Acórdão nº 2737/2006-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 19 de Setembro de 2006

Magistrado ResponsávelMARIA AMÉLIA RIBEIRO
Data da Resolução19 de Setembro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam na Relação de Lisboa I. Procº nº 2737/06 […] Pedido: condenação da R. a pagar-lhe a quantia de €40 396,43, acrescida de juros vincendos à taxa contratual, desde 12 de Julho de 2005, até integral pagamento. Peticiona ainda, a apelante, os juros de mora correspondente a facturas pagas com atraso, relativas a consumos de Dezembro de 2003 a Março de 2004 e despesas bancárias com devolução de cheques.

Alegou, em resumo, que em 12 de Julho de 2003, foi celebrado um contrato de fornecimento de energia eléctrica entre EDP - Energia SA e […] (outorgantes estes que vieram a ser substituídos pela apelante e apelado), com início em 1 de Dezembro de 2003; todavia, a R. (que sucedeu a esta última) não efectuou os pagamentos dos consumos de electricidade dos meses de Abril, Maio, Junho e Julho de 2004, a que acrescem os correspondentes juros de mora à taxa contratual.

Citada, a R. contestou pugnando pela absolvição do pedido e invocando a prescrição, com base no disposto no art.º 10º n.º1 da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, porquanto, desde a data da prestação do serviço até à data da reclamação do respectivo pagamento, decorreram mais de seis meses.

Na resposta, a A/apelante defendeu a improcedência da excepção, sustentando que o fornecimento em causa (média tensão) enquadra-se na excepção do n.º 3 do art.º 10º da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, ou seja, o regime geral da lei civil (5 anos); mas mesmo que assim não se entendesse, continua a defender, a exigência do pagamento foi tempestiva, porquanto a factura foi emitida no prazo de seis meses a contar do fornecimento.

Foi proferida decisão que concluiu pela improcedência do pedido.

É contra esta decisão que se insurge a recorrente, formulando as seguintes conclusões: 1. A recorrente forneceu energia eléctrica à recorrida, que esta consumiu, em Abril, Maio, Junho e Julho de 2004, ao abrigo de um contrato de fornecimento de energia eléctrica com a mesma celebrado, consumo este que foi facturado em 3, 4 e 5 de Agosto de 2004, no valor de € 38.486,60 e que a recorrida não pagou, o que confessou.

  1. A recorrida veio invocar a excepção da prescrição constante do art.º 10º n.1 da Lei 23/96 de 26.07 (que prevê a prescrição do direito de exigir o pagamento do preço dos diversos serviços prestados no prazo de seis meses após a sua prestação), dado que a acção condenatória foi proposta em Julho de 2005, requerendo a absolvição do pedido.

  2. A recorrente, entende, todavia, que o fornecimento de energia eléctrica contratado se encontra abrangido pela excepção prevista no n.º 3 do art.º 10º da citada Lei 23/96 (que exclui do prazo curto de prescrição os fornecimentos de energia eléctrica em alta tensão), uma vez que no conceito de alta tensão se devem incluir a média tensão e a muito alta tensão, tendo em conta a intencionalidade normativa da lei e, no quadro desta, a fundamentação da diferenciação de regimes.

  3. A referida lei, integrada na ordem pública de protecção, tem como objectivo a protecção dos utentes de serviços essenciais, pelo que o facto de se terem excluído utentes fornecidos com certas características de tensão, só pode significar, na óptica legislativa, que essa categoria de utentes não merece tutela especial ou que essa necessidade de tutela é suplantada pelos interesses da contraparte.

  4. Não sendo o conceito em causa unívoco uma vez que há legislação que o utiliza quer em sentido amplo, quer em sentido restrito, não nos devemos cingir à interpretação literal.

  5. Também não nos devemos cingir a uma interpretação segundo a qual a proximidade temporal da legislação que acolhe o conceito restrito (DL 182/95) determina que esse conceito é aplicável ao n.º3 do art.10º da Lei 23/96, uma vez que o próprio DL 182/95 restringe a sua aplicação ao seu próprio âmbito.

  6. Pelo contrário, tal conceito é tradicionalmente interpretado como bipartido, abrangendo a alta tensão, indistintamente, os valores que excedam a baixa tensão, pelo que, tendo em conta o carácter funcional dos conceitos jurídicos, o sentido da expressão deve traduzir elementos valorativamente relevantes para a estatuição a que está ligada, razão pela qual é relevante a intencionalidade da norma.

  7. A excepção do n.º 3 do art.º 10º fundamenta-se, assim, no facto de os riscos que a mesma Lei pretende ver protegidos, não terem razão de ser nos utentes de alta tensão e, uma vez que estes não diferem dos utentes de média tensão, nem quanto ao seu perfil funcional ou dimensional, não se vê motivo para a interpretação literal do conceito.

  8. Ao contrário, já nada aproxima os utentes de média tensão dos de baixa tensão; neste caso, existe alimentação directa da rede, o cálculo do consumo resulta de uma simples operação aritmética com base na leitura do contador, ao contrário do que sucede no caso da média e alta tensão (e...

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