Acórdão nº 6318/2006-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 28 de Setembro de 2006
Magistrado Responsável | FÁTIMA GALANTE |
Data da Resolução | 28 de Setembro de 2006 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
ACORDAM NA 6ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I - RELATÓRIO Banco S.A. intentou acção declarativa, sob a forma ordinária, contra A e C, pedindo a condenação dos RR. no pagamento à A. da quantia de €14.004,00, acrescida de € 1.289,67 de juros vencidos e de juros vincendos, à taxa anual de 17,15%, até integral pagamento, bem como o correspondente imposto de selo.
Para tanto, invocou, fundamentalmente e em síntese, que financiou a venda aos RR. de um veículo e que estes não procederam ao pagamento de diversas prestações. Foi entregue o veículo para pagamento de parte da dívida e foi realizado um acordo de pagamento em 75 prestações do saldo em débito. O empréstimo reverteu em proveito comum do casal.
Os RR, regularmente citados, não contestaram.
Foi realizado um convite à junção do documento escrito que corporiza o contrato de transacção extrajudicial, tendo a A. juntado aos autos o documento de fls. 30 dos autos.
Também foi realizado um convite ao aperfeiçoamento da petição inicial, tendo a A. expressamente rejeitado tal convite.
Proferida sentença, foi a acção julgada totalmente improcedente e, em consequência, absolvidos os RR, do pedido.
Inconformada, apelou a A. da sentença, tendo, no essencial formulado as seguintes conclusões: 1.
Impõe-se que, tendo em consideração o disposto no artigo 484º, nº 1, e o artigo 712º, nº 1, alínea a), do CPC, este Tribunal da Relação de Lisboa dê como provada toda a matéria de facto que alegada foi pelo A. em 1ª Instância, ora recorrente, na acção, e que expressamente consta dos diversos números da Parte II desta alegação.
-
Impõe-se também que se reconheça que a sentença recorrida, atenta a matéria de fato provada nos autos, julgue inteiramente procedente e provado o presente recurso e, consequentemente, se reconheça que a sentença não só fez errada interpretação e aplicação da matéria de facto à legislação em vigor, como violou o disposto nos arts. 781º e 1691º, nº 1, alínea c), do Código Civil, bem como o disposto nos arts. 8º, alínea d), e 11º, nº 1, do Decreto-Lei 446/85, de 25 de Outubro e, portanto, se revogue a sentença recorrida.
Corridos os Vistos legais, Cumpre apreciar e decidir.
Em face das conclusões, que, como é sabido, delimitam o objecto do recurso, cabe apreciar a matéria de facto provada, a validade das cláusulas gerais do contrato, a possibilidade de capitalização dos juros, bem como o proveito comum do casal.
II - FACTOS PROVADOS 1.
A autora é uma sociedade financeira para aquisições a crédito.
-
Em 15.6.2004, no exercício da sua actividade social, a autora celebrou com o réu António Duarte Martins o escrito junto aos autos a fls. 8-9, denominado "contrato de mútuo", destinado à aquisição do veículo automóvel de matrícula ..-..-...
-
Do referido escrito consta o seguinte: montante de crédito - € 18.000,00; número de prestações - 72; valor de cada prestação - € 372,29; data de vencimento da primeira prestação - 20.7.2004; taxa de juro - 13,15%; TAEG - 15,10%.
-
A cláusula 8ª, alínea b), do referido escrito tem a seguinte redacção: "A falta de pagamento de uma prestação, na data do respectivo vencimento, implica o imediato vencimento de todas as restantes".
-
A cláusula 8ª, alínea c), do referido escrito tem a seguinte redacção: "Em caso de mora, e sem prejuízo do disposto no número anterior, incidirá sobre o montante em débito, e durante o tempo de mora, a título de cláusula penal, uma indemnização correspondente à taxa de juro contratual acrescida de quatro pontos percentuais, bem como outras despesas decorrentes do incumprimento, nomeadamente uma comissão de gestão por cada prestação em mora".
-
A determinada altura, o réu A deixou de pagar as prestações acordadas.
