Acórdão nº 3635/2007-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 12 de Julho de 2007

Magistrado ResponsávelFÁTIMA GALANTE
Data da Resolução12 de Julho de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

ACORDAM NA 6ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I- RELATÓRIO D, S.A.

intentou acção declarativa de condenação sob a forma de processo ordinário contra S, S.A.

pedindo a condenação desta a restituir-lhe a quantia de 68.201,49€ e juros à taxa legal desde a citação, bem como a pagar-lhe a indemnização de 85.000,00 € e juros a partir da citação.

Alegou, para tanto e em síntese, ter a Ré levado a efeito a construção de um Centro Comercial denominado W Shopping em Santarém, com inauguração prevista para 30.10.2003, tendo incumbido a A, Imobiliários para comercializar o dito centro comercial. Na sequência de contactos previamente estabelecidos com a A, a Autora subscreveu o escrito denominado "Proposta de Contrato para Ingresso" que tinha em vista a futura celebração de um contrato através do qual a Ré permitiria o gozo e utilização de espaços daquele centro, correspondente a lojas, para a Autora nele instalar um estabelecimento de venda a retalho de um pronto a vestir, de produtos da marca D. Tal proposta não foi negociada entre as partes, constando de um impresso, à excepção da partes destinadas à aposição de dizeres manuscritos, relativos à identificação das lojas a explorar pela proponente, valor da retribuição mensal etc. Mais refere ter entregue à Ré, através da A, a quantia de 68.201,49€. Alega igualmente que em Março de 2003, a A, propôs à Autora, a exploração de uma outra loja a nº 37, contígua às demais 38 e 39, e que a D aceitou negociar e explorar por corresponder ao seu interesse comercial, aceitação que comunicou à A em Abril de 2003, ficando crente que esta loja ficaria igualmente reservada para si.

Porém, ao contrário do que ficara ajustado, a Ré não fez constar do contrato de utilização enviado para a Autora esta loja (37), tendo a Autora feito insistentes diligências para tanto. Em face desta atitude da Ré, a Autora comunicou-lhe, em 22.7.03, que se encontrava objectivamente impossibilitada de celebrar o contrato de utilização relativa às lojas 38 e 39, solicitando a marcação de uma reunião urgente, visando conseguir que a loja 37 fosse incluída no contrato de utilização a celebrar. Em final de Agosto de 2003, a A comunicou à D que a Ré cedera a exploração das lojas 38 e 39 a outra entidade, o que impossibilitava definitivamente a cedência das mesmas à Autora. Sem embargo, a Ré não lhe restituiu as quantias que a Autora lhe entregara, tendo com a sua conduta criado prejuízos à Autora, prejuízos esses decorrentes de a Autora ter efectuado planos e aquisições tendo em vista as 3 lojas .

Contestou a Ré, impugnando a generalidade dos factos alegados pela Autora e deduziu reconvenção mediante a qual peticiona que o Tribunal declare perdido a seu favor o sinal entregue pela Autora e, subsidiariamente, que se condene a Autora a pagar-lhe os prejuízos decorrentes do incumprimento do contrato concernentes a reposição das lojas 38 e 39 em duas e no facto de ter ficado prejudicada na renegociação que teve de efectuar com outros proponentes das lojas em causa.

Replicou a Autora, impugnando os factos alegados pela Ré e concluindo como na petição inicial.

Frustrada a conciliação entre as partes, foi elaborado despacho saneador e consignou-se a matéria de facto assente e a base instrutória.

Procedeu-se a julgamento com observância do legal formalismo.

Apenas a Ré alegou de direito.

Nas suas alegações de direito, veio a Ré suscitar a "questão prévia" de ininteligibilidade da causa de pedir, pugnando pela sua absolvição da instância.

Foi proferida sentença que julgou, a arguida falta ou insuficiência de causa de pedir, improcedente.

Foi, igualmente julgada a acção parcialmente procedente e em consequência condenou-se a Ré a restituir à Autora a quantia de 68.201,49 € com juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento, no mais a absolvendo do pedido. Mais se julgou a reconvenção totalmente improcedente, absolvendo-se a Autora do pedido reconvencional.

Inconformada, vem a Ré apelar da sentença, tendo, no essencial, formulado, as seguintes conclusões: 1.

A Autora, aqui Recorrida (D) subscreveu uma proposta de ingresso no Centro Comercial W Shoppping, com vista à celebração de um contrato pelo qual a Ré, aqui Recorrente (S), lhe permitiria o gozo e utilização de duas lojas nesse Centro Comercial, a loja 38 e 39, tendo pago a quantia de € 68.201,49 a título de reserva de localização.

  1. A S aceitou essa proposta e reservou-lhe as referidas lojas 38 e 39.

  2. Sucede que, mais tarde, a mediadora A, que se encontrava a negociar as lojas daquele Centro Comercial, contactou a D no sentido se saber se esta estaria interessada na exploração de uma outra loja, a loja n.° 37 (para além das duas já reservadas, a 38 e 39).

  3. No entanto, a S não lhe cedeu aquela loja, até porque a mesma já estava reservada para outro lojista.

  4. Não podendo ficar também com a loja 37, a D não quis nenhuma das três, comunicando à S que estava "objectivamente impossibilitada de celebrar o contrato de utilização relativa às lojas 38 e 39".

