Acórdão nº 1614/2007-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 26 de Abril de 2007
Magistrado Responsável | MANUELA GOMES |
Data da Resolução | 26 de Abril de 2007 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: Relatório.
-
S, SA, intentou, no dia 2.05.2006, no Tribunal Cível de Lisboa, acção declarativa de condenação, com processo comum, sob a forma ordinária, contra C, Lda alegando para tanto, essencialmente, que no exercício da sua actividade celebrou com a ré um contrato, pelo qual emprestou a esta a quantia de € 29 728,32, destinada à aquisição, pela ré de um veículo automóvel BMW, quantia essa que deveria ser paga em 72 prestações mensais, no valor de €409,56; como condição da celebração do respectivo contrato e garantia do seu cumprimento, foi constituída e registada reserva de propriedade a favor da requerente sobre o mencionado veículo; o requerido não efectuou o pagamento da 3ª, 4ª, 5ª e 6ª prestações vencidas entre 23.06.2005 e 23.09.2005, na data dos respectivos vencimentos, nem posteriormente, quando lhe foi concedido um prazo suplementar de 8 dias úteis para regularização, do que deriva que a mora se converteu em incumprimento definitivo.
Mais alegou que até à data da propositura da acção a ré não procedera ao pagamento da totalidade das prestações, nem procedera à entrega do veículo, pelo que a autora, a favor da qual está constituída a reserva de propriedade, tem direito à restituição do veículo Terminou pedindo que fosse declarada judicialmente a resolução do contrato e que a ré fosse condenada a entregar-lhe o veículo em causa, bem como fosse reconhecido o direito ao cancelamento do registo averbado em nome da ré, junto da entidade competente.
Citada, a ré não contestou, pelo que foram considerados provados os factos alegados pela autora.
Apresentada pela autora alegação de direito, com data de 9.11.2006, foi proferida sentença que, julgando a acção apenas parcialmente provada, declarou validamente resolvido o contrato celebrado entre as partes, mas absolveu a ré do mais que fora pedido.
Inconformada, a autora apelou.
Alegou e no final formulou, em síntese as seguintes conclusões: - O Meritíssimo Juiz a quo julgou a acção parcialmente improcedente, por entender que não haver lugar à constituição da reserva de propriedade, em face da celebração de contratos de financiamento, uma vez que tal garantia poderá apenas ser acordada quando estamos perante a celebração de contratos de compra e venda; - Acontece que, para o tribunal recorrido não basta que se verifique a existência de reserva de propriedade inscrita a favor da A., nem que se verifique o incumprimento das obrigações que originaram a mesma, é necessário também que a referida reserva de propriedade seja garantia do cumprimento de um contrato de compra e venda resolvido, e não qualquer outro; - Ora, salvo o devido respeito, discordamos deste entendimento que, em nossa opinião, não faz a correcta interpretação da Lei; - A reserva de propriedade, tradicionalmente uma garantia dos contratos de compra e venda, tem vindo, face à evolução verificada nas modalidades de contratação, a ser constituída como garantia dos contratos de mútuo, sobretudo daqueles cuja finalidade e objecto é financiar um determinado bem, ou seja, quando existe uma interdependência entre o contrato de mútuo e o contrato de compra e venda; - Nestas situações, tem-se verificado uma sub-rogação do mutuante na posição jurídica do vendedor, isto é, o mutuante ao permitir que o comprador pague o preço ao vendedor, sub-roga-se no risco que este correria caso tivesse celebrado um contrato de compra e venda a prestações, bem como, nas garantias de que este poderia dispor, no caso, a reserva de propriedade; - Este entendimento encontra pleno acolhimento no artigo 591° do Código Civil, bem como no princípio da liberdade contratual estabelecido no artigo 405° do Código Civil, uma vez que, não se vislumbram quaisquer objecções de natureza jurídica, moral ou de ordem pública relativamente ao facto de a reserva de propriedade ser constituída a favor do mutuante e não do vendedor; - Ora, a própria lei que regula o crédito ao consumo o admite no n.° 3 do seu artigo 6° quando refere que "o contrato de crédito que tenha por objecto o financiamento da aquisição de bens ou serviços mediante pagamento em prestações deve indicar ainda (….) f) O acordo sobre a reserva de propriedade".
- Entendimento este, que também tem sido sufragado em diversos acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa.
- Por outro lado, o direito que a Requerente tem de reaver a viatura decorre da propriedade que tem sobre ela, bem como face à declarada resolução do contrato, tem direito ao cancelamento do registo feito a favor da ré na Conservatória do Registo Automóvel - Posto isto, e encontrando-se inscrita a favor da Recorrente reserva de propriedade sobre a viatura que se requereu a restituição, bem como...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO