Acórdão nº 427/03 de Tribunal Constitucional (Port, 24 de Setembro de 2003

Magistrado ResponsávelCons. Maria dos Prazeres Beleza
Data da Resolução24 de Setembro de 2003
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 427/2003

Processo n.º 195/02

  1. Secção

    Relatora: Maria dos Prazeres Pizarro Beleza

    Acordam, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:

    1. Por sentença do Tribunal Judicial da Comarca de ------------- foi julgada parcialmente procedente a acção de condenação proposta por A., B. e C. contra a companhia de seguros D..

      A ré foi, então, condenada a pagar aos autores a quantia de Esc. 28.210.000$00, acrescida de juros à taxa legal desde a citação, a título de indemnização pelos danos, patrimoniais e não patrimoniais, decorrentes do atropelamento, ocorrido na E. N. n.º ---- e causado pelo veículo ligeiro de mercadorias com a matrícula --------------, segurado pela ré, do marido e pai dos autores, o qual veio a falecer em consequência do mesmo.

      Inconformadas, as partes recorreram para o Tribunal da Relação do Porto, Tribunal que, por acórdão de 3 de Abril de 2000, de fls. 735 e seguintes, atendeu parcialmente o recurso dos autores e negou a apelação interposta pela ré.

      Entendeu o Tribunal da Relação do Porto, que começou por observar que ?Cumpre dizer que apenas se questiona o montante dos danos patrimoniais sofridos pelos autores, mulher e filhos do peão sinistrado, decorrentes da perda de ganho deste?, que, uma vez que o n.º 3 do artigo 495º do Código Civil ?confere direito a indemnização às pessoas a quem o lesado directo prestava ou podia ser obrigado a prestar alimentos?, ?para que alguém tenha direito a uma indemnização pela morte do cônjuge ou de ascendente não é necessário que já esteja a receber da vítima uma prestação de alimentos, por carência efectiva de alimentos; basta que tenha a qualidade de que depende a possibilidade legal do exercício do direito a alimentos?.

      Considerou, então, terem tal direito, quer a mulher, quer os filhos do lesado ? artigo 2009º, n.º 1, als. a) e b); que o quantitativo da indemnização se aferia pelo prejuízo que ?para essas pessoas se mede pela sua [do lesado] falta e, portanto, há-de equivaler ao montante que aquele estaria obrigado a prestar. Daí que o valor da indemnização por danos patrimoniais dos que podiam exigir alimentos ao lesado não possa exceder a medida dos que este, lesado, teria de dar, se vivo fosse (...)?; e que havia ainda a ter em conta ?o postulado nos arts. 562º, 564º e 566º do C.C. pois que a indemnização tem por fim reconstituir a situação que existiria se não fosse o facto danoso e atender-se-á no seu cálculo não só aos prejuízos causados como aos benefícios perdidos em consequência da lesão, incluindo os danos futuros previsíveis?.

      Assim, e uma vez que ?para o cálculo dos danos patrimoniais devidos aos autores por força do estipulado no artº 495º, n.º 3 será conveniente, aliás como se fez na sentença recorrida, tomar por referência as tabelas financeiras usadas na determinação do capital necessário à formação de uma renda periódica correspondente à perda de ganho, de tal forma que no final do período a considerar o próprio capital se esgote?, o Tribunal da Relação do Porto condenou a ré a pagar aos autores, ?a título de indemnizações por perda de alimentos? (e porque havia sido atribuído ao lesado a percentagem de 30% na culpa pelo acidente) ?ao filho 11.316.666$00; à filha 11.316.666$00 e à viúva 16.916.666$00?.

    2. De novo inconformadas, as partes interpuseram recurso de revista.

      Por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de Junho de 2001, constante de fls. 832 e seguintes, foi decidido ?revogar o acórdão recorrido, na parte em que arbitrou à autora viúva uma indemnização a título de alimentos solicitados com base no disposto no artigo 495º, n.º 3, da Código Civil? e, ainda, ?revogar o acórdão recorrido na parte em que arbitrou aos AA. a indemnização por danos patrimoniais futuros resultantes do decesso do peão, a qual se fixa agora em 70.000.000$00, operando-se, porém, se necessário, a respectiva redução de harmonia com o valor da respectiva parcela do pedido?.

      Para o que agora releva, o Supremo Tribunal de Justiça pronunciou-se nos seguintes termos:

      11. Recurso da Ré D.

      Insurge-se a Ré seguradora contra o acórdão revidendo em duas vertentes distintas: por um lado, não concorda com o arbitramento de indemnização à viúva da vítima a título de alimentos já que, atenta a respectiva situação económica e sócio-familiar, a mesma não carecia , nem era previsível que viesse a carecer de tal "amparo"; por outro lado, considera exagerados os montantes indemnizatórios a esse mesmo título atribuídos aos filhos menores do lesado imediato (11.500.000$00 para cada um deles, depois reduzidos em função do grau de culpa do lesado), o qual deveria cifrar-se em apenas 9.100.000$00 a dividir em partes iguais para cobertura das respectivas necessidades até perfazerem 24 anos de idade.

      Que dizer ?

      Vem aqui à colação o estatuído no n° 3 do artº 495° do CCIV , nos termos do qual "têm igualmente direito a indemnização os que podiam exigir alimentos ao lesado" e no n° 2 do artº 564° do mesmo diploma, segundo o qual "na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação correspondente será remetida para decisão ulterior"

      Não vem controvertido o direito dos filhos a beneficiarem "jure proprio" da indemnização por danos futuros, a título alimentar, e por mor de tais dispositivos legais (apenas se propugna a fixação de um valor inferior), sendo que o que vem totalmente questionado é a atribuição "in concreto" de tal direito ao cônjuge supérstite, que não também da susceptibilidade abstracta desse mesmo benefício.

      Ora, não pode o tribunal prescindir do binómio possibilidade/necessidade e do critério da adequação e da proporcionalidade contemplados nos artº s 2003° e 2004º do CCIV, sendo pois de arredar a concessão de indemnização se se provar que o cônjuge sobrevivo, pelo seu desafogo económico, de todo em todo não necessita do dito "amparo".

      O cônjuge da vítima com rendimentos próprios terá pois sempre que alegar e provar que o respectivo quantitativo é insuficiente actualmente e/ou previsivelmente no futuro para prover às suas necessidades, por reporte aos parâmetros referenciais plasmados nos citados normativos.

      Neste domínio das indemnizações ou pensões alimentares, o julgador terá pois sempre de fazer um juízo de prognose prévia concreta, não só para impor ou não a prestação de alimentos como também para fixar o seu concreto cômputo, não podendo este basear-se em dados meramente conjecturais ou hipotéticos.

      Pois bem.

      Trata-se esse reconhecimento...

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