Acórdão nº 604/05 de Tribunal Constitucional (Port, 02 de Novembro de 2005
Magistrado Responsável | Cons. Vitor Gomes |
Data da Resolução | 02 de Novembro de 2005 |
Emissor | Tribunal Constitucional (Port |
ACÓRDÃO N.º 604/2005
Processo n.º 813/04
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Secção
Relator: Conselheiro Vítor Gomes
Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional,
1. A. impugnou judicialmente, no Tribunal Tributário de 1ª Instância do Porto, as liquidações de Contribuição Especial a que se refere o Regulamento da Contribuição Especial (RCE) anexo ao Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de Março, no montante total de 11.326.017$00, efectuadas pela Repartição de Finanças da Maia, relativamente a dois prédios para os quais requereu licença de construção em 1998 e cujo alvará obteve em 1999.
Por sentença de 15 de Julho de 2003, o juiz do 3.º Juízo do Tribunal Tributário de 1.ª Instância do Porto julgou inconstitucionais as normas conjugadas dos artigos 1.º, n.º 2, e 2.º do referido Regulamento, por violação da norma do artigo 103.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa (CRP), e, em consequência, decidiu anular a liquidação impugnada, desenvolvendo, para tanto, a seguinte fundamentação:
2.2. O direito aplicável.
A primeira questão que iremos apreciar e decidir é a de saber se ocorreu aplicação retroactiva do RCE anexo ao DL 43/98, de 3 de Março.
Vejamos.
Estabelece o artigo 1.º do RCE anexo ao Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de Março:
1 A contribuição especial incide sobre o aumento de valor dos prédios rústicos, resultante da possibilidade da sua utilização como terrenos para construção urbana, situados nas áreas das seguintes freguesias:
(...)
2 A contribuição especial incide ainda sobre o aumento de valor dos terrenos para construção e das áreas resultantes da demolição de prédios urbanos já existentes situados nas áreas referidas no número anterior.
No caso vertente está em causa o aumento de valor de um prédio rústico resultante da possibilidade da sua utilização como terreno para construção urbana.
Por sua vez, preceitua o artigo 2.° do mesmo RCE:
1 Constitui valor sujeito a contribuição a diferença entre o valor do prédio à data em que for requerido o licenciamento de construção ou de obra e o seu valor à data de 1 de Janeiro de 1994, corrigido por aplicação dos coeficientes de desvalorização da moeda constantes da portaria a que refere o artigo 43.° do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, correspondendo, para o efeito, à data de aquisição a data de 1 de Janeiro de 1994 e à de realização a data da emissão do alvará de licença de construção ou de obra.
A contribuição é devida pelos titulares do direito de construir em cujo nome seja emitido o alvará de licença de construção ou de obra cfr. artigo 3.° do RCE.
Como resulta das normas que acabámos de transcrever, a contribuição especial prevista no Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de Março, enquadra-se nas chamadas «contribuições de melhoria», que são aquelas em que é devida uma prestação, em virtude de uma vantagem económica particular resultante do exercício de uma actividade administrativa, por parte de todos aqueles que tal actividade indistintamente beneficia nestes termos, José Casalta Nabais, Direito Fiscal, pág. 40.
Tais contribuições especiais são considerados impostos cfr. artigo 4.°, n.º 3, da LGT.
Nos termos da própria lei, a contribuição especial criada pelo Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de Março, incide sobre a valorização dos terrenos ocorrida entre 1 de Janeiro de 1994 e a data do requerimento da respectiva licença de construção.
Ou seja, prevê-se nas normas conjugadas dos artigos 1.º, n.° 2, e 2.° do RCE, a tributação de um facto que ocorreu antes da entrada em vigor da lei que a determinou.
Trata-se, portanto, de normas fiscais retroactivas. Com efeito, uma norma é retroactiva quando ela se refere na sua previsão a factos ocorridos anteriormente à sua entrada em vigor, tenham tais factos o valor de factos tributários ou de factos impeditivos (cfr. Alberto Xavier, Manual de Direito Fiscal, I, págs. 196-197).
Ora, nos termos do preceito constitucional contido no artigo 103.°, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa, «ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não hajam sido criados nos termos da Constituição, que tenham natureza retroactiva ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei».
Também a norma do artigo 12.°, n.º 1, da Lei Geral Tributária reafirma, ao nível da legislação ordinária, esse princípio constitucional da proibição da retroactividade da lei fiscal:
As normas tributárias aplicam-se aos factos posteriores à sua entrada em vigor, não podendo ser criados quaisquer impostos retroactivos.
Donde, parece claro, padecem as normas fiscais referidas de inconstitucionalidade material, por violação do artigo 103.°, n.º 3, da CRP no mesmo sentido, José Casalta Nabais, obra citada, pág. 43, nota 30.
Tal inconstitucionalidade implica que essas normas não possam ser aplicadas e, consequentemente, conduz à...
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