Acórdão nº 02834/06.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 05 de Julho de 2007

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução05 de Julho de 2007
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO MINISTÉRIO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA E ENSINO SUPERIOR (abreviadamente MCTES) e MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO (abreviadamente ME), devidamente identificados nos autos, inconformados vieram, cada um, interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 28/02/2007, que deferiu o pedido de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias que havia sido deduzido por C…, igualmente identificada nos autos, e, consequentemente, intimou “… 1.ª entidade requerida – Ministério da Educação – para possibilitar à requerente a realização de novo exame na disciplina de Química (código 642), no prazo máximo de 15 dias úteis a contar da notificação da sentença…” e “… 2.ª entidade requerida – Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior – para proceder à criação de uma vaga adicional num dos cursos de medicina a que a requerente se candidatou (pela ordem de preferência indicada na candidatura) e a nela colocar a mesma desde que esta obtenha, em função da classificação obtida no segundo exame de química realizado, nota de candidatura igual ou superior ao último candidato a esse curso e estabelecimento de ensino na 1.ª fase do concurso nacional de acesso ao ensino superior em 2006 …”.

Formula o 1.º recorrente jurisdicional (“MCTES”), nas respectivas alegações (cfr. fls. 367 e segs.

- paginação processo em suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário), as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

  1. Nem o Decreto-Lei n.º 147-A/2006 de 31 de Julho nem o Despacho do Senhor Secretário de Estado da Educação n.º 16078-A/2006 de 1 de Agosto de 2006 foram geradores de restrição de direitos, liberdades ou garantias; b) Privilegiaram-se os factores de segurança e pressupostos de igualdade jurídica, restabelecendo-se a igualdade de oportunidades entre os candidatos da 1.ª fase, desprotegidos dos seus direitos por factores externos, criados pelo próprio Estado e que lhes não eram de forma alguma imputáveis, relativamente aos da 2.ª fase, em nada afectando ou minorando os restabelecendo-se a igualdade de oportunidades entre os candidatos da 1.ª fase, desprotegidos dos seus direitos por factores externos, criados pelo próprio Estado e que lhes não eram de forma alguma imputáveis, relativamente aos da 2.ª fase, em nada afectando ou minorando os direitos destes últimos.

  2. A retroactividade terá o beneplácito constitucional sempre que razões de interesse geral ou de conformação social, como foi o caso, a reclamem …”.

Formula o 2.º recorrente jurisdicional (“ME”), nas respectivas alegações (cfr. fls. 375 e segs.

), as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

A - A forma processual utilizada é inidónea para efeitos de tutela das pretensões jurídicas da recorrida, porquanto não estamos em presença de direitos, liberdades ou garantias, nem tão pouco de direitos de natureza análoga.

Sem conceder, e ainda que se entenda que estamos perante um direito de natureza análoga, o certo é que: B - O Decreto-Lei n.º 147-A/2006, de 31 de Julho, e o subsequente Despacho n.º 16078-A/2006, de 2 de Agosto, não são restritivos de direitos, liberdades e garantias.

C - Nestes termos, não lhes é aplicável a proibição de terem efeito retroactivo, como previsto no artigo 18.º, n.º 3, da CRP.

D - A adopção destas medidas legislativas, não pôs em causa os princípios da protecção da confiança e da segurança jurídica, corolários de um Estado de Direito, visando-se precisamente garantir o princípio da igualdade e do acesso ao ensino superior em igualdade de oportunidades relativamente aos alunos que realizaram o exame de Química (código 642) na 1.ª fase (que foram prejudicados gravemente pelas circunstâncias excepcionais identificadas no Despacho n.º 16078-A/2006, de 2 de Agosto, e que manifestamente não lhes eram imputáveis), relativamente aos alunos que realizaram este exame na 2.ª fase, em nada afectando ou diminuindo os direitos destes últimos.

E - Assim sendo, considera-se que também não foram violados os artigos 2.º, 13.º, 74.º, n.º 1, e 76.º, n.º 1, da CRP.

F - A douta Sentença recorrida, ao decidir nos termos do entendimento nela perfilhado, é que ofendeu o estatuído nos artigos 18.º, n.º 3, 2.º, 13.º, 74.º, n.º 1, e 76.º, n.º 1, da CRP …”.

A ora recorrida notificada não apresentou contra-alegações (cfr. fls. 402 e segs.

).

O Ministério Público (MºPº) junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto nos arts. 146.º e 147.º ambos do CPTA veio emitir pronúncia no sentido da improcedência de ambos os recursos jurisdicionais (cfr. fls. 508/509), posicionamento esse que, após contraditório, não mereceu qualquer resposta (cfr. fls. 528 e segs.

).

