Acórdão nº 5461/2004-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 22 de Maio de 2007
Magistrado Responsável | ARNALDO SILVA |
Data da Resolução | 22 de Maio de 2007 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam os juízes, em conferência, na 7.ª Secção Cível, do Tribunal da Relação de Lisboa: I.
Relatório: 1. Por apenso à execução contra si instaurada pelo IFADAP - Instituto de Financiamento e apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e Pescas, veio José […] deduzir embargos de executado.
Para o efeito alegou que existe uma situação de litispendência entre a acção executiva a que os presentes embargos respeitam e a execução n.º 0000/00, e que o contrato de fiança com base no qual foi demandado é nulo.
E conclui pedindo a sua absolvição da instância, ou, se assim se não entender, a declaração de nulidade do contrato de fiança invocado pelo exequente contra o embargante, ou, se assim se não for, a anulação do contrato de fiança, e, em qualquer caso, que se declare que o documento apresentado pelo exequente para comprovar a alegada fiança não obriga o embargante, ou, caso não procedam nenhum dos pedidos anteriores, que se declare que não cabe ao embargante o reembolso das quantias pagas ao executado, nem o pagamento das restantes importâncias peticionadas, e, em qualquer caso, que se declare que não compete ao embargante efectuar qualquer pagamento dos que foram pedidos pelo exequente.
* 2. Na sua contestação, o embargado diz que não se verifica a situação de litispendência, e impugna os factos alegados, e conclui pela improcedência dos embargos de executado. * 3. No despacho saneador foi julgada improcedente a excepção dilatória da litispendência.
Os embargos prosseguiram os seus posteriores termos, tendo sido proferido sentença que julgou os embargos improcedentes, e, em consequência, absolveu deles o embargado e condenou o embargante nas custas.
* 4. Inconformado, apelou o embargante. Nas suas alegações, conclui: 1.ª Tendo ficado provado que o apelante não sabe ler nem escrever (mas apenas desenhar as letras do seu nome) a subscrição do documento de fiança só o obrigaria se fosse feita perante notário, depois de lido o documento ao subscritor; 2.ª Não se provou que o ajudante do cartório notarial que fez o reconhecimento da assinatura tenha lido o documento ao subscritor; 3.ª Essa menção tinha que constar do reconhecimento e não era admissível prova testemunhal a respeito dessa matéria; 4.ª O facto de não se ter provado que ninguém leu o documento ao recorrente ou lhe tenha explicado o seu conteúdo não significa que se tenha provado o contrário; 5.ª Assim, a alegada fiança não é válida; 6.ª O IFADAP não podia ter aprovado o projecto apresentado pelo beneficiário; 7.ª A aprovação do financiamento é ilegal; 8.ª Essa circunstância invalidaria também o contrato de fiança, mesmo que o apelante não tivesse razão quanto às conclusões 1.ª a 5.ª; 9.ª Ainda que assim não fosse, não assistiria ao credor o direito de exigir o pagamento ao pretenso fiador, por falta de cumprimento por parte do primeiro das normas do contrato e dos seus deveres legais e estatutários de fiscalização e controlo sobre a efectivação do investimento; 10.ª Não se pode concluir que o IFADAP cumpriu esses deveres com a recepção de documentos de despesas alegadamente efectuadas pelo beneficiário, uma vez que se apurou que este não fez qualquer investimento dos previstos no projecto; 11.ª Esse incumprimento por parte do credor desoneraria o fiador da obrigação de pagar, se a fiança fosse válida; 12.ª Devem ser alteradas as respostas aos art.ºs 22°, 34°, 35º e 36.° da base instrutória, conforme se defende nesta alegação; 13.ª A douta sentença recorrida violou, nomeadamente, as normas dos art.ºs 373°, n.º 3, 394°, n.º 1 e 634º do Cód. Civil, 1°, 2°, 3°, 5º e 6° do Dec. Lei n.º 513-E/79, de 24-12, 9º do Dec. Lei n.º 414/93, de 23-12.
14.ª Os embargos deduzidos pelo apelante devem ser julgados procedentes.
* 5. O embargado não contra-alegou.
* 6. As questões essenciais a decidir: Na perspectiva da delimitação pelo recorrente[1], os recursos têm como âmbito as questões suscitadas pelos recorrentes nas conclusões das alegações (art.ºs 690º, n.º 1 e 684º, n.º 3 do Cód. Proc. Civil)[2], salvo as questões de conhecimento oficioso (n.º 2 in fine do art.º 660º do Cód. Proc. Civil), exceptuando-se do seu âmbito a apreciação das questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (n.º 2 1.ª parte do art.º 660º do Cód. Proc. Civil).
Atento o exposto e o que flui das conclusões das alegações[3] __ e só se devem conhecer as questões que tenham sido suscitadas nas alegações e levadas às conclusões, ainda que outras, eventualmente, tenham sido suscitadas nas alegações propriamente ditas[4] __, do embargante apelante supra descritas em I. 4., as questões essenciais a decidir são essencialmente três: 1) se pode ou não ser alterada a decisão sobre a matéria de facto relativamente aos artigos aos artigos 22º, 34º 35º e 36º da b.i. (base instrutória)[5] como pretende o embargante; 2) se a fiança é ou não válida; 3) se o credor IFADAP tem ou não direito de exigir do embargante o pagamento das quantias devidas pelo beneficiário das ajudas (devedor principal).
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir: *** II.
Fundamentos: A) De facto: Na 1.ª instância foram dados como provados os seguintes factos: 1. O embargado é portador de um documento intitulado "Fiança", onde se diz, nomeadamente que: « José […] vem pela presente prestar a favor do Instituto de Financiamento e Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e Pescas (IFADAP) (...), uma fiança até ao limite de 8.000.000$00 (oito milhões de escudos) pela segurança do reembolso da ajuda que o IFADAP vai contratar com Artur […], ao abrigo do Regulamento (CEE) 2328/91 (...). A presente garantia cobre até ao citado montante todas e quaisquer responsabilidades e obrigações de Artur […], contraídas perante o IFADAP, e relativas ao referido contrato e atribuição de ajuda, pelo que José […], na qualidade de fiador e principal pagador, com renúncia ao beneficio de excussão prévia, se compromete irrevogavelmente a pagar ao IFADAP, quaisquer quantias até ao referido limite, logo que tal seja solicitado pelo IFADAP ».
-
Consta do bilhete de identidade do embargante que o mesmo não sabe assinar.
-
Consta do documento intitulado "Fiança" que a assinatura do embargante foi reconhecida notarialmente com base em conhecimento pessoal.
-
O projecto financiado pelo IFADAP teve por objectivo a construção de um estábulo/armazém com 288 m2 e a aquisição de 15 vacas Mirandesas, de um tractor e de uma charrua, de um escarificador e...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO