Acórdão nº 1977/01-1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 25 de Outubro de 2007

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução25 de Outubro de 2007
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES: Da decisão proferida no processo de acção ordinária n.º 7806/06.5TBBRG/Vara de Competência Mista do T.J. da comarca de Braga, que declarou a incompetência internacional do Tribunal Judicial da comarca de Braga e, em consequência, absolveu da instância a ré “JOHN D..., S.A.”, com sede em Getafe (Madrid), Carretera de T..., km. 12, 200 28905 - Getafe (Madrid), dela recorreu a autora “T- STB, L.da”, com sede no Lugar de F,,, freguesia de P..., Braga, que alegou e concluiu do modo seguinte: 1.

O presente agravo é interposto da douta sentença proferida, pela qual o Tribunal a quo considera procedente a excepção de incompetência arguida pela Ré, determinando-se em consequência a sua absolvição da instância; 2.

O aresto fundou-se na circunstância de vigorar no direito português desde 01/03/2002, o Regulamento (CE n.º 44/2001, do Conselho de 22/12/2000, que derrogaria o disposto nos artigos 99°, n.º 3, alíneas a) e c) do Código de Processo Civil, o estabelecido no artigo 19°, alínea g) do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro e igualmente o artigo 38° do DL n.º 177/86, de 25/10, uma vez que o regime estabelecido neste diploma, designadamente o seu artigo 23.º sobrepor-se-ia às normas internas de competência internacional.

  1. Ora, Agravante entende que o Tribunal fez uma errada interpretação da lei e das disposições legais que invocou, tendo ainda negligenciado princípios gerais de direito e disposições relativas à aplicação da lei no tempo; 4.

    Na realidade, a validade substancial dos pactos atributivos de competência tem de ser aferida à luz da lei que estava em vigor quando tais pactos foram firmados e não à luz da nova lei sobrevinda; 5.

    O Regulamento (CE) n.º 44/2001, de 22 de Dezembro de 2000, relativo à competência judiciária é directamente aplicável a todos os Estados membros, em conformidade com o Tratado que instituiu a Comunidade Europeia e prevalece sobre as normas reguladoras da competência internacional previstas no nosso código de processo civil; 6.

    Contudo, a validade do pacto atributivo de jurisdição constante da Cláusula VIII, ponto n.º 9 do contrato de concessão comercial terá que ser aferida tendo em conta a legislação em vigor à data em que tal contrato de concessão foi celebrado e não à luz de legislação que entrou em vigor em data posterior, como é o caso do Regulamento (CE) n.º 44/2001, do Conselho.

  2. É que a aplicação do Regulamento n.º 44/2001 a um pacto de competência anterior à sua entrada em vigor redundaria em violação do princípio da irretroactividade consagrado, em matéria de aplicação da lei no tempo, no n.º 1 do artigo 12° do Código Civil e reafirmado e desenvolvido na 1 a parte do n.º 2 do mesmo preceito.

  3. A regra de conflitos que se extrai deste artigo 12°, n.º 2, 1.ª parte, do Código Civil, é a de que a Lei Nova sobre o regime dos contratos não se aplica aos contratos anteriores, sendo a lei de origem ou lex contractus que regula todos os efeitos dos contratos, quer os efeitos directos, quer os chamados efeitos indirectos.

  4. O Regulamento (CE) n.º 44/2001, ao considerar bastante que o pacto atributivo de jurisdição deva ser celebrado por escrito ou verbalmente com confirmação escrita, sendo menos exigente do que as regras de competência internacional dos tribunais internos, designadamente as que estão previstas no artigo 99°, n.º 3, alíneas a) e c) do Código de Processo Civil, está a incidir sobre a própria validade (e não apenas sobre os efeitos) dos pactos de competência.

  5. É que a celebração de convenções sobre a competência (quer de pactos de jurisdição, quer de pactos de competência, quer de convenções de arbitragem) está genericamente sujeita às mesmas regras de formação (atinentes à declaração de vontade e aspectos conexos) e aos mesmos requisitos de validade de qualquer contrato substantivo.

  6. O estatuto do contrato é determinado em face da lei vigente ao tempo da conclusão do mesmo contrato; 12.

    Assim, não pode dizer-se como se faz erradamente a nosso ver na douta sentença recorrida, que o pacto atributivo de competência inserto no contrato de concessão datado de 1 de Janeiro de 2002 é válido à luz do Regulamento Comunitário n.º 44/2001 uma vez que este que só entrou em vigor em 01/03/2002, apesar de se aplicar às acções que entraram em tribunal após esta data, como é o caso da presente.

  7. A validade do pacto atributivo de competência inserido no contrato de concessão comercial terá que ser aferida tendo por base a legislação em vigor à data da sua celebração, ou seja, terá que ter em conta o artigo 99°, n.º 3, alíneas a) e c) do Código de Processo Civil, o artigo 19°, alínea g) do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro e igualmente o disposto no artigo 38° do DL n.º 177/86, de 25 de Outubro.

  8. A estipulação da jurisdição dos Juízos do Tribunal de Madrid como competente para apreciar os litígios relativos à interpretação e cumprimento do presente contrato de concessão comercial não é justificada por um interesse sério da Ré.

  9. A concessão desenvolveu-se exclusivamente em território nacional, tendo a concessionária a sua sede, stand de vendas e oficina em território português, mais concretamente no concelho de Braga. Ou seja, o contrato de concessão foi sempre totalmente executado em território português.

  10. Não existe um interesse sério de nenhuma das partes em atribuir a competência aos Tribunais espanhóis, o que existe de facto é um capricho da agravada que impõe o exercício do seu poder dominante na relação jurídica que mantinha com a agravante, impondo que esta se quisesse demandá-la teria que se deslocar a Espanha, já supondo que tal exigência acarretaria, muito provavelmente, a impossibilidade de exercício dos seus direitos.

  11. Refira-se, ainda, que, nos termos do disposto do artigo 38°, do DL n.º 178/86, de 3 de Julho, que instituiu o regime jurídico do contrato de agência "Aos contratos regulados por este diploma que se desenvolvam exclusiva ou preponderantemente em território nacional só será aplicável legislação diversa da portuguesa, no que respeita ao regime da cessão, se a mesma se revelar mais vantajosa para o agente".

  12. Uma correcta interpretação do referido artigo levará à conclusão de que esta norma também releva no plano da competência internacional e não apenas ao nível do direito dos conflitos, na medida em que do mesmo parece resultar haver que provar que a jurisdição estrangeira, apurada nos termos gerais, irá aplicar um direito que obedece àquele requisito, isto é, ser mais vantajoso para o agente. Logo, não sendo feita essa prova - como aconteceu no caso dos autos - serão competentes os tribunais portugueses.

  13. No caso dos autos, nem sequer vem alegado que a jurisdição espanhola fosse aplicar uma legislação mais vantajosa para a Agravante o que, também por esta via implica a competência dos tribunais portugueses.

  14. O ajuizado contrato de concessão constituiu um contrato de adesão, uma vez que não teve oportunidade de discutir qualquer das cláusulas que o mesmo continha, limitando-se a preencher os espaços em branco do documento já previamente preparado para o efeito pela Agravada, cujo texto foi igual para a Autora como para qualquer outro concessionário John Deere localizado em Portugal ou em Espanha.

  15. Deste modo, sempre haveria que verificar a validade do pacto atributivo de competência à luz das regras especiais das cláusulas contratuais gerais, designadamente do artigo 19° do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, na qual se estabelece são proibidas as cláusulas que estabeleçam um foro competente que envolva graves inconvenientes para uma das partes, sem que os interesses da outra o justifiquem.

  16. Ora, tratando-se esta disposição contida no regime das cláusulas contratuais gerais, uma verdadeira condição de validade substancial do pacto atributivo de competência em vigor ao tempo da outorga do contrato de concessão, é recorrendo a esta cláusula que irá ser analisado tal pacto e não recorrendo ao Regulamento Comunitário que entrou em vigor posteriormente à outorga de tal pacto inserido no contrato de concessão comercial outorgado em 1 de Janeiro de 2002.

  17. Conforme resulta da cláusula VIII, ponto 9, do contrato de concessão celebrado em 1 de Janeiro de 2002, foi estipulado pelas partes o seguinte:"A interpretação e o cumprimento do presente contrato, com sujeição ao convencionado na cláusula anterior sobre o direito aplicável, ficam submetidas à jurisdição, com exclusão de quaisquer outros, dos Juízos do Tribunal de Madrid”.

  18. A competência do Tribunal determina-se pelo pedido da autora, sendo ponto a resolver de acordo com a identidade das partes e com os termos da pretensão daquela, compreendidos aí os respectivos fundamentos.

  19. Resulta do pedido que a Autora, aqui agravante, peticionou, por um lado, uma indemnização pelos danos causados pelo insuficiente pré-aviso concedido pela Ré aquando da denúncia do contrato de concessão comercial. E, por outro lado, uma indemnização de clientela, que mais não é do que uma compensação devida ao concessionário, após a cessação do contrato, pelos benefícios de que...

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