Acórdão nº 1332/2003-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 24 de Junho de 2003

Magistrado ResponsávelROSA MARIA COELHO
Data da Resolução24 de Junho de 2003
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I - A ... intentou contra B ... e C ... a presente acção declarativa, com processo ordinário, pedindo a condenação solidária destas a pagarem-lhe a quantia correspondente a 243.269 francos franceses, acrescida de juros à taxa legal, contados desde 12.10.99 até integral pagamento, alegando, em síntese, ser aquele o valor dos direitos e demais imposições relativos a mercadoria desaparecida em França e que era transportada desde a Suíça até Portugal, em execução de um contrato celebrado entre a autora com a primeira ré e que esta subcontratara com a segunda ré. Apenas a ré C ... contestou por impugnação e excepção - arguindo a sua ilegitimidade - e a autora replicou.

Foi proferido despacho saneador, em cujo âmbito foi julgada improcedente a excepção deduzida, afirmando-se a legitimidade da 2ª ré, e procedeu-se à selecção da matéria de facto assente e organizou-se a base instrutória.

Realizou-se a audiência de julgamento, no âmbito da qual se respondeu à matéria da base instrutória, decisão que não foi objecto de qualquer reclamação e, subsequentemente, proferiu-se sentença que absolveu do pedido a ré C ... e condenou a ré B ... a pagar à autora a quantia de 37086,12 Euros, acrescida de juros de mora à taxa de 12% desde a sua citação até integral pagamento.

Apelou a B ..., tendo apresentado alegações onde juntou cinco documentos e sustenta dever a sentença ser anulada e decretar-se a sua absolvição do pedido.

Formulou conclusões que, em síntese, têm o seguinte teor: 1. O Tribunal recorrido errou na apreciação da prova produzida nos autos ao considerar provados factos que só documentalmente o podem ser (sem que dos autos constem esses mesmos documentos), como sejam os alegados contratos de transporte internacional de mercadorias, a existência do documento de trânsito T1, o pagamento de direitos aduaneiros e o seu montante e a notificação para pagamento dos mesmos, violando assim o nº 1 do art. 364º e os artigos 369º a 371º do Código Civil.

  1. A sentença recorrida fez também errada interpretação e aplicação do direito aos factos dados como provados.

  2. Assim, da matéria de facto provada não resulta que a Apelante tenha intervindo em nenhum contrato de transporte.

  3. O contrato de transporte internacional da mercadoria em causa foi estabelecido entre a 2ª Ré e a Multiforsa, sendo esta a expedidora da mercadoria.

  4. A Apelante nunca teve qualquer contacto, nem estabeleceu nenhum contrato com o expedidor da mercadoria.

  5. Os montantes dos direitos aduaneiros e demais imposições que a Apelante foi condenada a pagar não correspondem aos legalmente devidos pela mercadoria.

  6. Da matéria de facto provada resulta que a A. não era a "responsável principal", contrariamente ao decidido.

  7. A condenação da Ré, em resultado de um alegado contrato internacional de mercadorias, viola a Convenção CMR, pois, à data da citação da apelante, qualquer direito da A. sobre ela estava prescrito e a A. impedida de o exercer em Tribunal (artigo 32º nº 1 e 4 da Convenção), o que é do conhecimento oficioso.

  8. A decisão recorrida constituiu uma decisão surpresa para a Apelante, violadora do princípio do contraditório, com assento constitucional, pois não era previsível, face à petição inicial, a absolvição da 2ª Ré e a condenação da Apelante, nem a contestação daquela foi notificada à Apelante.

    Contra-alegaram a autora e a ré C ..., pugnando pela improcedência do recurso.

    Colhidos os vistos., cumpre decidir, apresentando-se - em face do conteúdo das conclusões que, como é sabido, delimitam o objecto do recurso - como questões sujeitas à nossa apreciação, as seguintes: - saber se foi violado direito probatório material ao serem dados como provados sem documento factos que só poderiam sê-lo documentalmente; - saber se a apelante interveio no contrato de transporte; - saber se os direitos aduaneiros e demais imposições em que a apelante foi condenada correspondem aos legalmente devidos; - saber se a apelada era a responsável principal pelos aludidos encargos; - saber se o crédito da apelada sobre a apelante se encontra prescrito; - saber se a sentença constituiu para a apelante uma decisão surpresa por violação do princípio do contraditório.

    II - Os factos que na sentença vêm descritos como provados são os seguintes: 1. A autora é uma empresa transitária devidamente licenciada para o exercício dessa actividade; 2. A primeira ré é uma empresa que presta serviços nas áreas aduaneiras, da armazenagem e da distribuição.

  9. A segunda ré é uma empresa que se dedica à indústria dos transportes rodoviários de mercadorias.

  10. No âmbito da sua actividade a autora foi contratada pela sua cliente Danone Portugal S. A., para organizar e coordenar o transporte de um lote completo de mercadorias adquiridas por esta a uma empresa suíça.

  11. Obrigou-se a autora a tratar de todos os trâmites e formalidades necessários à expedição, transporte e recepção da mercadoria.

  12. A mercadoria em causa, constituída por cereais, foi carregada, em 25.10.96, em instalações da firma Multiforsa AG sitas em Steinhausen (Suíça) e tinha por destino as instalações da Danone, sitas em Castelo Branco.

  13. Para a execução material do transporte foi contratada a primeira ré.

  14. Esta, por sua vez, subcontratou o transporte com a segunda ré, que o efectuou utilizando para o efeito o tractor com a matrícula 44-59-GJ e a galera frigorífica com a matrícula L-121727.

  15. Foi o agente/correspondente da autora na Suíça, Danzas AG, com escritório em Basel, quem, a pedido e por solicitação da autora, interveio na operação em causa, tendo procedido à emissão e assinatura do documento de trânsito T1, necessário para o efeito.

  16. Neste caso a Danzas AG assumiu a posição de responsável principal pela operação.

  17. A galera onde a mercadoria foi acondicionada foi vítima de furto em França em 26.10.96, tendo a segunda ré assumido toda a responsabilidade pela ocorrência.

  18. Desta forma a situação relativa ao pagamento do valor da mercadoria foi regularizada pela segunda ré.

  19. O furto da mercadoria tornou impossível a apresentação das mercadorias na estância aduaneira de destino, que era a fronteira em Vilar Formoso.

  20. O responsável principal, em caso de irregularidade, é responsável pelo pagamento dos direitos e demais imposições relativos à...

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