Acórdão nº 04279/10 de Tribunal Central Administrativo Sul, 12 de Julho de 2011

Magistrado ResponsávelEUGÉNIO SEQUEIRA
Data da Resolução12 de Julho de 2011
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul: A. O Relatório.

  1. A Exma Representante da Fazenda Pública (RFP), identificada nos autos, dizendo-se inconformada com a sentença proferida pelo M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por P………. – Companhia Portuguesa …………….., Lda, veio a mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem: a) Da letra do n.º 7 do Art.º 92.º da LGT resulta que o parecer do perito independente não vincula a Administração Tributária mas a não aceitação da posição por ele assumida tem de ser obrigatoriamente fundamentada. No entanto, esta exigência apenas é de fazer nos casos em que o perito independente proponha um valor inferior ao proposto pelo perito da Administração Tributária, o que aqui nem sequer aqui ocorreu (Vide anotação aquele artigo comentada na LGT anotada do Diogo Leite Campos/Benjamim Silva Rodrigues/Jorge Lopes de Sousa); b) Contrariamente ao decidido na douta sentença, no laudo do perito da Administração Tributária (n.º 6 do Art.º 92º da LGT) encontram-se expressas as razões porque se discorda/rejeita o parecer do perito independente (extensivo também ao laudo do contribuinte), tal constata-se da fundamentação utilizada no próprio laudo (Vide Art.º 9.º das alegações); c) A violação do n.º 7 do Art.º 92.º da LGT só se daria se o perito da Administração Tributária não fundamentasse a razão porque rejeitou o parecer do perito independente, mas tal não ocorreu nestes autos de impugnação, porque no seu laudo estão expressas as razões porque não se concorda com os argumentos defendidos pelo perito independente; d) Se a Administração Tributária concluiu que não foram apresentadas pela sociedade impugnante várias facturas correspondentes a estadias de clientes, denotando omissão de proveitos, logo não eram a utilização de qualquer outro método indirecto que lhe permitia aferir da ocupação, como sugeriu o perito independente, por adopção da posição do contribuinte, nomeadamente, consumos de electricidade, mudança de roupa, ratio de pessoal, logo salvo melhor entendimento, não tinha o perito da administração Tributária que se pronunciar sobre critérios impróprios que foram "aventados" sem qualquer justificação para que se possa retirar a ilação através deles de que a empresa omitia proveitos; e) Quanto ao critério (rentabilidade fiscal) e cálculos dos valores corrigidos com recurso a métodos indirectos utilizados pela Administração Tributária descritos no ponto 2. do laudo do perito da Administração Tributária não foram directamente postos em causa pelo perito do contribuinte nem pelo perito independente, este apenas se limitou a dizer que “o valor impugnado pelo contribuinte é efectivamente de € 350 649,54" sem defender quais os valores que considerou excessivos para que pudesse "deitar por terra" a fixação da matéria tributável determinada pela Administração Tributária, como lhe competia legalmente. E, neste caso, afigura-se-nos que esta não é obrigada sequer a fundamentar a rejeição da posição do perito independente, se este não propôs critérios alternativos adequados nem valores inferiores aos fixados pela Administração Tributária (Vide anotação aquele artigo comentada na LGT anotada do Diogo Leite de Campos/Benjamim Silva Rodrigues/Jorge Lopes de Sousa).

    1. Se assim não se entender, o que apenas se equaciona por mero dever de patrocínio, sempre se dirá que o laudo da Administração Tributária explicou os critérios e cálculos utilizados pela Inspecção para corrigir a matéria tributável, e não tendo nem o representante do contribuinte e nem o perito independente apresentado critérios adequados no decurso da inspecção, que ponham em causa a fixação da matéria tributável, a Administração Tributária decidiu manter o volume de negócios e o lucro tributável proposto pela Inspecção (Vide ponto V do RIT).

    2. Assim, ao decidir como decidiu, terá a douta sentença violado, por errada aplicação dos factos e do direito, a norma legal do n.º 7 do Art.º 92.º da LGT, porquanto na decisão de fixação da matéria tributável estão expressamente evidenciados as razões porque a Administração Tributária rejeitou/discordou do parecer do perito independente.

    Pelo exposto e pelo muito que V. Ex.ªs doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso e consequentemente revogada a sentença recorrida, só assim se fará JUSTIÇA.

    Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito suspensivo.

    Também a recorrida veio a apresentar as suas alegações e nestas as respectivas conclusões, as quais igualmente na íntegra se reproduzem: 1 - A letra do n° 7 do artº 92 da LGT obriga a Administração Tributária a fundamentar a sua adesão ou rejeição, seja ela total ou simplesmente parcial, ao laudo do perito independente.