-
A determinada altura, o réu A entregou à autora o veículo automóvel de matrícula ..-..-.., para que a autora diligenciasse proceder à sua venda e creditasse o valor de tal venda por conta do que o réu lhe devesse.
-
A autora procedeu à venda do veículo automóvel de matrícula ..-..-...
-
Em 1.3.2005, a autora celebrou com o réu A o escrito junto aos autos a fls. 30, denominado "aditamento ao contrato de mútuo", donde consta nomeadamente o seguinte: "B) O mutuário (..), incluindo juros e imposto de selo, deve ao Banco a quantia de € 17.511,04; C) Nesta data o Mutuário efectuou uma entrega ao Banco no valor de € 7.234,21; D) Tendo em conta a entrega do quantitativo mencionado em C) o Mutuário relativamente ao referido contrato deve ao presente, ao Banco ainda a quantia de € 10.276,83, a que acrescem juros e imposto de selo.
" 10.
Deste escrito consta, ainda, o seguinte: "Foi acordado em aditamento ao dito contrato de mútuo o seguinte: 1. O valor da prestação mensal é alterado para € 186,72. 2. O prazo para pagamento (..) é de 75 meses. 3. A próxima prestação a ser cobrada já pelo novo valor tem data de vencimento em 20.4.2005.
".
-
O réu não procedeu ao pagamento desta prestação de 20.4.2005, nem pagou as prestações seguintes.
III - O DIREITO 1. Da matéria de facto provada Os aqui Recorridos, pessoal e regularmente citados para os termos da presente acção, não contestaram.
Assim, por força do disposto no artigo 484º, nº 1, do CPC, consideraram-se confessados os factos articulados pelo A., a aqui Apelante.
Entende a Apelante que não foram tidos em conta todos os factos articulados na petição, que não foram contestados, designadamente que: - As partes acordaram que feita a venda do carro, o saldo então obtido - € 14.004,00 - seria pago em 75 prestações mensais e sucessivas, do montante de 186,72 cada, com vencimento aos 20 de cada mês, a primeira com vencimento em 20 de Abril de 2005 e as restantes nos dias 20 dos meses imediatamente subsequentes, mantendo-se, em tudo o mais, o contrato de mutuo referido.
- O empréstimo reverteu em proveito comum do casal dos RR./Recorridos, pois o veículo que o R. marido adquiriu destinava-se a reverter para o património comum do casal dos RR. em 1ª Instância, ou seja dos ora recorridos.
Vejamos.
1.1. Quanto ao montante de débito acordado De acordo com o teor do aditamento ao contrato de mútuo constante de fls. 30, o R. considerou-se devedor da quantia de 17.511,04 € (que incluía já juros e imposto de selo) entregando, por conta dessa quantia, o valor de € 7.234,21, assim ficando em dívida €10.276,83 que o R. se comprometeu a pagar em 75 prestações de 186,72€. Donde, o que ficou acordado, em 1/3/2001, foi a existência de um débito de 10,276.83€, resultante da diferença entre a quantia de 17,511.04 e a quantia entregue de 7,234.21€.
Ou seja, a quantia que o Apelante diz estar em dívida resulta da operação aritmética que efectuou, quando intentou esta acção, como refere, aliás, no art. 15º da petição (14.004,00 = 75 x 186,72).
Portanto, importa atender ao teor dos documentos juntos, nomeadamente, aos de fls. 8-9 e 30 e não às conclusões ou cálculos aritméticos que o A. apresenta.
1.2. Quanto ao proveito comum do casal e à prova do casamento Alega, também, o A., na petição inicial, que os RR. são casados um com o outro e que o empréstimo referido reverteu em proveito comum do casal dos RR, atento o veículo referido se destinar ao património de ambos.
1.2.1.
Quanto à necessidade de junção da certidão de casamento para prova do alegado casamento dos RR, apenas cabe referir que, ainda que conscientes de que a solução não é pacífica, estando em causa o incumprimento de um contrato validamente celebrado, estamos no campo dos direitos disponíveis e por isso no domínio da autonomia privada e da liberdade contratual, sendo a vontade das partes plenamente eficaz para produzir os seus...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO