Acórdão nº 0011191 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Fevereiro de 2001

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MARCOLINO
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2001
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto No Tribunal da Comarca de ....., o Digno Magistrado do Ministério Público deduziu acusação contra Jorge..., solteiro, nascido em ../../.., natural da freguesia de ..... e concelho de Vila ....., filho de Manuel... e de Maria..., residente na Rua..., n.º..., ....., Vila ......, imputando-lhe a prática de um crime de ofensas corporais por negligência p. e p. no art. 148º n.º 1 e 3 do Código Penal (versão de 1982).

A lesada Maria de Fátima... deduziu pedido de indemnização civil contra a Companhia de Seguros "...-..., S.A.", pedindo a sua condenação no pagamento da quantia global de 17.665.897$00, e ainda nas despesas médicas, de fisioterapia ou medicamentosas não determinadas a liquidar em execução de sentença.

Por despacho proferido a fls. 229 foi declarado amnistiado o crime de ofensas corporais por negligência, tendo os autos prosseguido para apreciação do pedido de indemnização civil.

A final foi proferida douta sentença que decidiu pela forma seguinte: Condenou a Requerida a pagar à Requerente a quantia de 5.828.000$00, a que acrescem os juros de mora a contar da data da notificação da demandada em 1999-07-07, à taxa legal, sendo 3.000.000$00 de danos patrimoniais, 2.000.000$00 pela incapacidade absoluta com que a vitima ficou afectada de forma permanente na sua vida quotidiana, 1.000.000$00 pelas dores sofridas pela demandante durante o acidente, intervenções cirúrgicas e dores permanentes em virtude das lesões permanentes; e 1.000.000$00 pelas cicatrizes na face e pernas que de forma permanente desfiguram a vítima, tudo reduzido a 70% por se haver entendido ser de 30% a responsabilidade da demandante na produção do acidente.

E condenou a Demandada nas despesas médicas, fisioterepáticas ou medicamentosas ainda não determinadas, a liquidar em execução de sentença.

Inconformadas, interpuseram recurso a Requerente e Requerida.

Aquela conclui da forma seguinte: 1. A sentença em crise não fez a mais correcta apreciação dos factos provados ao apreciar a culpa na eclosão do sinistro.

  1. Não são aplicáveis ao caso as regras da cedência de passagem dispostas nos art.ºs 29º e 30º do C. Estrada em virtude de estar dado como provado que o motociclo estava distante do entroncamento quando a ofendida, na sua embocadura, o avistou.

  2. Da matéria provada resulta que o sinistro se ficou a dever apenas e tão só ao condutor do Kawasaki que, apesar de ter avistado antes o velocípede a mais de meio km de distância, apenas travou a 10 metros dele e não conseguiu imobilizar o veículo e evitar o embate, atenta a velocidade excessiva a que circulava.

  3. Dai que, não atribuindo em exclusivo a culpa ao arguido, a sentença violou o disposto nos art.ºs 483º, e 487º, n.º 2 , ambos do Cód. Civil.

  4. Houve lapso do Julgador no cálculo do valor indemnizatório quanto a lucros cessantes que deve ser fixado em montante não inferior a 6.465.592$00.

  5. A titulo de indemnização por danos morais pelas dores sofridas, deverá ser fixada a quantia de 4.000.000$00, atenta a matéria dada como provada e nos termos do disposto no art.º 496º, n.º 3 do Cód. Civil.

  6. A titulo de danos não patrimoniais e dano patrimonial autónomo, deverá ser ainda fixada uma indemnização não inferior a 6.000.000$00.

  7. A título de dano estético, deve manter-se o valor de 1.000.000$00 atribuído, bem como os valores de 15.000$00 e 25.000$00 atribuídos a título de danos patrimoniais.

  8. O M.º Juiz a quo violou o disposto nos artºs 495º e 496º, n.º 1 e 3, ambos do Cód. Civil, devendo atribuir-se à ofendida, da indicada proveniência, uma indemnização global de 17.505.592$00.

