Acórdão nº 955/07-1 de Tribunal da Relação de Évora, 15 de Maio de 2007
Magistrado Responsável | ANTÓNIO PIRES ROBALO |
Data da Resolução | 15 de Maio de 2007 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, os juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora.
* I. La Procura della Republica c/o Tribunal Bolzano; Piazza Tribunale, 1; 39100, emitiu mandado de detenção europeu contra o cidadão português, A. …, nascido a 16 de Agosto de 1972 em …, com vista à sua entrega a Itália, a fim de em tal país cumprir 5 anos e 7 meses de prisão, que lhe falta cumprir, da pena de 6 anos e 2 meses de prisão em que foi condenado por sentença de 3 de Junho de 2002 daquele Tribunal, pela prática dos crimes de violência sexual agravada p. e p. pelos art.ºs 609 bis, 61 n.º 5, do C.P. Italiano; Lesão corporal agravada, p. e p. pelo art.º 582 e 61, n.º 2, do mesmo código; roubo agravado p. e p. pelo art.º 628 § 1 e 3, n.º 1, em relação ao art.º 582, § 2, do citado diploma; violência sexual agravada, p. e p. pelo art. 609 bis e 61, n.º 5, do mesmo diploma e roubo agravado p. e p. pelo art.º 628 § 1 e 61, n.º 5, do citado código, transitada em julgado 3 de Novembro de 2002, por factos ocorridos em Agosto de 2000, em Bolzano e Sarentino/Bolzano.
* II - O mesmo foi detido em 11 de Abril de 2007 ( cfr. fls. 2) A fls.10 nos termos do art.º 3, 16, n.º 5 e 15, n.º 2, da Lei n.º 65/03, de 25 de Agosto, foi proferido despacho a designar dia para audição do procurado.
* III - O procurado foi ouvido, em 12 de Abril de 2007, (cfr. auto de fls. 11 e 12 ), tendo declarado não consentir na sua entrega ao Estado requerente do mandado de detenção europeu.
Foi, então, dada a palavra ao Excelentíssimo Defensor oficioso do inquirido, para deduzir oposição, querendo, nos termos do art.º 21, n.º 1, da Lei n.º 65/03, de 23 de Agosto, tendo sido, por este, requerido um prazo não inferior a 10 dias para deduzir oposição, nos termos do n.º 4, do citado preceito, o que se deferiu.
Validou-se a detenção efectuada, tendo-se fixado a medida privativa da liberdade a aguardar os ulteriores termos do Mandado de Detenção Europeu (cfr. fls. 11 e 12 dos autos).
* IV - Em 23 de Abril de 2007, veio o procurado A. …, através do seu Exm.º Defensor, deduzir oposição à sua entrega ao Estado membro de emissão do mandado de detenção europeu para cumprimento alegando: - «A oposição, segundo o disposto no art. 21.º n.2 da Lei 65/03 de 23/08, pode ter como fundamento a existência de causa de recusa de execução do Mandado de Detenção Europeu.
- Nesse sentido pretende-se deduzir oposição à execução do Mandado emitido contra A. … com base no disposto na alínea g) do n.º 1 do artigo 12.º da citada Lei, que estabelece uma causa de recusa facultativa de execução do Mandado de Detenção Europeu...
- .. . quando a pessoa procurada se encontre em território nacional, tenha nacionalidade Portuguesa ou resida em Portugal, desde que o Mandado de Detenção tenha sido emitido para cumprimento de uma pena ou medida de segurança, de acordo com a lei portuguesa.
- O cidadão detido é de nacionalidade portuguesa, natural de … e com residência em Portugal, a qual consta dos autos.
- E o Mandado de Detenção Europeu foi emitido, para cumprimento de uma pena de cinco anos e sete meses de prisão.
- Porém, o último requisito previsto na citada alínea não está preenchido, uma vez que não se verifica nos autos qualquer compromisso do Estado Português em executar aquela pena, de acordo com a lei portuguesa.
- Na verdade, existe uma impossibilidade prática do Estado Português executar a pena, pois para que isso fosse possível, teria que existir a necessária regulamentação legal, uma vez que a lei refere que isso terá que ser feito "de acordo com a lei portuguesa" e presentemente, não existe qualquer regulamentação legal nesse sentido.
- Na falta da necessária regulamentação legal, o disposto na alínea g) do n.º 1 do art. 12 da Lei 65/03 de 23/08, cai inevitavelmente no vazio, o que não pode, com certeza, prejudicar o cidadão nacional que tem o direito à oposição, com base na referida causa facultativa de execução do mandato.