Sem vistos, dado o disposto no art. 36.º, n.ºs 1, al. d) e 2 do CPTA, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

  1. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos recorrentes, sendo certo que, pese embora por um lado, o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 690.º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA o tribunal de recurso em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a sentença recorrida, porquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objecto da causa, conhecendo de facto e de direito”, pelo que os recursos jurisdicionais são “recursos de ‘reexame’ e não meros recurso de ‘revisão’” (cfr. Prof. J. C. Vieira de Andrade in: “A Justiça Administrativa (Lições)”, 8ª edição, págs. 459 e segs.; Prof. M. Aroso de Almeida e Juiz Cons. C. A. Fernandes Cadilha in: “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, 2.ª edição revista, págs. 850 e 851, nota 1; Dr.ª Catarina Sarmento e Castro em “Organização e competência dos tribunais administrativos” - “Reforma da Justiça Administrativa” – in: “Boletim da Faculdade de Direito Universidade de Coimbra - Stvdia ivridica 86”, págs. 69/71).

    As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar: I) Se a decisão judicial recorrida enferma de erro de julgamento quando considerou improcedente a excepção de inidoneidade do meio processual empregue suscitada pelo “ME”, fazendo indevida aplicação do regime decorrente do art. 109.º do CPTA [cfr. conclusão a) do recurso jurisdicional do Ministério da Educação]; II) Se a mesma decisão judicial ao julgar procedente a pretensão da aqui recorrida incorreu em erro de julgamento infringindo o preceituado nos arts. 02.º, 13.º, 18.º, n.º 3, 74.º, n.º 1 e 76.º, n.º 1 da CRP - fundamento material de ambos os recursos jurisdicionais [cfr. alegações e demais conclusões supra reproduzidas].

  2. FUNDAMENTOS 3.1.

    DE FACTO Resultou apurada da decisão judicial recorrida a seguinte factualidade: I) No ano lectivo 2005/2006, a requerente frequentou e concluiu o 12.º ano do ensino secundário do Curso Geral do 1.º Agrupamento (Área Científica), tendo obtido a classificação final de 19 (dezanove) valores (cfr. doc. 1 junto com a petição inicial).

    II) Pretendendo candidatar-se ao ensino superior, e dispondo, para o efeito, da classificação final do ensino secundário de 186 pontos (na escala de 0 a 200), a requerente realizou exames nacionais a várias disciplinas (cfr. doc. 2 junto com a petição inicial).

    III) O ingresso no curso de Medicina, em todas as faculdades onde se lecciona essa licenciatura, depende da realização e aprovação das provas de ingresso em Biologia e Química bem com a aprovação no pré-requisito de “Comunicação interpessoal”.

    IV) A requerente realizou o referido pré-requisito, tendo ficado apta (cfr. doc. 2 junto com a petição inicial).

    1. Na 1.ª fase do calendário de exames nacionais realizou os exames às seguintes disciplinas (cfr. doc. 2 junto com a petição inicial): - Biologia (código 602), com a classificação de 173 pontos (na escala de 0 a 200); - Matemática (código 635), com a classificação de 158 pontos (na escala de 0 a 200); - Português (código 639), com a classificação de 138 pontos (na escala de 0 a 200).

      VI) Na 2.ª fase do calendário de exames nacionais realizou o exame à disciplina de Química (código 642), tendo obtido a classificação de 145 pontos (na escala de 0 a 200) (cfr. doc. 2 junto com a petição inicial).

      VII) A requerente concorreu ao ensino superior na 1.ª fase do Concurso Nacional de Acesso de 2006, tendo-lhe sido atribuído o número de candidatura 4073 (cfr. doc. 2 junto com a petição inicial).

      VIII) Nesse concurso, candidatou-se, por ordem decrescente de preferência, aos seguintes cursos de Medicina (cfr. doc. 2 junto com a petição inicial): - 1.ª Opção - Curso de Medicina, da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto; - 2.ª Opção - Curso de Medicina, do Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar da Universidade do Porto; - 3.ª Opção - Curso de Medicina, da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa; - 4.ª Opção - Curso de Medicina, da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra; - 5.ª Opção - Curso de Medicina, da Universidade da Beira Interior.

      IX) A nota de candidatura da requerente a todos aqueles cursos de Medicina, calculada nos termos das disposições legais aplicáveis, era de 172,5 pontos (na escala de 0 a 200) e de 176,6 pontos no caso da candidatura à Universidade da Beira Interior (cfr. doc. 2 junto com a petição inicial).

    2. Feita a seriação e anunciadas as colocações, as notas de ingresso de cada um daqueles cursos na 1.ª Fase do aludido Concurso foram as seguintes (cfr. doc. 4 junto com a petição inicial): - Curso de Medicina, da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto – 181,0 pontos; - Curso de Medicina, do Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar da Universidade do Porto – 181,5 pontos; - Curso de Medicina...

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