Acórdão nº 10881/2005-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 31 de Maio de 2007

Magistrado ResponsávelFERNANDA ISABEL PEREIRA
Data da Resolução31 de Maio de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: 1. Relatório: P, S.A., intentou, em 19 de Setembro de 2002, no Tribunal Cível da Comarca de Lisboa a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra N, S.A., M, S.A. e C, S.A., alegando, em síntese, que, no exercício da sua actividade comercial de prestação de serviços na área da publicidade, celebrou um contrato com as Rés, nos termos do qual, mediante o pagamento de determinadas quantias, a Autora se comprometeu a obter junto da RTP espaço publicitário para promoção dos produtos da mesmas Rés, o que cumpriu, não tendo as Rés procedido ao pagamento do preço dos serviços prestados pela Autora, pelo que pediu a condenação das Rés no pagamento da quantia de € 593 569,54, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento.

Pediu ainda que as Rés fossem condenadas a pagar-lhe a indemnização pelos prejuízos decorrentes da revisão do preço na publicidade contratada na RTP, na medida da diferença entre o preço acordado entre a Autora e a RTC, e o preço que vier a resultar de tal revisão. Reclamou ainda a indemnização a liquidar em execução pelos prejuízos que o não cumprimento dos objectivos do contrato fechado entre a Autora e a RTC para emissão da publicidade das Rés na RTP causou na imagem da Autora no mercado e ainda pela previsível diminuição da capacidade negocial da mesma Autora no mercado publicitário de televisão.

As Rés contestaram alegando, em resumo, que nem toda a publicidade emitida a partir de 2 de Abril de 2002 foi executada de acordo com a sua vontade e conforme ao estabelecido no contrato, antes tendo sido imposta por determinação da RTP que, de forma unilateral, se recusou a transmitir a campanha publicitária das Rés nos moldes por estas gizado, pelo que o preço pela transmissão de tal publicidade não pode ser devido pelas Rés, concluindo pela improcedência da acção.

Em reconvenção alegaram, em suma, que foi a Autora que não cumpriu os seus deveres contratuais e, por isso, é responsável pelos prejuízos causados às Rés, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de € 272 046,01, a título de indemnização acrescida da quantia que se liquidar em execução.

Mais pediram a condenação da Autora, como litigante de má-fé, em multa e indemnização.

Na réplica a Autora impugnou a matéria da reconvenção e concluiu pela sua improcedência, bem como do pedido de condenação por litigância de má fé.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, consequentemente, condenou as Rés a pagarem, solidariamente, à Autora a quantia de € 593 569.50, acrescida de juros vencidos desde a data de vencimento das facturas peticionadas e vincendos até integral pagamento, à taxa legal, absolvendo-as dos restantes pedidos. Absolveu a Autora do pedido reconvencional, bem como do pedido de condenação como litigante de má-fé.

Desta sentença apelaram as Rés.

Alegaram e formularam, em resumo, as seguintes conclusões: 1ª Deverá ser conhecida e declarada a nulidade da sentença proferida pelo Tribunal "a quo", por força do disposto nos art°s 659°, n° 3 e 668°, n°1, b) do C.P.C., procedendo, em todo o caso esse Venerando Tribunal ao conhecimento do objecto da apelação, nos termos do disposto no art° 715 do C.P.C. e assim, 2ª Ser concedido provimento ao presente recurso de Apelação, e, consequentemente, revogada a sentença recorrida, e a mesma substituída por Acórdão que proceda, ao abrigo do disposto no art° 712° n°s 1, alíneas a) e b) do CPC, à alteração da decisão do Tribunal sobre a matéria de facto passando a figurar: i. na resposta ao quesito 1°: "Não provado", sendo, concomitantemente, retirado o Facto n° 20. do elenco dos "Factos" da Sentença sub judice; ii. na resposta ao quesito 3°: "Provado apenas que este desconto foi concedido à Autora atendendo ao volume de publicidade adquirida", sendo, concomitantemente, alterado em conformidade o Facto n° 22. da epígrafe "Factos" da Sentença sub judice; iii. na resposta ao quesito 7°: "Provado", devendo, concomitantemente, ser adicionado aos "Factos" da Sentença sub judice novo facto (com o n° 33.) com o seguinte teor: "A Autora comprometeu-se a envidar esforços no sentido das Rés virem a ser compensadas pela atitude da RTP de suspender a emissão do filme publicitário da COPA Z"; e iv. na resposta ao quesito 15°: "Não Provado", sendo, concomitantemente, retirado o Facto n° 31. do elenco dos "Factos" da Sentença sub judice; 3ª A Autora havia declarado e garantido, expressamente, na cláusula 3ª n° 2 do contrato de fls. 22-28, "que se encontra dotada dos meios logísticas, técnicos e humanos necessários à boa execução do presente contrato, bem como que dispõe de saber fazer e de conhecimentos especializados na área (...) de planeamento estratégico, concepção e produção dos suportes de comunicação adequados à emissão televisiva " 4ª E, em cumprimento das suas obrigações contratuais, a Autora, em documento entregue às Rés e que se encontra junto aos autos a fls...:, apoiou e subscreveu a expressão (designada por "pack shot" ou frase remate) que viria a ser objecto de censura por parte do IC , tendo afirmado: "A «selling idea» fritos menos gordos é muito acertada pois contempla em si dois eixos fundamentais: Assumir os fritos como comportamento tradicional na alimentação das famílias portuguesas (Batatas fritas); Isolar o elemento «gordura» como factor de diferenciação no segmento dos óleos alimentares.

