Acórdão nº 420/05 de Tribunal Constitucional (Port, 04 de Agosto de 2005

Magistrado ResponsávelCons. Vitor Gomes
Data da Resolução04 de Agosto de 2005
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 420/05

Processo n.º 573/05

  1. Secção

Relator: Conselheiro Vítor Gomes

Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

1. O relator proferiu a seguinte decisão sumária:

“1. A., melhor identificado nos autos, interpôs recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 11 de Maio de 2005, que negou provimento ao recurso por si interposto do despacho do Juiz de Instrução Criminal, de 10 de Janeiro de 2005, que, no âmbito do reexame dos pressupostos da prisão preventiva nos termos do disposto no artigo 213.º do Código de Processo Penal, manteve aquela medida de coacção aplicada aquando do 1º interrogatório judicial, por despacho de 12 de Outubro de 2004, e confirmada pelo acórdão da Relação de 16 de Dezembro do mesmo ano.

O recurso é interposto com fundamento na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, pretendendo o recorrente a apreciação da inconstitucionalidade das seguintes normas:

1. - a norma do n.º 1 do art.º 213.º do Código de Processo Penal, interpretada como o foi no despacho judicial e no acórdão recorridos, ou seja, no sentido de que, para o reexame da subsistência dos pressupostos da prisão preventiva e para decidir da sua manutenção, bastará a transcrição do despacho que determinou a aplicação da medida coactiva e uma indicação genérica ao arguido de que “todos os fundamentos mantêm actualidade e, neste momento se encontra ainda mais fortalecida a prova entretanto carreada aos autos”, e de que “dos autos resultam inalterados os pressupostos de facto e de direito que determinaram a sujeição do arguido à medida de coacção de prisão preventiva, sem enunciar em concreto quais os novos meios de prova entretanto carreados para os autos nem os motivos por que resultariam inalterados os pressupostos;

2. - a norma do n.º 3 do art.º194.º do Código de Processo Penal, interpretada como o foi no despacho judicial e no acórdão recorridos, ou seja, no sentido segundo o qual a enunciação dos motivos de facto da decisão de aplicação da medida de prisão preventiva pode consistir apenas em formulações gerais e abstractas, sem concretização das circunstâncias de tempo, modo e lugar em que ocorreram os factos que integram a prática dos crimes imputados;

3. - a norma extraída da conjugação dos artºs. 193.º, n.ºs 1 e 2, e 213.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, interpretada e aplicada como o foi no despacho judicial e no acórdão recorridos, no sentido de que, ao reexaminar a subsistência dos pressupostos da prisão preventiva, não terá o juiz de analisar em concreto a adequação e proporcionalidade dessa medida coactiva às exigências cautelares que o caso em concreto requer e que nem terá também, em sede de reexame, de averiguar se todas as medidas, com excepção da prisão preventiva, se revelam concretamente inadequadas ou insuficientes;

4. - a norma extraída da conjugação dos artºs. 202.º, n.º 1, alínea a), e 213.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, interpretada como o foi no despacho judicial e no acórdão recorridos, no sentido de que, no despacho que decide manter a prisão preventiva, não têm que ser reexaminados em concreto os factos que porventura indiciam fortemente a prática de crime doloso punível com pena de prisão máxima superior a três anos, com suas circunstâncias de tempo, modo e lugar;

5. - a norma extraída das disposições conjugadas do art.ºs 204.º e 213.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, interpretada como o foi no despacho judicial e no acórdão recorridos, no sentido segundo o qual o reexame da subsistência dos pressupostos gerais de perigo, que permite decidir da manutenção da prisão preventiva, se bastaria com a mera transcrição dos requisitos legais tal como constam do art.º 204.º do CPP, sem curar de enunciar os factos ou indícios que preencheriam esses pressupostos.

Acrescenta o recorrente que tais interpretações violam o disposto nos artigos 28.º, n.ºs 1 e 2, e 32.º, da Constituição da República Portuguesa e que arguiu as questões de inconstitucionalidades na motivação e conclusões do recurso ordinário para o Tribunal da Relação de Lisboa, do despacho do juiz de instrução no Círculo Judicial do Funchal, proferido nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 213.º do Código de Processo Penal.

  1. Não obstante o recurso ter sido admitido, o que não vincula este Tribunal (cfr. artigo 76.º, n.º 3, da LTC), entende-se não poder conhecer-se do objecto do recurso, sendo de proferir decisão sumária, ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º-A, por não se verificarem os respectivos pressupostos de admissibilidade.

  2. Com efeito, a admissibilidade do recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade, interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei nº 28/82, exige a congregação de vários pressupostos, consistindo um deles na aplicação, pela decisão impugnada, como sua ratio decidendi, da norma cuja conformação constitucional se pretende apreciar, tomada seja no seu todo ou em determinado segmento, seja em dada interpretação.

    No concreto caso é desta última vertente que se trata.

