Acórdão nº 279/2006-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 16 de Fevereiro de 2006

Magistrado ResponsávelGRANJA DA FONSECA
Data da Resolução16 de Fevereiro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: N… instaurou, no Tribunal Judicial de Almada, a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra Herança de A…, representada pelo cabeça - de - casal ANTÓNIO …, alegando que viveu em união de facto com o autor da herança, pai do cabeça - de - casal, que, antes de morrer, emitiu a seu favor um cheque de 2800 contos, o qual não veio a ser pago pelo banco, por o seu filho ter feito com que fosse devolvido com indicação de "irregularidade de saque" e ainda que gastou nas despesas de saúde do falecido a quantia de 38.870$00.

Por se tratar de dívidas da herança do pai do réu, pediu que este, na qualidade de cabeça-de-casal, fosse condenado a pagar-lhe tais quantias.

O réu contestou, alegando, em resumo, que o seu pai, nos dias anteriores à morte, estava impossibilitado de entender o sentido de qualquer declaração negocial, pelo que o cheque em causa não foi assinado por ele e que não teve intervenção na devolução do cheque. Quanto às despesas com saúde, invocou que foram pagas com dinheiro da economia comum do casal.

Em reconvenção, depois de alegar que a autora usou o cartão multibanco do seu falecido pai para efectuar dois levantamentos de 60 contos, no dia a seguir à sua morte, pediu que a mesma fosse condenada a restituir à herança tal quantia.

Replicando, afirmou a autora, em síntese, que o falecido tinha perfeita capacidade de entendimento quando emitiu o cheque, manteve que o cheque foi por ele assinado e que realizou as despesas de saúde alegadas. No que respeita à reconvenção, impugnou o dever de restituição, dizendo que os levantamentos em causa foram feitos para acorrer a despesas posteriores à morte mas decorrentes desta e que o dinheiro em causa era proveniente das economias do casal.

Foi proferido despacho saneador, fixando-se a matéria assente e controvertida.

Procedeu-se a julgamento, com gravação da prova produzida em audiência, tendo-se proferido decisão sobre a matéria de facto e seguidamente a sentença que, julgando a acção e a reconvenção totalmente procedentes, condenou a herança de A… a pagar à autora a quantia de dois milhões oitocentos e trinta e oito mil oitocentos e setenta escudos e esta a pagar àquela a quantia de sessenta mil escudos.

Inconformada com a decisão, recorreu a H..., formulando as seguintes conclusões: 1ª - A douta Sentença recorrida não soube valorar correctamente os meios de prova produzidos, dando como provados os factos constantes nos artigos 1º a 3º, 8º e 9º, 12º, 14º a 17º da base instrutória, tendo por base depoimentos de testemunhas, que foram contraditórias, deficientes na articulação do seu raciocínio e interessadas no resultado da causa, sendo que as regras de experiência comum não justificam a fundamentação e valoração que se deu à sua apreciação, nem o princípio da imediação por si só justifica a tomada de posição elencada.

  1. - O tribunal a quo não soube apreciar o resultado da prova pericial, conjugando-a com uma decisão estritamente administrativa de uma Instituição Bancária (BPA), que, em tempo, e pelo meio próprio, assumiu que a assinatura constante do título de crédito era desconforme com a que possuía do seu cliente.

  2. - O tribunal a quo interpretou mal o relatório pericial, ao referir que o mesmo deixa dúvidas. O mesmo apenas arbitrou o seu juízo de valor, com base num critério científico de probabilidades, omitindo juízos de valoração subjectivos.

  3. - Recorrendo à presunção judicial, o tribunal a quo entendeu que a ora Apelante teve intervenção na decisão de uma instituição financeira, sem para tal se sustentar em factos objectivamente concretos.

  4. - Uma ponderada e equitativa decisão do mérito da questão deverá conduzir à reapreciação dos factos dados como provados, considerando-os como não provados, atenta a correcta análise e arguta integração dos elementos probatórios.

  5. - Destarte, deverá ser reapreciada a matéria de facto, nos pontos ora impugnados, concluindo-se pela improcedência da pretensão da Autora.

A autora contra - alegou, pugnando pela confirmação da sentença recorrida.

  1. A sentença condenou a Ré a pagar à Autora a quantia global de 2.838.870$00, relativa a uma doação de 2.800.000$00 de A… à Autora, sua companheira e ao valor das despesas de assistência médica prestada pela Autora ao de cujus no montante de 38.870$00.

    E condenou a Autora a restituir à Ré 60.000$00 levantados da conta do de cujus.

    A Autora não recorreu e a Ré restringiu o âmbito objectivo do recurso ao segmento da sentença, na parte que respeita ao pagamento do valor do cheque que consubstanciaria a aludida doação.

    Transitaram, assim, os segmentos da sentença, na parte em que a Ré foi condenada a pagar as despesas atinentes à assistência médica prestada pela Autora e na parte em que a Autora/reconvinda foi condenada a pagar os 60.000$00 à Ré, quantia levantada da conta do de cujus (cfr. artigo 684º, n.º 3 CPC).

    Importará, pois, decidir sobre a eventual alteração da matéria de facto e, se atendida a alteração, deve a Ré ser (ou não) absolvida do pedido.

  2. Na 1ª instância consideraram-se provados os seguintes factos: 1º - A autora viveu em união de facto, durante mais de 32 anos, com A…, pai de António … (alínea A).

    1. - A..., após doença prolongada, viria a falecer, no dia 23 de Setembro de 1998, na companhia da autora, naquela que foi a casa de morada de família (alínea B).

    2. - Antes de falecer, A... entregou à autora o cheque n.º 4829259138, do Banco Português do Atlântico, cujo original se encontra a fls. 420, que assinou c no qual escreveu...

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