Acórdão nº 9220441 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 03 de Junho de 1992
Magistrado Responsável | PEREIRA MADEIRA |
Data da Resolução | 03 de Junho de 1992 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam na Relação do Porto I - A Excelentíssima Magistrada do Ministério Público junto do Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão deduziu contra Joaquim .......... identificado nos autos, a seguinte acusação: " Indiciam os autos que com data de 30/09/89, o arguido preencheu assinou e entregou a V........, o cheque nº 9004897769, sobre a União de Bancos Portugueses, no montante de 2288000 escudos ( dois milhões duzentos e oitenta e oito mil escudos ) para pagamento de uma dívida. Apresentado a pagamento em instituição bancária, sita nesta cidade e comarca foi devolvido por falta de provisão em 04/10/89, conforme declaração formal aposta no verso do aludido título. Ao abrir mão do cheque, o arguido tinha perfeito conhecimento de que não dispunha na sua conta bancária de fundos bastantes permissivos do integral pagamento daquele e, não obstante, não se coibiu de o colocar em circulação. Agiu deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta para além de censurável era proibida por lei. Cometeu, assim, pelo exposto, um crime de emissão de cheque sem provisão previsto e punido pelos artigos 23 e 24, ns. 1 e 2, alínea c) do Decreto 13004 de 12/01/27 na redacção do Decreto-Lei 400/82, de 23/09 ". Houve lugar a julgamento e sentença condenatória com absolvição do pedido cível nesta parte transitada em julgado mas na sequência de recurso interposto, o julgamento foi anulado e ordenado o reenvio do processo para novo julgamento quanto à totalidade do objecto do processo a efectuar pelo tribunal colectivo nos termos do artigo 431 do Código de Processo Penal. O Excelentíssimo Juiz do Tribunal de Círculo de Santo Tirso a quem o processo foi remetido, exarou então o seguinte despacho com data de 9 de Abril de 1992: " Em face do teor do requerimento - acusação de fls. 30, em que, em termos de matéria de facto, não está alegado que a conduta do arguido causou prejuízo patrimonial ao ofendido, e do disposto nos artigos 2, n. 2 do Código Penal e 11 da alínea a) do Decreto-Lei 454/91 de 28 de Dezembro, declaro extinto o procedimento criminal contra o ofendido Joaquim .............. nestes autos, arquivando-se estes ". Inconformado com o assim decidido o Senhor Procurador da República junto daquele Tribunal de Círculo interpôs tempestivo recurso cuja motivação essencial é constituída pela transcrição de uma " directiva " da Procuradoria Geral da República dirigida aos Magistrados e Agentes do Ministério Público e que é rematado com as seguintes conclusões: 1- O recurso aos critérios de interpretação das normas de direito penal permite compreender a presença do elemento " prejuízo patrimonial " na definição do tipo fundamental de crime vertido no artigo 24 do Decreto n. 13004: congénito à actuação tipicamente descrita, este elemento especifica-se na causa de agravação da pena prevista no n. 2, alínea b) do referido preceito. 2- Pode, assim, dizer-se que o " prejuízo patrimonial " é, na vigência do Decreto 13004, elemento relevante para a incriminação e, como tal, carecido de investigação. 3- Deste modo, o novo tipo descrito no artigo 11 n. 1 do Decreto-Lei n. 454/91 representa, não uma ampliação da incriminação, por adição de um elemento novo, mas uma redução da previsão anterior, apenas retirando relevância criminal aos casos de comprovada ausência de " prejuízo patrimonial ". 4- Deverá, assim, entender-se que o novo diploma apenas opera a descriminalização nos casos em que se prove inexistir " prejuízo patrimonial ". 5- A acusação deduzida pelo Ministério Público contém os elementos essenciais do tipo de crime previsto e punível pelos artigos 23 e 24 do Decreto 13004 de 12 de Janeiro de 1927, diploma vigente à data da prática dos factos. 6- Dada a fase em que actualmente se encontra o processo, só em sede de julgamento é possível apurar se, no caso, inexiste " prejuízo patrimonial ". 7- O douto despacho recorrido, ao concluir implicitamente pela descriminalização da conduta imputada ao arguido, por na acusação não constar a especificação do elemento " prejuízo patrimonial ", viola, por erro de interpretação, o disposto nos artigos 2, n. 2 do Código Penal, 23 e 24 do Decreto 13004 de 12 de Janeiro de 1927, e artigo 11 n. 1, do Decreto-Lei 454/91 de 28 de Dezembro. 8- Consequentemente, deverá ser revogado e substituído por outro em que se designe dia para julgamento, reservando-se para a audiência de julgamento a averiguação da inexistência de " prejuízo patrimonial ". Respondeu o arguido manifestando-se pelo bem fundado do despacho em crise. Nesta Instância, o Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto secunda o ilustre recorrente. II - Colhidos os vistos legais cumpre decidir. 2.1- O problema posto é uma genuína questão de aplicação da lei penal no tempo. E resulta da entrada em vigor, a 28 de Março de 1992, do Decreto-Lei 454/91 de 28/XII que revogando tacitamente os artigos 23 e 24 do Decreto 13004 de 12/01/27, emoldurou assim o crime de emissão de cheque sem provisão: " 1- Será condenado nas penas previstas para o crime de burla, observando-se o regime geral de punição deste crime, quem, causando prejuízo patrimonial: a) Emitir e entregar a outrém cheque de valor superior ao indicado no artigo 8 que não for integralmente pago por falta de provisão, verificada nos termos e prazos da Lei Uniforme Relativa ao Cheque (...) " No artigo 8, n. 1 do citado Decreto-Lei estatuiu-se a a...
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