Acórdão nº 07S672 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Setembro de 2007

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução12 de Setembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 29 de Abril de 2005, no Tribunal do Trabalho de Matosinhos, AA, com o patrocínio do Ministério Público, intentou a presente acção, com processo especial, emergente de acidente de trabalho, contra COMPANHIA DE SEGUROS Empresa-A, e Empresa-B, na qual pede que as rés sejam condenadas, conforme a sua responsabilidade, a pagar as indemnizações, pensão, prestação suplementar e subsídio por elevada incapacidade permanente devidos pelas lesões resultantes do acidente de trabalho, ocorrido em 24 de Março de 2004, quando prestava a actividade de electricista em favor da segunda ré, cuja responsabilidade infortunística estava totalmente transferida para aquela seguradora.

Requereu também exame por junta médica, por discordar da incapacidade atribuída pelo perito médico do tribunal.

A empregadora contestou, alegando que o acidente dos autos não resultou de qualquer inobservância de regras de segurança no trabalho e que a sua responsabilidade estava transferida para a ré seguradora, tendo invocado, ainda, a descaracterização do acidente, por este ter resultado de culpa do próprio sinistrado.

Por sua vez, a seguradora contestou, sustentando que o acidente de trabalho se ficou a dever à violação de regras de segurança por parte da empregadora, que era a responsável principal pela reparação, sendo a sua responsabilidade subsidiária.

Foi proferido despacho saneador, desdobrando-se o processo para realização de exame por junta médica - no respectivo apenso foi decidido fixar ao sinistrado a IPP de 63,16% com incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual -, com selecção da matéria de facto pertinente e, após o julgamento, exarou-se sentença que julgou a acção parcialmente procedente, absolvendo a ré empregadora do pedido e condenando a ré seguradora a pagar ao autor a pensão anual e vitalícia de 7.372,84 euros, a quantia de 7.858,26 euros a título de indemnização relativa a 306 dias de ITA, o subsídio de elevada incapacidade, de uma só vez, no montante de 3.999,46 euros, a quantia de 40,80 euros de despesas de deslocação e juros de mora à taxa legal sobre as prestações em atraso, bem como pagar ao Hospital de S. João a quantia de 13.595,38 euros, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação.

  1. Inconformados, o autor e a ré seguradora apelaram, defendendo que o acidente ocorreu exclusivamente por inobservância das regras de segurança por parte da entidade patronal do sinistrado.

    Conhecendo dos recursos, a Relação entendeu que, face à exiguidade dos factos provados, não se mostravam configurados todos os pressupostos determinantes da responsabilidade da ré empregadora, para efeitos da aplicação dos artigos 18.º, n.º 1, e 37.º, n.º 2, da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, tendo julgado as apelações improcedentes e confirmado a sentença recorrida.