    2 - A fundamentação dos actos da Administração susceptíveis de lesar os interesses do contribuinte representa a principal garantia do contribuinte perante a actividade administrativa, conforme resulta do comando constitucional contido no n° 3 do artº do 268° da CRP aqui concretizado pela lei fiscal, nomeadamente no artº 77° da LGT.

    3 - A fundamentação dos actos da administração deve permitir "a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do acto para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do acto decidiu como decidiu e não de forma diferente" (acórdão do STA, de 10/07/2002).

    4 - Não pode desempenhar a finalidade supra descrita uma fundamentação pura e simplesmente resultante da oposição entre o laudo do perito da Administração e o perito do contribuinte.

    5 - O próprio elemento literal do n° 7 do artº 92 da LGT confirma o dever de fundamentação que o comando normativo em causa faz impender sobre a Administração Tributária através do emprego do advérbio de modo "obrigatoriamente" na sua redacção.

    6 - Nem de outro modo se poderia entender, dado que a determinação dos valores tributáveis com recurso aos métodos indirectos constitui de entre todos aqueles actos que podem ser praticados pela Administração Fiscal o que é mais susceptível de lesar os interesses do contribuinte. Daí advém não só a sua natureza subsidiária, mas também todo o ónus imposto à Administração Fiscal de provar os motivos que justificam a sua aplicação.

    7 - Por conseguinte, conforme resulta da conjugação dos art°s 87° e 88° e n° 14 do art° 91º, todos da LGT, o recurso à Tributação com base em métodos indiciários apenas poderá ter lugar quando se verifique a impossibilidade da sua determinação, não apenas uma mera dificuldade ou falta, susceptível de mera correcção técnica (aritmética), porque se encontra devidamente identificada e quantificada.

    8 - Estando as alegadas incorrecções verificadas no caso concreto devidamente identificadas e quantificadas, a Administração Fiscal deveria ter simplesmente procedido à sua correcção meramente aritmética, nos termos do supra citado n° 14 do art° 91 ° da LGT, e não à determinação dos valores tributáveis com base em métodos indirectos.

    9- Em concreto, a falta de escrituração das facturas relativas aos clientes "B…………", "C……….", "G………" e "K…….S………. não permitiria integrar a recorrida na al. b) do art° 87° e na al. a) do art° 88°, ambos da LGT e, por consequência, afastar a presunção de veracidade que incide sobre as declarações dos contribuintes que, tal como a recorrida, apresentem a contabilidade organizada, conforme estatui o n° 1 do art° 75° da LGT.

    10 - Ainda quanto ao dever de fundamentação que impende sobre a Administração Tributária quando não aceite total ou parcialmente o laudo do perito independente, o mesmo implica a análise dos critérios indicados pelo perito independente no seu laudo, só podendo considerar-se a Administração Fiscal dispensada de tal dever quando aquele apresente um valor superior ou idêntico àquele que é indicado pelo perito da Administração Fiscal, conforme esclarecem Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa in "Lei Geral Tributária- comentada e anotada- 3ª edição - Setembro 2003 da Vislis editores. O que sucedeu no caso concreto.

    11 - O dever de fundamentação imposto pelo n° 7 do art° 92° da LGT à Administração Fiscal não se pode resumir à mera oposição entre os pareceres do perito Independente e do perito da Administração.

    12- Exige-se, de acordo com a jurisprudência assente pelo STA, que a fundamentação permita "a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do acto para proferir a decisão" (acórdão do STA, de 10/07/2002), ou seja, 13- Tal como explica o Mmo. Juiz "a quo" na sentença recorrida, não analisando nem os argumentos invocados pelo perito independente, nem os métodos indicados pelo mesmo para aferir o volume de negócios da empresa, os quais, no seu entender, obstariam ao recurso a métodos indirectos Nestes termos e nos melhores de direito e com o sempre mui douto suprimento de V. Exas. deve o recurso interposto pela Fazenda Nacional ser considerado improcedente e, consequentemente, confirmada a sentença recorrida.

    O Exmo Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser concedido provimento ao recurso, com base na fundamentação expendida pela recorrente Fazenda Pública.

    Foram colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos.

    B. A fundamentação.

  2. A questão decidenda. A única questão a decidir consiste em saber se o despacho do Director de Finanças de Faro que fixou a matéria tributável por métodos indirectos, com total rejeição do parecer do perito independente, se mostra devida e formalmente fundamentado.

  3. A matéria de facto.

    Em sede de probatório o M. Juiz do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz: A) - A Administração Fiscal...

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