Acórdão nº 40/06 de Tribunal Constitucional (Port, 11 de Janeiro de 2006

Magistrado ResponsávelCons. Pamplona Oliveira
Data da Resolução11 de Janeiro de 2006
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 40/06

Processo n.º 629/05

  1. Secção

    Relator: Conselheiro Pamplona de Oliveira

    ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL

    A fls. 307 dos presentes autos foi proferida a seguinte decisão sumária:

    1. foi condenada no Tribunal Judicial da Figueira da Foz, pela prática de um crime de emissão de cheque sem provisão, na pena de 180 dias de multa, à taxa de 4€ e ao pagamento ao ofendido do montante de 965€, acrescido de juros de mora. Inconformada, interpôs recurso para a Relação de Coimbra que, por acórdão proferido em 13 de Abril de 2005, confirmou aquela sentença.

    A recorrente recorre para este Tribunal do acórdão da Relação de Coimbra, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei 28/82, de 15 de Novembro (LTC), invocando:

    A arguida pretende que seja declarada a inconstitucionalidade da interpretação feita na sentença de primeira instância e mantida em sede de recurso da norma constante do artigo 11º n.º1 e 3 da Lei do Cheque na interpretação de que é a arguida quem tem de provar que o ofendido não teve prejuízo patrimonial com o não pagamento do cheque. Esta questão de inconstitucionalidade foi suscitada, pela arguida, em alegações de recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra e em arguição de nulidade do Acórdão.

    A arguida pretende que seja declarada a inconstitucionalidade da interpretação feita do artigo 374º n.º 2 do Cód. Processo Penal de que inexiste a obrigação de se pronunciar sobre todas as questões suscitadas pelos sujeitos processuais, interpretação esta que não é expressa mas que se retira do Acórdão por falta de resposta às questões concretas suscitada no decurso do processo em alegações de recurso. Além disso, essa interpretação viola o princípio do acusatório e o dever de fundamentação decisões, Sentenças ou Acórdãos, dos Tribunais, violando os artigos 32.º n.º 21, 5 e 205.º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa. Esta questão foi suscitada em arguição da nulidade do Acórdão do Tribunal da Relação. Não houve resposta quanto à questão do prejuízo patrimonial supra enunciada, bem como ao princípio do in dubio pro reo, que tinha sido suscitada em alegações de recurso.

    Quanto à questão da não reapreciação da prova, suscitada em arguição da nulidade do Acórdão, a interpretação feita do artigo 127.º do Cód. Proc. Penal de que o Tribunal da Relação só verifica a regularidade do julgamento, é inconstitucional viola o artigo 32.º n.º 5 da CRP e o princípio do acusatório na medida em que impede que o critério fornecido pela arguida para aquilatar da correcta apreciação da prova seja apreciado sem uma resposta concreta e bem assim viola o dever de fundamentação das sentenças e acórdãos imposto pelos artigos 32.º n.º 1 e 205.º n.º 1 da CRP:

    As normas constitucionais que foram violadas foram as dos artigos: 3.º n.º3, 32.º n.º 1, 2, 5, 204.º, 205.º n.º1 todos da Constituição da República Portuguesa, tendo sido, no Acórdão recorrido, violados os princípios da constitucionalidade, o princípio do in dubio pro reo, o princípio do acusatório.

    O recurso foi admitido por decisão que não vincula este Tribunal (n. 3 do artigo 76º da LTC).

    O recurso de fiscalização concreta em causa incide obrigatoriamente sobre normas jurídicas aplicadas na decisão recorrida como seu fundamento, cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo de modo processualmente adequado (alínea b) do n. 1 do artigo 70º, e n. 2 do artigo 72º da LTC).

    A inconstitucionalidade imputada a uma interpretação normativa reporta-se, necessariamente, a um critério normativo dotado de generalidade que possa ser aplicado a outros casos, e não à aplicação de uma norma à especificidade do caso e a ele indissociavelmente ligado.

    Sucede, porém, que no recurso em análise o recorrente não visa obter a apreciação da conformidade constitucional de normas, pois questiona, manifestamente, a conformidade constitucional da decisão jurisdicional. Para além disso, as formulações normativas que questiona não foram aplicadas na decisão recorrida.

    No que respeita à primeira questão suscitada pela recorrente, ela só aparentemente é uma questão de inconstitucionalidade normativa. Como resulta da leitura das alegações apresentadas perante a Relação de Coimbra, ao suscitar tal questão a recorrente mais não pretende do que expressar a sua discordância relativamente à subsunção a que o tribunal recorrido procedeu, uma vez que se contesta que perante os factos dados como provados, o tribunal recorrido possa concluir que a recorrente havia cometido determinado crime; é esta subsunção ou qualificação que a recorrente questiona.

    Pretende-se, portanto, que o Tribunal Constitucional se pronuncie sobre a conformidade constitucional da decisão que julgou preenchidos os elementos definidores de um certo crime, embora sob a aparência de pretender questionar a norma constante do artigo 11 n.º 1 e 3 da Lei do Cheque. Ora, conforme o Tribunal Constitucional tem afirmado repetidamente, o controlo de constitucionalidade que, nos recursos das decisões dos outros tribunais, lhe é atribuído, só pode ter por objecto as normas jurídicas (ou a sua interpretação) que tais decisões tenham aplicado. O modo como as decisões judiciais operam a subsunção dos factos à norma não pode ser objecto de tal controlo. E ainda que efectivamente o Tribunal recorrido tivesse aplicado a norma

    Conclui-se, em suma, que o Tribunal não pode tomar conhecimento, nesta parte, do objecto do recurso.

    Relativamente à segunda questão de constitucionalidade colocada, independentemente de se saber se tal questão foi suscitada durante o processo e de modo processualmente adequado, o certo é que o Tribunal também não pode dela conhecer, uma vez que, mais uma vez, a matéria não representa uma verdadeira questão de constitucionalidade normativa. Na verdade, afirma a recorrente, relativamente a tal questão, na peça em que é arguida a nulidade do acórdão do Tribunal da Relação:

    "[...]

    1. assim, a interpretação que se faz do artigo 374º n.º 2 do Cód. Proc. Penal de que inexiste a obrigação de se pronunciar sobre todas as questões suscitadas pelos sujeitos processuais, interpretação esta que não é expressa mas que se retira da falta de resposta à questão concreta suscitada no decurso do processo em alegações de recurso, é inconstitucional por violar o princípio do acusatório e o dever de fundamentação das decisões, sentenças ou Acórdãos, dos Tribunais, artigos 32º n.º 5 e 205º n.º 1 e 32º n.º 1, respectivamente, todos da Constituição da República Portuguesa.

      Se a arguida suscitou a questão do prejuízo patrimonial e se forneceu o critério de resolução do problema, o mínimo que esperava é que lhe fosse explicado o porquê do critério que forneceu estar certo ou errado. Em vez disso, nada a esse respeito se diz. Por isso, o Acórdão cuja nulidade se argui pelo presente meio, padece de fundamentação, artigos 205º n.º 1, 32º n.º 1 da CRP e viola o disposto no artigo 374º n.º 2 constituindo nulidade do Acórdão e viola o princípio do acusatório que existe ao longo de todo o processo, artigo...

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