    É contra esta decisão da Relação que o autor e a ré seguradora se insurgem, mediante recursos de revista, ao abrigo das seguintes conclusões: RECURSO DO AUTOR: «1ª As razões da nossa discordância em relação ao douto acórdão recorrido resultam de considerarmos que o acidente de trabalho teve na sua origem a violação culposa pela empregadora do disposto nos arts. 3°, al. f), 103°, 104° e 151°, da Portaria nº 53/71, de 03-02, na redacção dada pela Portaria nº 702/80, de 22-09[,] e que, em consequência, a reparação devida seria a prevista no art. 18° da Lei nº 100/97, de 13-09; 2ª Segundo a matéria de facto provada, o sinistrado deslocava-se quase diariamente num passadiço, situado a 12m de altura do solo, sem qualquer corrimão do lado interior e apenas com a largura de l,35m, para efectuar a reparação eléctrica duma ponte rolante; 3ª Ainda segundo a matéria de facto provada, o sinistrado fazia essa deslocação habitual, por um passadiço estreito, só com um corrimão de um dos lados e a grande altura, sem qualquer equipamento de protecção, quer colectiva ou individual, que o protegessem do risco de quedas em altura, o que a empregadora bem sabia suceder; 4ª Mais grave, ainda, é o facto de a empregadora não só não cumprir a sua obrigação legal (cf. art. 8°, nº 1, do DL nº 441/91, de 14.11 e art. 151°, nº 1 da Portaria nº 53/71) de identificar e prevenir os riscos de quedas em altura a que o sinistrado estava sujeito (não colocara equipamento de protecção colectiva contra quedas), como não criar as condições necessárias para que o sinistrado pudesse utilizar os equipamentos de protecção individual - os cintos de segurança - existentes na empresa, porque não instalara linha de vida onde o sinistrado pudesse fixar um cinto de segurança ou arnês; 5ª É que, como está provado na sentença que consta da certidão que a empregadora juntou aos autos, os cintos e arneses de segurança, que a empregadora possui, não se adaptam às situações de marcha ao longo do passadiço; 6ª Discorda-se, respeitosamente, do douto acórdão a quo quando nele se decidiu que, embora tivesse havido violação do disposto no art. 151°, nº 1 da Portaria nº 53/71, não estava provado o nexo de causalidade entre esta violação e o acidente; e, que havia um equipamento de protecção, que era o corrimão exterior do passadiço; 7ª Na verdade, a consideração do corrimão, que o passadiço tinha de um dos lados, como um «equipamento de protecção», não se pode aceitar para os trabalhadores que, como o sinistrado, praticamente todos os dias tinham de atravessar o passadiço e que, pela notória habituação ao perigo, necessariamente se sentiriam já tão seguros a andar no passadiço como em solo firme e não se iriam agarrar ao corrimão; 8ª Acresce que, está provado que a queda que o sinistrado deu de 12 metros de altura foi devida a desequilíbrio, quando o sinistrado, sem cinto de segurança, porque este não era utilizável para situações de marcha naquele passadiço, se deslocava no passadiço; 9ª Logo, é manifesto o nexo de causalidade entre a falta de cinto de segurança e o acidente, porque não cremos que seja sustentável que a falta do cinto de segurança, prescrito no art. 151°, nº 1 da Portaria nº 53/71 era uma condição de todo inadequada para prevenir a queda de 12m de altura, só tendo esta queda ocorrido por circunstâncias excepcionais e que não eram de todo em todo previsíveis (e o Código Civil consagrou a doutrina da causalidade adequada, na formulação negativa de Enneccerus-Lehman, nos termos da qual a inadequação de uma dada causa para um resultado deriva da sua total indiferença para a produção dele, que, por isso mesmo, só ocorreu por circunstâncias excepcionais ou extraordinárias); 10ª Finalmente, a violação pela empregadora do estatuído no art. 8°, nº 1, do DL nº 441/91 e no art. 151°, nº 1 da Portaria nº 53/71 foi culposa, porque um homem normal, em face do circunstancialismo próprio do caso concreto, facilmente se aperceberia que um trabalhador poderia desequilibrar-se ao atravessar o passadiço, e dele dar um queda, da altura de 12 m, e não deixaria de providenciar pela colocação de equipamentos de protecção colectiva (como redes) ou individual (como a linha de vida, necessária para prender um cinto de segurança), aptos a prevenir tal acidente de trabalho; 11ª Por tudo isto, entendemos que a matéria de facto assente integra um dos casos especiais de reparação, previstos no art. 18°, nº 1, da Lei nº 100/97, pelo que o douto acórdão a quo violou o disposto neste preceito, bem como o estatuído nos arts. 3°, al. f), 103°, 104° e 151°, da Portaria nº 53/71, na redacção dada pela Portaria nº 702/80, e, ainda, o preceituado no art. 8°, nº 1, do DL nº 441/91; 12ª Destarte, o douto acórdão recorrido deve ser revogado e, em sua substituição, deve condenar-se a empregadora na reparação agravada do acidente de trabalho e a seguradora na reparação normal, subsidiariamente, conforme prescrevem os arts. 18°, nº 1, al. a) e 37°, nº 2, da Lei nº 100/97, com o que se fará a habitual JUSTIÇA.» A ré empregadora contra-alegou, defendendo a confirmação do julgado.

    RECURSO DA RÉ SEGURADORA: «1) Provado que o sinistrado circulava no passadiço de uma ponte rolante, só protegida com varandim do seu lado exterior, a 12 metros de altura, em risco de queda livre, 2) Sem que tal ponte rolante dispusesse na ocasião de linha de vida para fixação de arnês ou cinto de segurança, 3) Quando o autor - que não usava cinto de segurança nem tinha onde o amarrar quando em circulação - caiu ao solo; 4) Assim, a entidade patronal não preveniu um efectivo risco de queda, 5) Por não ter providenciado pelos elementos de fixação do cinto de segurança, 6) O que foi causa da queda do autor ao solo e dos ferimentos que sofreu; 7) A entidade patronal violou as prescrições...

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