Acórdão nº 632/06 de Tribunal Constitucional (Port, 16 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelCons. Fernanda Palma
Data da Resolução16 de Novembro de 2006
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 632/2006

Processo nº 509/2006

  1. Secção

    Relatora: Conselheira Maria Fernanda Palma

    Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional

    I

    Relatório

    1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, em que figura como recorrente o Ministério Público e como recorrido A., o Tribunal da Relação de Coimbra proferiu o seguinte acórdão, com data de 21 de Março de 2006:

    I)- A COMPANHIA DE SEGUROS B., S.A. instaurou, no Tribunal Judicial de Pombal, no dia 09.09.2003, acção declarativa, sob a forma de processo sumário, contra A., com vista a exercer o direito de regresso contra o Réu, pedindo a condenação deste ao pagamento da quantia de € 12.557,62, acrescida de juros de mora, à taxa legal, a contar da citação.

    Alegou, em resumo, ser o Réu o único culpado num acidente de viação, quando conduzia um veículo automóvel sob a influência do álcool, estado este causador do acidente. Por virtude do contrato de seguro, a Autora estava vinculada a indemnizar terceiros em que interviesse o veículo conduzido pelo Réu, tendo já satisfeito as indemnizações devidas.

    Foi expedida carta registada com A/R para citação do Réu, tendo em conta a morada indicada na petição inicial, carta essa devolvida com as indicações de “não atendeu” e “não reclamada”.

    Frustrada a citação por via postal, a secretaria solicitou informação sobre a residência do Réu, junto das bases de dados dos serviços de identificação civil, da segurança social, da Direcção Geral de Viação e da Direcção Geral dos Impostos.

    Obtida tal informação, e não coincidindo a residência indicada na petição com as várias residências constantes da base de dados daqueles serviços, foi expedida carta simples para cada um desses locais, tendo os distribuidores depositado, no dia 01.06.2004, as cartas nas caixas postais indicadas nas bases de dados daqueles serviços e indicado, nas declarações remetidas ao Tribunal, o depósito naquele dia.

    No dia 13.10.2004, o Réu contestou e arguiu a falta de citação, dizendo que não reside na morada indicada na petição, e desde Dezembro de 2001 que reside no Bairro …, em Várzea, Marinha Grande, e só no dia 29 de Setembro de 2004 tomou conhecimento da carta para citação.

    Foi proferido despacho a julgar válida a citação por depósito da carta na caixa do correio do Réu, por via postal simples, remetida que foi a carta para uma das caixas postais que correspondia à residência indicada pelo Réu, ou seja, o Bairro Gustavo de Carvalho, n.º8, Várzea, Marinha Grande. Foi, ainda, julgada extemporânea a contestação, ordenando-se o seu desentranhamento e dos demais articulados posteriores apresentados pela Autora e Réu. De seguida, e como efeito da revelia do Réu, foi proferida sentença condenatória.

    Irresignado com a sentença, apelou o Réu, pugnando pela sua revogação, e rematando a sua alegação com as seguintes conclusões:

  2. -O art. 238º do CPC, na redacção dada pelo DL n.º 183/2000, de 10/08, é materialmente inconstitucional e ilegal, por violação dos arts. 13º, 20º e 2º da Constituição da República Portuguesa e viola o art. 10º da Declaração Universal dos Direitos do Homem - que garantem o direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva, na vertente do direito de defesa em processo e direito ao contraditório, e um desrespeito do princípio da igualdades (processual), plasmado de forma genérica no art. 13º, ambos com expressão mais ampla no art. 2º da Lei Fundamental e o direito em plena igualdade, a que a sua causa seja equitativa e publicamente julgada, nos termos do art. 10º da DUDH;

  3. -O art. 238º do CPC, na redacção dada pelo DL n.º 183/2000, de 10/08, é também organicamente inconstitucional, por violação dos arts. 168º, n.º1, alínea b) da CRP, que estabelece que é da competência exclusiva da Assembleia da República legislar sobre direitos, liberdades e garantias (logo, também sobre direitos a estes análogos), só podendo o Governo legislar sobre tal matéria com precedência de autorização legislativa conferida pela AR- arts. 168º, n.º1, alínea b) e 201º, n.º1, alínea b) da CRP- mediante invocação expressa da respectiva lei de autorização legislativa art. 201º, n.º3 da CRP;

  4. - Face à inconstitucionalidade do referido art. 238º do CPC, na redacção dada pelo DL n.º 183/2000, de 10/08, a pretensa citação postal simples do ora Apelante, ao abrigo desse regime, deve considerar-se nula, ilegal, ineficaz e inexistente, não podendo ser-lhe oposta (nem podendo, naturalmente, funcionar a presunção da sua citação na data em que foi depositada em caixa de correio a respectiva nota de citação);

  5. - A citação só deve considerar-se validamente efectuada com a intervenção processual do Apelante e sanação, por esta forma, da falta da sua válida citação anterior, devendo, por isso, considerar-se válida e tempestiva a contestação e tréplica dirigidas ao Tribunal a quo e ser repetido todo o processado subsequente.

    A Autora contra-alegou em defesa do julgado.

    Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

    II- Sendo o objecto do recurso delimitado, em princípio, pelas conclusões da alegação (arts. 690º, n.º e 684º, n.º3 e 660º, n.º2, todos do CPC), a única questão decidenda consiste em saber se o art. 238º do CPC, na redacção introduzida pelo DL n.º 183/2000, de 10/08, está ferido de inconstitucionalidade material e orgânica.

    Vejamos.

    O art. 1º do DL n.º 183/2000, de 10 de Agosto, deu a seguinte redacção ao art. 238º do CPC:

    “1- No caso de se frustrar a citação por via postal, a secretaria obterá informação sobre a residência, local de trabalho ou, tratando-se de pessoa colectiva ou sociedade, sobre a sede ou local onde funciona normalmente a administração do citando, nas bases de dados dos serviços de identificação civil, da segurança social, da Direcção-Geral dos Impostos e da Direcção-Geral de Viação.

    2- Se a residência, local de trabalho, sede ou local onde funciona normalmente a administração do citando, para o qual se...

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