- Pelo que, esta situação só pode ter como consequência possível a transformação da recusa facultativa em recusa obrigatória de execução do mandato.
- Por outro lado, ao caso em apreço aplica-se o disposto no art. 4.° da Lei 144/99 de 31 de Agosto, que estabelece o princípio da reciprocidade enquanto princípio geral de cooperação internacional em matéria penal.
- Atendendo a que o Mandado de Detenção Europeu não é mais do que uma forma de cooperação judiciária internacional, deve entender-se o princípio da reciprocidade, como condição essencial para a concessão de cooperação.
- A Lei Italiana (Legge n.69/2005 pubblicata nella Gazzetta Ufficiale n.98 deI 29 Aprile 2005) equivalente à nossa Lei n.º 65/2003 estabelece no seu art.18 sob a epígrafe (Rifiuto della consegna) que; 1. La corte di appello rifiuta la consegna nei seguenti casi: (...) r. se il mandato d'arresto europeo e statu emesso ai fini della esecuzione di una pena o di una misura di sicurezza privative della libertà personale, qual ora la persona ricercata sia cittadino italiano, sempre che la corte di appello disponga che tale pena o misura di sicurezza sia eseguita in Italia conformemente al suo diritto interno; - Na verdade o Direito Italiano estabelece como limite, em situações idênticas àquela que está ora em apreciação, "rifiuto della consegna" de cidadãos seus nacionais a quaisquer outros Estados-Membros para efeitos de cumprimento de penas que neles hajam sido aplicadas "sempre che la corte di appello disponga che tale pena o misura di sicurezza sia eseguita in Itália " - Do exposto, resulta que a Autoridade Judiciária Italiana, sempre que o Mandado de Detenção Europeu tenha sido emitido para cumprimento de pena ou medida de segurança privativa da liberdade e encontrando-se o cidadão nacional em território nacional recusa a entrega do seu cidadão desde que se comprometa a executar a pena em Itália.
- Importa destacar que, no caso do ordenamento jurídico Italiano a supra citada recusa é obrigatória ao contrário do ordenamento jurídico português que considera o fundamento supra uma causa de recusa facultativa in fine a Lei Italiana não estabelece o princípio da reciprocidade em situações idênticas.
- Por outro lado, Portugal veio nos termos do art.7.º da Convenção de Dublin declarar que só autorizaria a extradição de cidadãos portugueses do território nacional nos termos previstos na Constituição: - O preceito constitucional emergente da Lei Constitucional 1/97 que estabelece a inadmissibilidade da extradição, ainda que com excepções, a regra da reciprocidade vem relevar no caso em apreço, a que a eventual entrega do oponente a Itália enfermaria de inconstitucionalidade material.
- Por outro lado, da Decisão-Quadro n.o 2002/584/JAI, do Conselho de 13 de Junho, resulta que o elemento subjectivo da nacionalidade da pessoa procurada é fundamento, a que Autoridade Judiciaria de execução pode «deitar mão», para evitar a entrega de um cidadão nacional (cfr. art. 4 n.º 6).
- Caso assim não se entenda e por mera cautela de patrocínio deverá ser suspensa a entrega do cidadão nacional A. …, nos termos do art. 31 n.º l da Lei 65/2003, para que possa cumprir em Portugal a pena respectiva, devendo então ser solicitada certidão da sentença para efeito de revisão e confirmação, conforme o disposto no art.19 da Decisão-Quadro n. 2002/584/JAI, aplicável por força do art. 1.º n. 2 da Lei 15103.
- Pelo exposto deve haver lugar à recusa do mandado de detenção europeu.» * V - O Sr.º Procurador Geral-Adjunto junto deste Tribunal respondeu, referindo em conclusão: «A) O princípio da reciprocidade previsto no artigo 4° da Lei n.º 144/99, de 31 de Agosto, e no artigo 33.º n.º 3 da Constituição da República Portuguesa não é constitucionalmente exigível no âmbito da cooperação judiciária penal europeia, visto o disposto no n.º 5 desta última disposição constitucional; B) O regime de suspensão da entrega da pessoa procurada previsto no n.º l do artigo 31° da lei n.º 65/03 vale apenas para quando está em causa o cumprimento de pena aplicada em Portugal; C) Inexistindo nos Autos qualquer declaração ou indicação de que o Estado Português se compromete a...
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