Acórdão nº 07S2368 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Outubro de 2007
Magistrado Responsável | PINTO HESPANHOL |
Data da Resolução | 10 de Outubro de 2007 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.
Em 22 de Julho de 2005, no Tribunal do Trabalho de Águeda, AA intentou acção, com processo especial, emergente de acidente de trabalho, contra COMPANHIA DE SEGUROS Empresa-A, na qual pede que a ré seja condenada a pagar-lhe: a) a quantia de 5.804,79 euros, a título de indemnização por incapacidade temporária, relativa ao período de 21/9/2003 a 1/7/2004; b) o montante de 693,05 euros, referente a consultas, despesas médicas e medicamentosas, tratamentos de fisioterapia e viagens que efectuou para cura das lesões sofridas; c) a pensão anual e vitalícia, obrigatoriamente remível, de montante a determinar conforme resultado do exame por junta médica; d) a quantia de 3.123,82 euros, relativa a subsídio por elevada incapacidade permanente, nos termos do artigo 23.º da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro; e) juros de mora à taxa legal, nos termos do artigo 135.º do Código de Processo do Trabalho.
Alegou que, no dia 20 de Setembro de 2003, quando exercia a actividade de pedreiro, por conta própria, na reconstrução de uma casa de habitação, encontrando-se numa pequena plataforma instalada no telhado, a 7 metros de altura, caiu ao solo, sofrendo vários traumatismos que lhe provocaram incapacidade temporária absoluta para o trabalho de 20 de Setembro de 2003 até 1 de Julho de 2004 e incapacidade permanente parcial de 10%, estando a responsabilidade pela reparação do acidente transferida para a mencionada seguradora.
A seguradora contestou, sustentando que o acidente de trabalho se ficou a dever à violação de regras de segurança por parte do sinistrado, que tinha a obrigação de verificar as condições de segurança antes de começar os trabalhos e devia ter tomado medidas de protecção colectiva adequadas ou, na impossibilidade destas, de protecção individual, tendo agido de forma temerária e com negligência grosseira.
Requereu também exame por junta médica, por discordar da incapacidade atribuída pelo perito médico do tribunal.
Foi proferido despacho saneador, desdobrando-se o processo para realização de exame por junta médica - no respectivo apenso foi decidido fixar ao sinistrado a IPP de 14,5%, desde 2 de Julho de 2004, dia imediato ao da alta -, com selecção da matéria de facto pertinente e, após o julgamento, exarou-se sentença que julgou a acção improcedente, absolvendo a ré do pedido formulado pelo autor, bem como do pedido de reembolso deduzido pelo Centro Distrital de Segurança Social de Aveiro.
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Inconformado, o autor interpôs recurso de apelação, que a Relação julgou procedente, tendo revogado a sentença recorrida e condenado a ré «no pagamento ao autor da quantia de € 5.185,04, a título de indemnização por ITA, bem como da pensão anual de € 946,36, a qual é obrigatoriamente remível, tudo acrescido de juros de mora à taxa legal desde 1-7-2004 (data da tentativa de conciliação na fase conciliatória dos autos) até integral pagamento».
