requerida manter o contrato de trabalho com a requerente, sob pena de ficar ela própria sujeita às coimas e medidas acessórias previstas no art. 7º do DL 20/98 e art. 144º do Dec-Lei 244/98.

    Aliás, do próprio contrato - cls. 7ª - consta a obrigação da requerente manter válidos os seus documentos comprovativos das disposições legais relativas à entrada e à permanência, para efeitos de trabalho em Portugal. E na cls. 9ª n° 2 refere-se que a "a efectiva resolução deste contrato depende do deferimento do depósito do contrato por parte do IDICT".

    Destas cláusulas resulta que as partes previram a celebração do contrato com a condição resolutiva do não deferimento pelo IDICT da autorização de permanência indispensável ao depósito do contrato. Pelo que a decisão da Requerida de resolver o contrato tinha sido expressamente prevista pelas partes, além de estar de acordo com a lei. Assim, concorda-se com a decisão recorrida, quando, citando Antunes Varela, afirma que "a prestação torna-se impossível quando, por qualquer circunstância (legal, natural ou humana) o comportamento exigível do devedor se torna inviável" (Das Obrigações em Geral, 2° vol., 38 edição, pág.67)".

    E continua:

    "É nestes termos que deve ser interpretada a declaração da requerida, entidade patronal, consubstanciada na missiva aludida, que invoca, afinal, uma impossibilidade de receber o trabalho da requerente.

    Assim sendo, de tal missiva não pode concluir-se, com segurança, pela existência de um verdadeiro «despedimento», estando em causa, isso sim, apreciar da caducidade do contrato e não da sua cessação por despedimento, no caso sem precedência de processo disciplinar .

    E, não podendo concluir-se pela existência de um despedimento, não pode dar-se provimento à pretensão da Requerente. "

    Na verdade, a requerente não demonstrou, de forma suficiente, quer a existência da...

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