Acórdão nº 4584/2006-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 12 de Julho de 2007

Magistrado ResponsávelARNALDO SILVA
Data da Resolução12 de Julho de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Proc. n.º 4584/06-7 ACÓRDÃO Acordam os juízes, em conferência, na 7.ª Secção Cível, do Tribunal da Relação de Lisboa: I.

Relatório: 1. As deliberações tomadas na Assembleia Geral da Associação Lisbonense de Proprietários realizada em 04-07-2002, são anuláveis, por serem contrárias à lei e aos estatutos, porque não existia mesa da Assembleia Geral validamente constituída, por força da demissão, dias antes, de todos os corpos sociais, pelo que devia a assembleia nomear para o acto um presidente da mesa substituto, porque foram aceites procurações que não respeitaram o modelo estabelecido e, porque foram consideradas duas centenas de procurações passadas a favor de um único associado, com a faculdade de substabelecimento, em violação de regra estatutária (art.º 23°) que proíbe que um sócio represente mais de cinco sócios, e porque a Assembleia decorreu com perturbações, tendo vários associados sido impedidos de intervir, e porque o Relatório, Balanço e Contas e Parecer do Conselho Fiscal relativos ao exercício findo em 31 de Dezembro de 2001 não foram aprovados, ao contrário do que consta da acta da mesma Assembleia Geral, porquanto não houve conhecimento por parte de todos os associados que a votação estava a decorrer, e por isso não votaram, em ambiente de burburinho e discussão, além de que não houve contagem, numérica de votos.

Com base nestes fundamentos, vieram Maria […] e João […] intentar contra Associação Lisbonense de Proprietários, com sede em […] Lisboa, acção declarativa comum com forma ordinária, na qual pedem que sejam anuladas as deliberações tomadas na Assembleia Geral da Associação Lisbonense de Proprietários realizada em 04-07-2002.

* 2. Na sua contestação, a ré diz que a Mesa da Assembleia Geral não se havia ainda demitido, sendo tão somente demissionária, face à renúncia do Presidente da Direcção, sendo por isso a mesma regular e válida. Diz que são igualmente válidos os substabelecimentos emitidos, por não haver proibição estatutária que o impeça e, por isso, não há qualquer violação do art.º 23º dos Estatutos da ALP. Refere ainda que só os sócios que se desviaram da ordem de trabalhos foram impedidos de continuar a falar e que o sistema de votação "por sentados" e "em pé" sempre foi usado na ALP.

E conclui pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.

* 3. Na sessão da audiência de discussão e julgamento de 13-04-2005, pela mandatária da ré foi pedida a palavra, e sendo-lhe concedida, no uso dela requereu a junção aos autos de cópia da acta n.º 166 da Assembleia Geral de 07-11-2000 e de uma cassete que se reporta à gravação da Assembleia Geral de 04-07-2002, na parte em que se refere às intervenções do sócio João […] e respectiva transcrição, que se destinava à prova dos quesitos: 13º, 17º, 18º, 19º, 34º, 35º, 36º e 40º e à contraprova do quesito 27º. No uso que teve da palavra, o mandatário dos autores nada disse quanto à junção da cassete.

Por despacho proferido, na mesma sessão, a Mmª Juíza, disse que o Tribunal tem interesse em ouvir as gravações de toda a Assembleia Geral de 04-07-2002, e assim, convidou a ré a apresentar as cassetes de toda a Assembleia Geral.

De seguida, pela mandatária da ré foi dito que a Associação Lisbonense de Proprietários já não possui a gravação de outras intervenções que não a dita cassete, pelo que não lhe é possível aceder ao convite feito pela Mmª Juíza.

Logo após, a Mmª Juíza proferiu o seguinte despacho: « Perante tal informação, indefiro à junção e audição da cassete alusiva à intervenção do autor, porquanto não permite o conhecimento global do ambiente da Assembleia Geral exposto na base instrutória e que importaria conhecer no seu todo, Fica assim o convite restrito à junção dos documentos em causa » (fls. 482 Vol. 2.º).

* 3.1. Inconformada que o despacho que indeferiu a junção e audição da cassete, agravou a ré. Nas suas alegações (fls. 617 a 619 Vol. 3.º), conclui: 1.ª Nos termos do art.º 513º do Cód. Proc. Civil, a instrução tem por objecto os factos relevantes para o exame e decisão da causa que devam considerar-se controvertidos; 2.ª Nos termos do subsequente art.º 515º, são atendíveis pelo Tribunal todas as provas produzidas (ou, oferecidas); 3.ª Nos termos do art.º 523º do mesmo Código, os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da acção ou da defesa podem ser apresentados até ao encerramento da discussão em 1.ª instância (como in casu foram); 4.ª Nos termos do art.º 527º ainda do mesmo diploma, à parte que apresente como prova qualquer registo fonográfico incumbe facultar ao tribunal os meios técnicos de o exibir (como in casu fez); 5.ª A não aceitação e apreciação pelo Tribunal desse elemento de prova configura inaceitável cerceamento do direito de defesa da ré, ora agravante.

