Acórdão nº 2629/2003-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 03 de Junho de 2003

Magistrado ResponsávelPIMENTEL MARCOS
Data da Resolução03 de Junho de 2003
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.

A intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo sumário, contra B alegando, em síntese, que: Por ambas foi celebrado um contrato de abertura de conta bancária, sendo a autora titular de uma conta na agência da ré, onde depositava os cheques que recebia dos seus clientes com a finalidade de aquela proceder à sua cobrança; Com este fim entregou-lhe o cheque n.º 5290643, sacado por C sobre o banco X, no montante de Esc. 460.000$00, sem que o mesmo tivesse sido cobrado por esta instituição bancária ou devolvido à autora para que esta procedesse à sua cobrança.

Alega também que com o seu comportamento a ré colocou em causa o bom nome da autora, já que começou a correr na freguesia da sede desta, que a mesma era mal gerida, pois devia dinheiro a bancos e não pagava, abalando dessa forma a confiança depositada por aqueles.

E concluiu pedindo que a ré fosse condenada a restituir-lhe o dito cheque, ou, caso não o fizesse, a entregar-lhe o montante do mesmo, acrescido dos respectivos juros de mora vencidos e vincendos, a contar da data do depósito, bem como a pagar-lhe a título de indemnização por danos morais na quantia de € 1450.

*A ré contestou, invocando a excepção dilatória de caso julgado, alegando para tal serem as mesmas partes (embora em posições processuais distintas), a causa de pedir e o pedido formulados nesta acção e no processo n.º 57/01, que correu termos no mesmo tribunal.

Mais alega que a autora lhe entregou cheques para que ela (R) procedesse à sua cobrança e posterior crédito na sua conta após boa cobrança, assumindo ela a função de mera detentora ou possuidora em nome alheio ao abrigo de uma relação de mandato. E ainda que entre esses cheques se encontrava o identificado nos autos que não cobrou, nem devolveu à autora em virtude de o saco do seguro do correio onde o mesmo seguia, com destino à Câmara de Compensação Regional, em Ponta Delgada, se haver extraviado e nunca mais ter sido recuperado, apesar das diligências que efectuou junto dos CTT, do que deu pronto conhecimento à autora, e sem que tenha tido culpa no mesmo, já que se tratou de caso fortuito que não lhe é imputável.

Concluiu pedindo que fosse julgada procedente a excepção do caso julgado ou, a não ser assim entendido, que a acção fosse julgada improcedente.

**A autora respondeu à contestação alegando que não existia caso julgado em virtude de nas duas acções a causa de pedir e o pedido serem diferentes.

** Foi proferido despacho saneador, onde foi julgada improcedente a excepção de caso julgado.

Seleccionaram-se os factos assentes e elaborou-se a base instrutória, o que não foi alvo de qualquer reclamação.

A ré interpôs recurso de agravo da parte do despacho saneador que julgou improcedente a excepção do caso julgado, o qual foi recebido com subida diferida e nos próprios autos.

Procedeu-se a audiência de discussão e julgamento e respondeu-se à matéria controvertida por despacho de fls. 124 e 125.

Seguidamente foi proferida a competente sentença, com a absolvição da ré do pedido.

Dela recorreu a autora que formulou as seguintes conclusões: 1. A douta sentença do Meritíssimo Juiz do Tribunal "a quo" não retirou as devidas consequências da aplicação do artº. 796º do C. Civil; 2. Com a entrega do referido cheque pela A., ora apelante, à R. apelada, o risco passou a correr por conta desta; 3. O referido cheque foi entregue pela ora recorrente à R. para que esta o apresentasse junto da Câmara de Compensação Regional; 4. Contudo, é certo que a R. não garantiu a boa cobrança do cheque. É um facto. Mas mesmo que se tratasse de uma obrigação de meios, como é entendido na douta Sentença recorrida, importa ainda referir que, tal como consta dos factos provados, não foram realizados os actos necessários, de acordo com a diligência de um bom pai de família, para o transporte e remessa de valores; 5. No entanto, garantiu a R. à A. que este seria levado à Câmara de Compensação Regional, e esta era uma obrigação de resultado e não de meios e não foi por ela cumprida; 6. E sendo assim, nos termos do art. 799º do C. Civil, presume-se que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso do contrato (neste caso de mandato) é imputável ao devedor (mandatário); 7. Por força daquela presunção, cabe sim à R. alegar e provar que actuou diligentemente e como um bom pai de família na execução daquele mandato, ou seja, que o extravio e os prejuízos daí advenientes não lhe são imputáveis; 8. Ora, no caso em apreço, a R. apenas alegou que a mala e respectivo conteúdo nunca foram recuperados, apesar de diligências que fez junto dos C.T.T.; 9. Salvo o devido respeito, tal é insuficiente para que se mostre elidida a presunção vertida no art. 799º do C. Civil.

10. Na verdade, a R. não alega nem prova que procedimento tomou para a cobrança do referido cheque, que cuidados tomou para precaver uma situação de extravio, que efectuou um seguro para atenuar/compensar danos numa situação de extravio, qual a razão do extravio, se se tratou de um furto, ou se, pelo contrário, tratou-se de negligência dos serviços dos C.T.T. que perderam a referida mala.

11. A R. apenas alegou e provou que procedeu a diligências posteriores ao extravio da mala, sem especificar quais, sem que a mesma tenha sido recuperada; 12. Impunha-se à R. um comportamento diferente daquele que na realidade tomou, nos termos dos deveres a que se encontrava adstrita; 13. Assim, antes do desaparecimento da mala, impunha-se que a R., ao remeter valores pelo simples correio (opção já de si questionável, atendendo ao facto de se tratar de valores e não ser aquela a primeira vez - e infelizmente a última - que ocorre o extravio de uma mala postal), procedesse a um seguro (cujos custos poderiam ser imputados nas tais despesas de cobrança ... ) , de modo a precaver situações como a que acabou por acontecer; 14. Depois, após saber do extravio, deveria diligenciar no sentido de, pelo menos, saber o que aconteceu, imputando responsabilidades a quem de direito, sendo certo que era esta - a R. - quem tinha contratado com os C.T.T.; 15. É que, das duas uma: ou a mala havia sido furtada e então deveria a R. ter, no mínimo, apresentado uma queixa-crime, ou então, houve negligência dos C.T.T. e, neste caso, a R. deveria ter-lhe imputado a responsabilidade pelos danos provenientes do extravio da mala; 16. Este seria o comportamento mínimo exigível a um bom pai de família, tal como é exigido nos termos do art.762º nº 2 e 1161º do C. Civil.

17.Contudo, nada disto foi feito, tendo a R. limitado a "passar" a informação que a mala havia sido extraviada, como se não tivesse qualquer responsabilidade no assunto, como que não tivesse sido ela a escolher o modo de envio, a tomar a opção de não efectuar seguro de transporte e como se não fosse ela a contratante com os C.T.T.; 18. É que, o comportamento da R. em avisar a A. e o banco sacado do extravio da mala, apenas se refere a prejuízos que poderiam ocorrer após o extravio, no caso de, por exemplo, daquele cheque ser descontado por um portador que não o legitimo, ou de outros conexos que pudessem ter como causa a sua posse ilegítima. Contudo, não são estes os danos aqui reclamados; 19. Por fim, e ao contrário do...

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