  1. Não pode, pois, a Autora - sob pena de incorrer em abuso de direito, na modalidade de "venire contra factum proprio " - assumir postura de absoluto distanciamento e indiferença relativamente a um facto - anúncio publicitário - para o qual contribuiu e para o qual estava contratualmente obrigada a prestar consultoria.

  2. Nos termos do n.° 2 da cláusula 2ª do contrato sub judice - norma contratual, esta, que a Mmª Juíza "a quo" desprezou em absoluto - as partes outorgantes convencionaram que "as Segundas Outorgantes [aqui Recorrentes] não serão responsáveis, seja a que título for, perante a P ou perante a RTP, caso no ano de 2002 o volume de publicidade televisiva previsto no número anterior não venha a ser concretizado por causa imputável, directa ou indïrectamente, por acção ou por omissão, à P e/ou à RTP, bem como por causa de força maior devidamente comprovada. "; 7ª Assim, perante a conduta da RTP - de suspensão unilateral da emissão do filme publicitário - às Rés cabia, desde logo o direito (nos termos daquele n° 2 da cláusula 2ª) de não cumprir o volume de publicidade televisiva previsto no contrato; 8ª A decisão da RTP constitui, nos termos da cláusula 2ª, n° 2, do contrato, "causa imputável, directa ou indirectamente, por acção ou por omissão, à P e/ou à RTP" justificativa do não cumprimento do volume de publicidade contratado 9ª Este direito das Rés/recorrentes não fica afastado, nem de qualquer forma precludido ou extinto, pelo facto de estas terem tentado, num primeiro momento - surpreendidas pela conduta ilícita da RTP - "salvar" o contrato mediante a alteração do filme, procedendo à mera "substituição da expressão «FRITOS MENOS GORDOS, MAIS SECOS, MAIS SAÚDE» pelas seguinte «NÃO SEJA GORDUROSA, FRITE COM MIMO, SEJA FELIZ»" (Facto 24.) 10ª Ao efectuar pedido de "suspensão da inserção de filmes da campanha" "enquanto a C e a P não chegassem a acordo sobre investimentos/inserções/GRP's - "pedido que foi de imediato executado pela P" (facto n° 11) - a Ré/recorrente C promoveu uma efectiva suspensão temporária de todos os efeitos do contrato, que foi aceite pela Autora/recorrida, pelo que a suspensão, pelas Rés, do cumprimento da sua contraprestação - de pagamento do preço dos serviços da Autora/recorrida - terá de ser considerada legítima.

  3. As Rés/recorrentes nunca manifestaram à Autora qualquer vontade de resolver o contrato (o que lhes era permitido ao abrigo do n° 2 da cláusula 2ª), apenas se tendo limitado a promover a suspensão temporária da execução do mesmo, tendo fixado como termo de tal suspensão a obtenção de acordo acerca dos "investimentos/inserções/GRP's" - o que foi aceite pela Autora/recorrida.

  4. A suspensão acordada entre as partes, ocorreu devido ao facto de, conforme a Mma Juíza "a quo" bem refere, após a alteração imposta pela conduta da RTP - de suspender a emissão do filme do óleo MIMO - as Rés se terem visto "confrontadas com uma situação em que estavam a despender montantes consideravelmente elevados sem obter o resultado que era suposto obter com o anúncio publicitário - uma reacção favorável do público que iria repercutir-se nas vendas do óleo «MIMO» "; 13ª Encontrando-se a execução do contrato suspensa - a pedido das Rés/recorridas, e com a pronta aceitação da Autora - até que fosse alcançado acordo acerca dos "investimentos/inserções/ GRP's, era absolutamente ilegítimo que a Autora continuasse a emitir e remeter àquelas, para pagamento, facturas devidas pelos serviços que não se encontrava a prestar; 14ª Nos termos do estipulado na cláusula 6ª do contrato, a contraprestação das Rés (pagamento do preço) reporta-se exclusivamente aos "serviços prestados em execução do presente contrato (…)", pelo que só os serviços efectivamente prestados deverão ser objecto de retribuição, o que, aliás, mais não é senão a transposição para o contrato das normas legais, nomeadamente do disposto no art° 1158°, n° 2 do Código Civil.

  5. Termos em que, ao não ter efectuado o pagamento das facturas, durante o período em que a execução do contrato se encontrava, temporariamente, suspensa por acordo das partes, as Rés não incorreram em qualquer incumprimento das suas obrigações contratuais, pelo que a resolução do contrato levada a cabo pela Autora carece de fundamento, sendo consequentemente ilegítima.

  6. Muito embora corresponda à verdade que na data em que as Rés pediram a suspensão da execução do contrato, os montantes pagos por estas era inferior aos GRP's já utilizados (sem prejuízo de grande parte destes deverem ser considerados...

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