* 3.2. Nas suas contra-alegações (fls. 860 a 862 Vol. 4.º), conclui: 1.ª A acta produzida com base no registo fonográfico em questão já consta nos autos, pelo que, sendo tão fidedigna como a Recorrente afirma, não há qualquer necessidade de confronto com a gravação; 2.ª Ainda que assim não fosse o facto de a gravação estar truncada inviabiliza que possa ser usada como prova pois o que está em causa são as deliberações tomadas na Assembleia Geral pelo que a admitir-se um registo fonográfico teria que ser de toda a Assembleia e não parcial; 3.ª Não foi invocada a falsidade da acta em questão, pelo que não há qualquer necessidade de provar a fidedignidade da transcrição; 4.ª Uma vez que foi a recorrente quem destruiu a outra parte da gravação, a questão pode mesmo colocar-se ao contrário, ou seja, porque é que a recorrente impediu então que tudo fosse confrontado deixando apenas um excerto?; 5.ª Decidiu assim muito bem o douto despacho em questão.

3.3. O Tribunal manteve o despacho recorrido (fls. 970 Vol. 5.º).

* 4. A acção prosseguiu os seus posteriores termos, tendo sido proferida sentença que julgou a acção procedente e, consequentemente anulou as deliberações tomadas na Assembleia Geral da ré realizada em 04-07-2002, e condenou a ré em custas.

* 5. Inconformada, apelou a ré. Nas suas alegações (fls. 649 a 678 Vol. 3.º), em síntese nossa, conclui: 1.ª Do confronto da prova testemunhal produzida pelos autores com a prova produzida pela ré e com uma gravação parcial da Assembleia sub judice, resulta clara descredibilidade da primeira, tanto por inverdade e imprecisão tendenciosa como por manifesto envolvimento pessoal e comunhão de interesses, nada consentindo que se entenda como não fidedigna a Acta da Assembleia sub judice; 2.ª Deverão, por isso, ser alteradas as respostas aos pontos da base instrutória abaixo indicados da seguinte forma: __ art.º 28° = O que aconteceu nomeadamente na discussão do ponto 1 da ordem de trabalhos, antes de serem postas à votação as Contas; __ art.ºs 29º 30º 31°, 33° e 34° Não provados; 3.ª Assim sendo, o Relatório, Balanço e Contas e Parecer do Conselho Fiscal relativos ao Exercício de 2001 foram aprovados por maioria; 4.ª Embora discutível a validade, ou não, dos substabelecimentos de procurações apresentados por alguns sócios na Assembleia sub judice no acto da eleição dos órgãos Sociais para o triénio subsequente, mesmo sem os ter em consideração a votação por presenças deu larga maioria à Lista da Ré, nos seguintes termos: Direcção: 79 votos na Lista "B" contra 7 votos na Lista "A" Mesa da Assembleia Geral: 71 votos na Lista "B" contra 15 votos na Lista "A" Conselho Fiscal: 74 votos na Lista "B" contra 11 votos na Lista "A" 5.ª Foi assim legitimamente proclamada eleita e empossada a Lista da ré, dado que do seu cômputo inicial, globalizado, nenhum efeito útil ou prejudicial, ainda que transitório, resultou para qualquer das Listas candidatas; 6.ª Aliás, a explicitação de poderes de substabelecimento nas procurações solicitadas por um dos Directores indicava ao mandante que o exercício do seu direito de voto seria confiado a outro sócio uma vez que o mandatário já dispunha de mais mandatos do que os que poderia representar na Assembleia; 7.ª Acresce que muitos desses mandantes passaram logo no ano seguinte novas procurações segundo indicações do dito Director, em inequívoca confirmação tácita da anterior, substabelecida; 8.ª Só por rigorismo excessivo se pode entender imperativo o modelo de procuração publicado exemplificativamente a par da Convocatória para cada Assembleia; 9.ª Deverão assim ser consideradas válidas as deliberações tomadas na Assembleia Geral da Associação Lisbonense de Proprietários realizada no dia 4 de Julho de 2002; 10.ª É manifesto, face ao exposto, que houve erro na qualificação jurídica dos factos, além de que constam do processo elementos de prova que, não tomados em consideração, só por si implicam necessariamente decisão diversa da proferida; * 6. Nas suas contra-alegações (fls. 852 a 859 Vol. 4.º), os autores apelados, concluem: 1.ª O douto Tribunal a quo avaliou correctamente a prova produzida independentemente da forma mais ou menos apaixonada com que as testemunhas de ambas as partes interpretaram e viram o que aconteceu na Assembleia Geral sub judice; 2.ª O segundo anúncio do Presidente da Mesa da Assembleia de que se iria proceder à votação foi feito imediatamente após ter tomado 2 decisões controversas no clima que já se vivia; 3.ª É mais do que presumível que as 2 decisões do presidente da Mesa da Assembleia Geral não foram recebidas pacificamente; 4.ª O sistema de votação não estava correcto pois pressupunha inacção para um dos sentidos de voto e necessidade de acção para outro, num clima em que não era pacífico que todos entendiam claramente o que se passava; 5.ª Não foi dado oportunidade aos participantes de se absterem pelo que quem se quisesse abster, muito provavelmente ficou sentado tendo contado como voto a favor; 6.ª O sistema de votação escolhido sem identificação dos votantes é incompatível com a existência de procurações; 7.ª É inegável que a votação não foi correctamente efectuada; 8.ª Ainda que assim se não entendesse, o que como mera...

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