É contra esta decisão da Relação que a ré seguradora se insurge, mediante recurso de revista, ao abrigo das seguintes conclusões: «1. Considerando os factos carreados para os autos e dados como provados, dúvidas não restam que, ao exercer as suas funções a 7 metros de altura sem utilizar qualquer equipamento de protecção, o Recorrido violou, de forma grave, as mais elementares regras de segurança no trabalho, dando origem ao acidente dos autos que, com a utilização daqueles equipamentos, teria sido evitado; 2. Efectivamente, da matéria provada resulta que o Recorrido violou negligentemente não só os arts. 44.º e 155.º do RSTCC, invocado[s] na sentença em crise, mas [também] o disposto [no] n.º 2 do art. 8.º do D.L n.º 441/91, de 14/11, no art. 11.º da Portaria n.º 101/96, de 3 de Abril, e no art. 4.º do D.L n.º 348/93, de 1 de Outubro; 3. Do cotejo dos preceitos legais supra invocados, resulta que o Recorrido tinha obrigação de utilizar os equipamentos de protecção colectiva e/ou individual, sempre que estes dispositivos fossem necessários para garantir a sua própria segurança, sob pena de, não o fazendo, ser responsável pelos acidentes que, em virtude do seu não uso, ocorram; 4. Mesmo que o local de onde o Recorrido caiu não se considerasse um "telhado", para efeitos de aplicação do disposto no art. 44.º do RSTCC - o que apenas por hipótese se concede - ainda assim seria evidente que o cinto de segurança era obrigatório e que o Recorrido, ao não utilizá-lo, violou, sem causa justificativa, as regras de segurança no trabalho; 5. Aliás, é da experiência comum da vida e do bom senso que, existindo o perigo de queda em altura, é necessária a utilização de cinto de segurança ou existência de qualquer outro dispositivo de segurança que proteja o trabalhador de uma eventual queda; 6. As circunstâncias em que ocorreu o acidente dos autos (cfr. pontos 2, 3, 21 a 25), designadamente o facto de o Recorrido exercer as suas tarefas a 7 metros de altura e sem qualquer protecção, permitem concluir que a sua atitude foi ostensivamente indesculpável, reprovada por um elementar sentido de prudência, e constituiu a única causa do acidente descrito nos autos; 7. Ficou, pois, mais do que demonstrado que o Recorrido violou as regras de segurança e que agiu de forma temerária e com negligência grosseira, que a conduta do Recorrido foi a única causa do acidente dos autos, tal como ficou demonstrado o nexo de causalidade entre a conduta do sinistrado e o acidente e lesões sofridas, pelo que não podia deixar de estar, nos termos do disposto no art. 7.º da LAT e art. 4.º das Condições Gerais da Apólice, excluído o direito à reparação; 8. Ao decidir como decidiu, o Tribunal da Relação violou, entre outros, o disposto no art. 7.º da LAT e nos arts. 44.º e 155.º do RSTCC, art. 8.º do D.L. n.º 441/91, de 14/11, no art. 11.º da Portaria n.º 101/96, de 3 de Abril, e no art. 4.º do D.L. n.º 348/93, de 1 de Outubro.» O autor contra-alegou, defendendo a confirmação do julgado.
Neste Supremo Tribunal, a Ex.ma Procuradora-Geral-Adjunta concluiu que a revista deve ser negada, parecer que, notificado às partes, não suscitou resposta.
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O objecto do recurso reconduz-se a saber se o acidente resultou da falta de observância de regras sobre segurança no trabalho por parte do autor e se este agiu com negligência grosseira, ou seja, se não há lugar ao direito à reparação, nos termos das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro.
Corridos os vistos, cumpre decidir.
II 1.
O tribunal recorrido deu como provada a seguinte matéria de facto: 1) O autor, no dia 20 de Setembro de 2003, pelas 14H30, quando procedia às obras de restauração de uma casa de habitação sita em ..., Anadia, pertencente a BB, foi vítima de acidente de trabalho; 2) Naquele dia e hora, o autor encontrava-se no telhado da referida casa de habitação a trabalhar com uma pequena grua fixa ao telhado, a içar os materiais do solo para o 1.º andar; 3) A queda do autor foi, assim, do telhado para o solo, duma altura de cerca de 7 metros; 4) O acidente ocorreu na casa de habitação de BB, em ..., Anadia, quando o autor exercia a actividade de pedreiro na reconstrução da referida casa de habitação; 5) O autor caiu do telhado para o solo e, por causa disso, sofreu traumatismo do dorso lombar, da bacia e das pernas e feridas inciso-contusas no couro cabeludo e na face; 6) Em consequência do acidente...
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