    Respondeu a Demandada, tendo concluído pela forma seguinte: 1. A douta sentença recorrida é primorosa no que toca ao rigor do seu conteúdo, designadamente, em sede de fundamentação jurídica, ao considerar que a Recorrente contribuiu com 30% de culpa pela produção do acidente; 2. A Recorrente provinha de velocípede de uma Rua situada do lado esquerdo atento o sentido de marcha do motociclo na EN 13 - Póvoa - Porto; 3. Era noite e o local publicamente mal iluminado; 4. A Recorrente viu as luzes dos faróis da moto; 5. Nas circunstâncias em que se encontrava a Recorrente, não tinha a mesma condições para calcular se podia ou não efectuar sem perigo a manobra de mudança de direcção à esquerda no seu velocípede, ao avistar a luz do motociclo; 6. A Recorrente não acatou a regra de prioridade de passagem do motociclo, como dispõem os art.ºs 29º e 30º, n.º 1 ambos do Cód. da Estrada; 7. Nesta conformidade, o Meritíssimo Juiz "a quo" não podia ter decidido de modo diferente do que fez, "tornando-a, também, responsável, pelo acidente, numa percentagem que computamos em 30%"; 8. A douta sentença recorrida não violou, assim, qualquer preceito legal, pelo que a Recorrente nela se louva inteiramente; 9. Relativamente aos danos patrimoniais, afigura-se à Recorrida que aplicação, no caso "sub - judice" da fórmula prevista no, aliás, douto Acórdão da Rel. de Coimbra , de 4.4.95, in CJXX, Tomo II, pág. 23, é irrealista; 10. Para cálculo da indemnização resultante da diminuição da força de trabalho, ou capacidade de ganho da Recorrente, o critério mais razoável vem consistindo no recurso às tabelas financeiras usadas para a determinação do capital necessário à formação de uma renda perpétua, correspondente à perda de ganho, de tal modo que, no final da vida activa do lesado, o próprio capital se tenha esgotado; 11. Sendo de prever que a Recorrente viesse a ter uma vida activa que se prolongasse até aos 65 anos de idade, considerando o salário anual da mesma de 758.260$00, atingir-se-ia a indemnização de 3.983.564$00, tendo por base a taxa de juro de 4% - taxa esta indicada pela Recorrente -, a título de lucro cessante; 12. Considerando que o grau de culpa da Recorrente foi de 30% pela produção do acidente, teremos a indemnização de 2.788.495$00, a qual deve ser fixada à mesma; 13. Relativamente aos danos não patrimoniais dir-se-á que, nos presentes autos assistiu-se a uma hipervalorização dos danos morais da Recorrente; 14. Com efeito, não se afigura razoável atribuir a quantia total de 4.000.000$00, reduzidos a 2.800.000$00, atento o grau de 30% de culpa da lesada na produção do acidente, para compensação dos danos não patrimoniais sofridos pela Recorrente; 15. A indemnização arbitrada à Recorrente a tal título afigura-se manifestamente desajustada e fixada em violação dos preceitos legais e dos critérios jurisprudenciais em vigor, pelo que a Recorrida entende que a mesma deverá ser reduzida para montante justo, adequado e razoável, designadamente 2.500.000$00, deduzidos em 30%, atento o grau de culpa da lesada pela produção do acidente; 16. Neste âmbito, a douta sentença recorrida violou o disposto no art.º. 496º. do Cód. Civil.

    A Demandada, por seu turno, concluiu a sua motivação pela forma seguinte: 1. A douta sentença recorrida, na parte objecto do presente recurso, não pode manter-se: 2. As verbas arbitradas à Recorrida relativas aos danos patrimoniais e não patrimoniais, são manifestamente exageradas; 3. Relativamente aos danos patrimoniais, afigura-se à Recorrente que aplicação, no caso "sub - judice" da fórmula prevista no, aliás, douto Acórdão da Rel. de Coimbra , de 4.4.95, in CJXX, Tomo II, pág. 23, é irrealista; 4. Para cálculo da indemnização resultante da diminuição da força de trabalho, ou capacidade de ganho da Recorrida, o critério mais razoável vem consistindo no recurso às tabelas financeiras usadas para a determinação do capital necessário à formação de uma renda perpétua, correspondente à perda de ganho, de tal modo que, no final da vida activa do lesado, o próprio capital se tenha esgotado; 5. Sendo de prever que a Recorrida viesse a ter uma vida activa que se prolongasse até aos 65 anos de idade, considerando o salário anual da mesma de 758.260$00, atingir-se-ia a indemnização de 3.983.564$00, tendo por base a taxa de juro de 4% - taxa esta indicada pela Recorrente -, a título de lucro cessante; 6. Considerando que o grau de culpa da Recorrida foi de 30% pela produção do acidente, teremos a indemnização de 2.788.495$00, a qual deve ser fixada à mesma; 7. Relativamente aos danos não patrimoniais dir-se-á que, nos presentes autos assistiu-se a uma hipervalorização dos danos morais da Recorrida; 8. Com efeito, não se afigura razoável atribuir a quantia total de 4.000.000$00, reduzidos a 2.800.000$00, atento o grau de 30% de culpa da lesada na produção do acidente e os seus antecedentes pessoais, para compensação dos danos não patrimoniais sofridos pela Recorrida; 9. A indemnização arbitrada à Recorrente a tal título afigura-se manifestamente desajustada e fixada em violação dos preceitos legais e dos critérios jurisprudenciais em vigor, pelo que a Recorrida entende que a mesma deverá ser reduzida para montante justo, adequado e razoável, designadamente 2.500.000$00, deduzidos em 30%, atento o grau de culpa da lesada pela produção do acidente; 10. A douta sentença recorrida violou o disposto nos artºs 562º, 563º e 564º, 494º e 496º do Cód. Civil.

    Respondeu a Recorrida dizendo dever ser negado provimento ao recurso da Demandada.

    Colhidos os vistos legais e realizada a audiência de discussão e julgamento, cumpre apreciar e decidir.

    Está assente a seguinte matéria de facto: 1. No dia 13 de Janeiro de 1995, cerca das 7 horas e 45 minutos, no Lugar da Varziela, na freguesia de Arvore, concelho de Vila do Conde ocorreu um acidente de viação em que foram intervenientes o velocípede sem motor de matrícula 2...-..-.., pertencente à ofendida, e por esta conduzido e o motociclo de marca Kawasaki com a matricula ..-..-CL, pertencente à "... - Aluguer de Longa Duração, S.A" e conduzido por Jorge....

  9. A Maria de Fátima... conduzia o seu velocípede com luzes numa rua que vem entroncar do lado esquerdo, atento o sentido Póvoa - Porto, junto ao KM 19 na EN 13, pela qual pretendia passar a circular.

  10. Quando chegou ao entroncamento a demandante parou e viu do seu lado...

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