  5. Face à desistência da D, a S não devolveu à D a quantia paga a título de reserva.

  6. Foi alegado, provado, e aceite por ambas as partes que a S acordou em reservar as lojas 38 e 39 para a D.

  7. No entanto, não foi alegado (e muito menos provado) que a S acordou em reservar a loja 37.

  8. Assim, no entender da S, a D não podia desistir do negócio relativamente às lojas 38 e 39 sem perder a quantia paga a título de reserva.

  9. Um dos aspectos fundamentais na implantação de um centro comercial é o designado tenant mix, i.e., a organização das lojas dentro do espaço do Centro Comercial; e se um lojista desiste, à ultima hora, de ingressar no Centro Comercial, o promotor fica com dois problemas: por um lado, terá de conseguir rapidamente um outro lojista (perdendo poder negocial) sob pena de o Centro Comercial abrir ao público com lojas fechadas (o que pode criar danos irreversíveis à imagem e reputação do Centro); por outro, terá de conseguir um lojista que se enquadre no tenant mix, sob pena de desvirtuar a organização do centro (imagine-se uma loja de roupa na parte da restauração).

  10. Pelo exposto, os promotores celebram contratos de reserva de loja, nos termos do qual, se os lojistas desistirem de ingressar no centro, perdem a quantia paga a título de reserva.

  11. Foi isto que sucedeu com a loja 38 e 39; a S reservou estas lojas à D e esta veio a desistir das mesmas à última hora (o que, aliás, trouxe enormes prejuízos à S).

  12. Ficou provado que a mediadora A criou na R (agora D) "a convicção de que esta loja [LOJA 37] além das outras duas para as quais a Ré recebera, através da A, as sobreditas quantias, ficara reservada para si, até porque negociara com a A os respectivos custos de cedência, "direito de ingresso", rendas e demais condições".

  13. Assim, o tribunal recorrido entendeu que, face à actuação da mediadora A, a S ficou de facto vinculada, por representação aparente, ao contrato de reserva da loja 37.

  14. Deste modo, concluiu a sentença recorrida que foi a S quem incumpriu parcialmente o contrato de reserva das lojas, pois que não cedeu à D a loja 37.

  15. Contudo, na representação aparente, o representante apresenta-se como tendo poderes para celebrar um determinado contrato.

  16. Isto nada tem que ver com o facto de uma mediadora fazer crer que uma das partes que mediava aceitou uma proposta contratual quando isto não sucedeu.

  17. Nos presentes autos, nunca a D ficou convencida que a mediadora A tinha poderes para celebrar contratos.

  18. É certo que a D alegou que "a A sempre se apresentou como representante consistente da Ré, com poderes para negociar aqueles espaços, sem qualquer obstáculo ou indícios de que as suas negociações careciam de aprovação da mesma Ré".

  19. Ora, precisamente esta parte do quesito não foi considerada provada.

  20. Pelo contrário, foi considerado provado que "as mediadoras imobiliárias apresentam as contrapropostas à Ré, que as aceitava ou não, e assim sucessivamente" (resposta ao quesito 18.°) e ainda que "a forma adoptada pela Ré na comercialização do "W Shopping" não foi inovadora, estando até perfeitamente institucionalizada no meio, como todos os intervenientes no processo bem sabem" (resposta ao quesito 20.º).

  21. É claro, portanto, que a D sabia que quem teria de aprovar as propostas era a Ré S e não a A.

  22. Se a D ficou com a convicção que a S aceitou a reserva da loja, ficou com a convicção errada.

  23. Se tal convicção foi induzida pela A, esta terá de responder perante a D.

  24. Mas nunca poderá existir um problema de representação aparente, porquanto a D nunca esteve convicta que a A tinha poderes para celebrar o contrato.

  25. Mas, de qualquer forma, nem sequer ficou provado o alegado pela D, i.e., que a A lhe tivesse criado a "absoluta confiança" de que a S tinha aceitado a proposta de ingresso relativamente à loja 37, mas tão só que "foi criada na R a convicção", tratando-se, portanto, de uma mera expectativa.

  26. É evidente, como se diz na sentença, que "A A apresentava em nome da Ré, as condições de comercialização das lojas do Shopping aos potenciais clientes: a A apresentou à Autora as lojas no referido centro comercial; a A recebeu da Autora as quantias destinadas à Ré; a A remeteu à Autora a minuta do contrato de cedência de utilização de lojas; a A enviou à Autora a intimação da Ré para que o contrato fosse entregue até ao dia 11 de Julho de 2003" etc..

  27. Enfim, as mediadoras e, concretamente a A, faziam pura e simplesmente aquilo que uma mediadora faz: mediava! 29. A A apenas recebia propostas mas não celebrava contratos.

  28. Essa era a sua função como mediadora imobiliária.

  29. Com base numa mera convicção de que a S teria aceitado a reserva, o Tribunal recorrido não pode determinar um contrato como celebrado, extrapolando uma representação aparente.

    32 - Com efeito, a A é uma mediadora imobiliária contratada pela S e não tinha nem podia ter ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.° 211/2004, de 20 de Agosto (regula o exercício das actividades de mediação...

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