    As “questões interpretativas” colocadas pelo recorrente radicam na ideia de falta ou insuficiência da fundamentação da decisão quando concluiu pela verificação dos pressupostos de facto e de direito que justificaram a manutenção da medida de coacção de prisão preventiva. A este respeito, questiona, em síntese, o recorrente o facto de a fundamentação ser feita por remissão para a decisão que inicialmente decretou a medida e para o despacho judicial que a manteve (sobre o qual incide o recurso), que são transcritos, sem que se proceda a um reexame em concreto da subsistência daqueles pressupostos, com o acréscimo de que os fundamentos então invocados mantém a actualidade e se encontra ainda mais fortalecida a prova entretanto carreada para os autos, sem se enunciar em concreto quais os novos meios de prova.

    A questão da falta ou insuficiência da fundamentação é desdobrada pelo recorrente pelas cinco “questões interpretativas” que coloca com referência às normas dos artigos 213.º, n.º 1, 194.º, n.º 3, 193.º, n.ºs 1 e 2, 202.º, n.º 1, alínea a), e 204.º do Código de Processo Penal. Mas, na prática, tudo gira à roda da falta de fundamentação do despacho que procedeu ao reexame dos pressupostos da prisão preventiva, que o recorrente entende ter violado as normas dos artigos 97.º, n.ºs 1 e 4, 374.º, n.º 2, 379.º, n.º 1, alínea a) e 213.º, estes do Código de Processo Penal, e ainda dos artigos 28.º, n.ºs 1 e 2, 32.º, n.º 1, e 205.º, n.º 1, da Constituição, e que o acórdão recorrido resolveu nos pontos III-A e B. E tanto assim é que o recorrente afirmou expressamente nas conclusões de recurso para a Relação que “o despacho aqui sob recurso, emitido ao abrigo do n.º 1 do artigo 213.º do CPP, carece em absoluto de fundamentação” (conclusão 8ª) e, antes de invocar algumas das “questões interpretativas”, que pretende agora ver apreciadas em sede de recurso de constitucionalidade, invoca a violação de preceitos da lei adjectiva penal [artigos 97.º, n.ºs 1 e 4, 374.º, n.º 2, e 379.º, n.º1, alínea a)], como sucede nas conclusões 11ª, 16ª e 27ª, não invocando, porém a inconstitucionalidade da interpretação e aplicação destes preceitos.

    É certo que o recorrente, além das normas dos artigos 213., n.º 1, 193.º, n.ºs 1 e 2, 202.º, n.º1, alínea a), e 204.º, do Código de Processo Penal, questiona também a constitucionalidade da norma do artigo 194.º, n.º 3, que acolhe a regra de fundamentação dos despachos que decretam medidas de coação e de garantia patrimonial, mas, em qualquer dos casos o acórdão não aplicou qualquer das normas impugnadas com o sentido que lhes é atribuído.

    Vejamos:

  3. O acórdão recorrido, na sua parte decisória que interessa considerar, é do seguinte teor:

    III - Colhidos os vistos, cumpre decidir.

    A) O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente (como é jurisprudência pacífica dos nossos tribunais superiores), sendo, porém, certo que a questão fulcral no presente recurso é a do reexame dos pressupostos da prisão preventiva, nos termos e para efeitos do art.º 213° do CPP.

    Acresce que o recorrente argui a nulidade do despacho ora recorrido, por alegada falta de fundamentação, com o que, no seu entender, teriam sido violadas as normas constantes dos art.ºs 97°, n.ºs 1 e 4, 374° n° 2, 379° n° 1 al. a), e 213°, estes do CPP, e ainda os art.ºs 28°, n.ºs 1 e 2, 32°, n° 1, e 205° n° 1, da CRP.

    Finalmente, observa-se que, face ao já relatado, não cabe, aqui e agora, debruçarmo-nos sobre questões já anteriormente suscitadas e que já se mostram decididas, nestes autos, mormente pelos supracitados Acórdãos da Rel. de Lisboa, de 16/12/04 (Proc. n° 9715/04-9ª) e de 3/02/05 (Proc. n° 1057/05-9ª).

    Serve isto para afastar, expressamente, as questões subjacentes às conclusões 5ª a 7ª do recorrente, sobre as quais esta Relação de Lisboa já se debruçou e decidiu: nomeadamente, no que respeita à alegada falta de notificação, com cópia, do despacho de 12/10/04 (que determinou a prisão preventiva do recorrente); e quanto à alegada nulidade desse despacho de 12/10/04.

    B) Da arguida nulidade do despacho recorrido.

    1. O teor do despacho do Mmo JIC de 10/01/05 é o seguinte:

    Dado que ao arguido A. lhe foi aplicada a medida de coacção prisão preventiva em 1° interrogatório judicial de fls. 280 e seguintes, iniciado em 11 de Outubro de 2004 e terminado com a notificação do despacho proferido, pelas 24.15 horas de 12 de Outubro de 2004, há que proceder oficiosamente ao reexame de subsistência dos pressupostos daquela medida, decidindo se é de manter ou se deve ser substituída ou revogada, nos termos do n.º 1, do artigo 213°, do Código de Processo Penal.

    *

    O Ministério Público a fls. 1120 a 1121 (cujos termos dou aqui por integralmente reproduzidos) promove se mantenha tal medida de coacção.

    *

    O arguido A. veio a fls. 1077 requerer a sua audição por entender que a decisão ora a proferir...

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